Um Presente

913 59 11
                                    

        – Zayn, por favor – Uma mulher gritou. A imagem embaçada começava a tomar corpo, a mulher estava sentada num sofá onde parecia ser uma sala e assistia a algum programa de TV. Eu sabia que reconhecia aquele lugar. O menino pisava fundo no andar de cima, dava para ouvi-lo bufando – Eu não vou falar de novo!

        – Mas mamãe, eu não quero sair – Dava para ver um menino de aparentes seis anos, cabelos escuros e pele morena gritando do alto da escada, ele prolongou a última palavra saindo um saiiiiir. Ele desceu com os ombros caídos e braços jogados ao lado do corpo como se tivesse um pesar nos ombros e fez uma cara que aparentava dor, proposital. O garotinho apoiou-se no mastro ao pé da escada e fez um biquinho – Por favor, mamãe!

        –Zayn, você fica o dia inteiro enfurnado dentro de casa, você tem que sair um pouco, só sabe ficar no seu quarto – a mãe disse com certa raiva, depois suspirou e olhou para o menino que agora estava prestes a chorar, ela se levantou e foi até ele, passando a mão em seus cabelos e dando um meio sorriso para o menino que agora abraçava a mãe na altura da cintura e segurava um choro – Vá brincar um pouco na rua, tomar um ar, conhecer a vizinhança. Odeio te ver sozinho aqui dentro, meu amor.

        – Você sabe que eu posso ser sequestrado, não sabe? – Zayn disse com convicção, erguendo a cabeça e olhando a mãe nos olhos. A mãe sorriu e balançou a cabeça negativamente, pegando o menino no colo – Zayn, meu amor, nem pense nessas coisas.

        Ela beijou o nariz da criança e se soltou de seus braços, indo em direção ao sofá novamente e se sentando. Zayn ficou parado observando a mulher. Cabelos castanhos, olhos escuros... Mesmo com uma aparência tão comum, Trisha conseguia ser muito bonita, e o menino admirava isso, mesmo tendo muito ciúmes dos homens que vinham em sua casa vez ou outra. A mãe dizia que eles eram amigos dela que vinham visitá-la, ele se escondia em seu quarto e ficava lá até o tal homem ir embora, com medo de algo acontecer a ele. Doniya dizia que eles não eram amigos de sua mãe, e sim caras que queriam ser seu novo pai, mas Zayn não sabia se acreditava ou não.

        Depois de observar a mãe por um tempo, Zayn olhou para a porta a sua esquerda e bufou. Isso vai ser chato, pensou. Ele definitivamente preferia ficar e assistir filmes a sair e interagir, até porque sua timidez o atrapalhava muito. Não havia necessidade de interação social. Humpf. O menino pegou um carrinho jogado dentro de uma caixa embaixo da escada e foi andando até a porta, passando o carrinho vermelho pelas paredes e fazendo barulhos com a boca. Ele parou por um instante e ergueu o olhar para olhar a janela transparente da porta já que ele era quase da mesma altura da maçaneta. O céu estava completamente azul. Sem uma nuvem sequer, mas ainda assim ele sabia que fazia frio. Zayn abriu a porta finalmente e saiu de casa, olhando para baixo e sentindo o vento frio em seu rosto. Ele agradeceu a Deus e o mundo por usar calças e não shorts, e uma blusa de moletom ao invés de uma camiseta qualquer.

        Zayn desceu as escadas e andou até o meio do jardim, sentando-se no gramado de sua casa e começando a brincar com seu carrinho. A brincadeira estava bem sem graça, já que Zayn só tinha um carrinho. O menino ouviu um barulho na casa dos vizinhos, mas as plantas o atrapalharam a ver o que acontecia quando olhou naquela direção então decidiu se levantar e ir até lá. Na casa ao lado, homens iam de lá pra cá com móveis e caixas em suas costas de onde tiravam de um caminhão enorme estacionado na frente da casa. Eles colocavam os móveis e caixas no jardim ou levavam para dentro da casa de onde deveriam morar os Judds, um senhor e uma senhora de idade que viviam ali desde que Zayn se lembre. Zayn observou o vai e vem de homens por um tempo, mas algo lhe chamou a atenção.

        Um garoto da sua idade estava sentado no meio fio, brincando com um carrinho azul, mas sem ânimo algum, ele parecia triste. Ele simplesmente passava o carrinho entre suas pernas e nada mais. Ele fazia um biquinho e olhava vez ou outra para os homens pegando coisas e passando ao seu lado. Uma caixa estava colocada ao lado do menino e Zayn desejou saber ler para saber o que estava escrito na caixa, mas ele não sabia. Zayn quis ir até lá, ele sabia o quão chato era brincar sozinho, mas... E se ele zoasse Zayn como os meninos na escola faziam? E se ele não quisesse brincar com Zayn? E se ele não gostasse de Zayn?

        Ele ficou hesitante por um tempo, ponderando se deveria ir ou não. Ele decidiu ir, se desse errado, era só correr pra dentro de casa e voltar a brincar no seu quarto, sozinho de novo. O moreno pegou seu carrinho e foi andando hesitante em direção a casa, ponderando se deveria ir lá ou não. Ele ainda não sabia se conseguiria vencer sua timidez, ele tentaria, mas e se ele não conseguisse? Ia simplesmente dizer tchau? Se for necessário, sim. 

        Zayn chegou perto do menino, mantendo distância. Ele encarou o tal garoto e ficou assim, sem dizer nada, por um longo tempo. Zayn o observava. O garoto tinha cabelos castanhos claros e a pele era morena clara, ele usava uma blusa preta de manga longa do Batman e calça jeans. O menino nem ao menos levantou o olhar, mas Zayn viu que este o observava de rabo de olho e parou de brincar com o carrinho, deixando-o parado entre as pernas. Mesmo assim, Zayn achou que ele poderia ser legal. Eles ficaram assim por um tempo até que Zayn tomou coragem de falar a única coisa que conseguiu naquele momento.

        – Z-zayn – O menino disse, estendendo o braço. O menino ergueu o rosto lentamente revelando belos olhos castanhos escuros.

        – Liam – Ele disse rápido e apertou a mão de Zayn, abaixando o olhar rapidamente, nem olhando nos olhos do menino por muito tempo e puxou sua mão de novo, quase nem encostando na mão do outro menino. Zayn não quis desistir. Depois de um longo tempo, Zayn decidiu dizer algo, ele sabia que o outro menino não iria puxar assunto.

        – O q-que você ta fazendo?

        – Brincando. De carrinho – O menino disse, erguendo o olhar e o olhou por alguns segundos antes de desviar e encarar os homens que carregavam os móveis. Depois voltou a olhar para Zayn e desceu seu olhar até a mão do mesmo. Zayn pôde ver os olhos de Liam brilhando quando percebeu que ele segurava um carrinho e um sorriso brotou em seus lábios – Você veio brincar comigo?

        Zayn assentiu minimamente e Liam sorriu ainda mais.

        – Mas eu só tenho um carrinho – Zayn deu de ombros e sorriu. Liam se levantou meio cambaleante e foi até a caixa, se ajoelhando e tirando vários carrinhos de lá de dentro, um deles fazendo Zayn invejá-lo por ter. Liam colocou todos com muito cuidado na calçada e falou para Zayn sentar ao seu lado – Pode brincar com esses, então.

        Liam olhou para Zayn para ver se o menino aceitaria, quase implorando com o olhar. Zayn concordou e sentou-se na calçada, ainda contemplando aquele carrinho invejável. Ele era enorme, era roxo e tinha faíscas indo de um lado para o outro pelo carro todo.

        – O que foi, Zayn? – Liam disse. Zayn olhou para o menino e esse assustou ao perceber que ele o observar olhar o carrinho. Ele negou com a cabeça e pegou seu carrinho. Um carrinho feio, vale ressaltar. Liam sorriu e pegou o carrinho, colocando-o perto de Zayn – Fica com ele.

        – Mesmo? – Ele pegou o carrinho e o apreciou por alguns instantes. Ele ficou triste de repente e Liam quis saber o porquê – E-eu não posso. Minha mãe vai brigar comigo.

        – Fica com ele, Zayn. É um presente.

        – Um presente?

        – É, um presente – Liam sorriu para o moreno e o mesmo retribuiu o sorriso. Liam pegou um carrinho preto com duas listras brancas cruzando-o de uma ponta a outra e começou a arrastá-lo na calçada fazendo barulhos com a boca, agora bem mais animados. Zayn ficou feliz em vê-lo assim. Ele ficou feliz por minha causa, pensou. Zayn fez uma pessoa feliz, Zayn fez Liam feliz.

        Senti uma sensação deliciosa passar em meu peito. A vontade de tomar aquele menininho em meus braços e apertá-lo tomou conta de mim. Era indescritível a felicidade que senti quando fiz Liam sorrir. Além do mais, de alguma forma, eu sabia que a partir daquele momento eu não conseguiria passar um minuto longe de Liam.

        Conseguiria?

Catch-22 (AU!Ziam)Where stories live. Discover now