Capítulo VIII

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— Meu Deus, quer me matar do coração? — Harley reclamou ao acordar e me ver sentada ao pé da cama o olhando. — Por que acordou tão cedo? O dia nem amanheceu ainda.

— Eu sempre acordei cedo no convento.

— Você não está mais no convento. — Respondeu bocejando. — Anda, vá dormir mais um pouco! É o que pessoas normais fazem em um dia chuvoso. Assim que o dia clarear nós saímos.

— Tudo bem. — Respondi voltando para a cama, porém não consegui dormir. Só consegui pensar que era meu dia de assar os pães. A madre provavelmente estaria furiosa comigo por ter abandonado tudo. Suspirei observando meu reflexo. Pouco depois Harley finalmente levantou e foi até o banheiro. Depois voltou e me encarou de braços cruzados. — Por que tem um espelho no teto?

— Eu não vou responder isso para uma quase freira porque não quero ir para o inferno de tobogã. — Respondeu e eu pisquei intrigada. — Tem enxaguante bucal no armário do banheiro. — Avisou e eu assenti. Entrei no pequeno ambiente também vermelho, lavei o rosto, ajeitei o meu véu e usei o enxaguante com gosto refrescante. Fiz xixi e quando saí encontrei Harley olhando pela janela do quarto. — Parou de chover. Vamos procurar um lugar para tomar café! — Sugeriu e seguimos para fora do quarto. Ele entregou a chave para uma atendente diferente. Ela me olhava tão estranha quanto à da noite anterior.

— Misericórdia! Não é pecado brincar com isso não? — Questionou com os olhos arregalados.

— Com isso o quê? — Perguntei e ela balançou a cabeça em reprovação.

— Deixa pra lá. Tem fetiche para tudo! — Comentou e eu franzi as sobrancelhas.

— O que ela quis dizer?

— Nada. Deve ser louca. — Harley respondeu enquanto seguíamos para o estacionamento. Montamos novamente na moto e a sensação de liberdade com o vento batendo no meu rosto voltou a preencher o meu coração. Paramos pouco depois em um lugar sem fachada alguma, mas onde pelo vidro era possível ver muitas mesas ocupadas. Assim que passamos pela porta um sininho no alto avisou nossa entrada, um rapaz de avental seguiu até nós apontando para um mesa. Sentamos e ele pegou um bloquinho de notas e uma caneta e me encarou.

— Vamos querer ovos, bacon e batata frita. — Harley pediu e o rapaz permaneceu me encarando. — Está me ouvindo?

— Desculpe! — Ele disse finalmente olhando para Harley e anotando algo no papel. — Já serão servidos. — Falou me olhando novamente antes de sair.

— O que ele tem? — Questionei e Harley deu de ombros.

— De repente todos ficaram loucos essa manhã. 

Logo o rapaz voltou equilibrando em uma bandeja vários pratos. Levantei o ajudando a colocar tudo na mesa.

— Não precisava, obrigado!

— Imagina, não foi nada. — Respondi e ele sorriu. Harley limpou a garganta e o rapaz assentiu antes de sair. Eu nunca havia comido frituras na vida. Minha mãe era muito rígida com alimentação e o convento nem se fala. Então quando experimentei batata frita pela primeira vez foi como se minhas papilas gustativas entrassem em festa. — Eu amei batata frita! — Falei comendo mais e Harley sorriu me observando. — Como eu nunca tinha comido isso antes?

— É realmente uma ótima pergunta. — Comentou divertido. — Você se sujou toda com ketchup. Deixa eu te ajudar. — Pediu limpando a minha boca com guardanapo. Os olhos dele fixaram nos meus por alguns instantes e então ele afastou o guardanapo e desviou o olhar de mim. — Precisamos ganhar dinheiro. — Mudou subitamente de assunto. 

— E como faremos isso?

— Como EU farei isso. Preciso achar um bom bar para...

— Ah, não. Bar de novo, não. Por favor!

— Calma, não vou deixar nenhum idiota se aproximar de você. E se alguém tentar alguma gracinha... — Parou de falar fechando os punhos. Engoli em seco e voltei a afundar a batata no molho vermelho. Comi rapidamente e nós saímos quando Harley pagou a conta com todo o dinheiro que tinha no bolso. Seguimos pela estrada e após alguns minutos chegamos à outro bar de beira de estrada. Era ainda mais estranho que o do dia anterior. Fiquei desconfortável com todos os olhares lançados para mim quando entrei no recinto. Harley pediu para eu não sair de perto dele enquanto ele jogava um tal de pôquer com uns homens bêbados. Eles apostaram cinquenta dólares cada um e eu fiquei preocupada, pois sabia que Harley não tinha esse dinheiro. Mesmo assim fiquei quieta. O jogo prosseguiu e ele ganhou a primeira rodada. Depois apostou o dobro e ganhou de novo. Após cinco rodadas estávamos contando um montante de dólares e enfiando tudo na jaqueta dele.

— O que faremos agora? — Questionei entregando as últimas notas.

— Vamos comemorar toda essa grana que ganhamos.

— Comemorar como? — Perguntei e ele tirou uma moeda do bolso e foi até uma máquina retangular. O encarei interrogativa e então uma música saiu da máquina. Harley fez sinal para eu me aproximar. 

— Sabe dançar? — Neguei com a cabeça. — Eu desconfiava disso. — Falou me puxando subitamente pela cintura e me erguendo do chão, me deixando receosa, depois me desceu fazendo meus pés ficarem apoiados nos pés dele. Começou a mexer lentamente de um lado para o outro no ritmo da música. — Abrace meu pescoço! — Instruiu e eu o obedeci. O olhar dele parecia mais intenso que o comum. Senti algo estranho aquecer meu coração enquanto a música melodiosa dizia sobre o amor de Bonnie e Clayde. Eu não sabia quem eram, mas achei fofa a letra.

O Caso HarleyDonde viven las historias. Descúbrelo ahora