Nove.

70 54 1
                                    

Avisei ao Pedro que iria a mansão dos Borges. Senti que ele ficou um pouco arisco, mas não me censurou. Me deu um abraço de urso e disse para que eu me cuidasse.

Vesti um terno preto e uma camisa branca, tão branca que parecia neve. Meus sapatos estavam com o brilho de estrelas.
E lá estava eu, naquela mesma rua. Antes do horário marcado. Estava nervoso, e minhas mãos suavam. Não poderia fazer nada de errado.
E se o futuro do jornal estivesse em minhas mãos?
E se eu fizesse algo de errado?
Eu não poderia errar. Não poderia comprometer a muitos por causa de uma mancada minha. Ninguém me perdoaria. Eu precisava está calmo e fazer as coisas coerentemente. Era essa minha missão. Mas, meu medo, era um cinto que me acoitava diariamente. Eu estava sangrando de tanto apanhar naquele momento. Com certeza estava.

Bati na porta três vezes, e um homem me recebeu.
Ele usava um terno perto com um bordado em vermelho na camisa branca. Acredito que aquele seja o brasão da família.
Dentro da mansão, eu estava ainda mais completamente nervoso. Meu corpo travou sentado ao sofá. Sentia que novamente eu havia congelado naquele sofá de couro preto. Olhava os lustres no alto, e pensava quanto tempo as pessoas levaram para fazê-lo.
Quanto mais os minutos passavam, mas eu me sentia nervoso. Via o homem que me antedeu a porta, ela olhava para mim, e me deixava congelado. Talvez eu esteja falando que estou nervoso a uns minutos consecutivos, mas é para deixar claro o tamanho do meu nervosismo.
Tudo piorou quando vi Barbara descendo as escadas.
Ela usava um vestido preto e seu cabelo estava solto. Ela estava completamente linda. Nunca havia visto uma mulher de tanta beleza assim pessoalmente como a vi naquele momento.
Ela se pôs a minha frente e me deu a mão.
Eu me levantei e a cumprimentei.

– Eu não deveria lhe estender a mão primeiro? Como todo homem faz?
– Todos os anos morando fora do país, me fizeram aprender uma coisa. Mulher sempre será tratada como uma dama recatada. Mas, eu crio minhas próprias regras, e eu posso lhe estender a mão em cumprimento.
– Onde estão todos para o jantar?
– Meus pais estão se arrumando, e os convidados chegaram em cinco minutos. - Ela andou até a janela, parecia estar espiando alguma coisa, senti ela se aproximar de mim, como se meu sexto sentido estivesse aguçado. – Vem comigo, vou lhe mostrar a mansão. - Disse ela falando à beira do meu ouvido.

Saímos pela porta principal e caminhamos para direita.
Era uma noite de lua cheia, e o jardim da mansão estava bastante iluminado. Haviam arbustos cortados em formato de animais. Algumas macieiras. Entre outras árvores que eu não reconhecia. E sobre as flores, ah, haviam muitas. Inúmeras. Ao entrar mais no jardim, havia uma piscina. Sentamos numas cadeiras de praia ao lado da piscina. E só ali percebi que Bárbara usava um sapato azul bem escuro.
Eu não havia assunto, mas o ar noturno me fazia bem. O céu estava limpo, então dava para apreciar a lua em todo seu esplendor.

– Onde você morou quando estava fora do país? - Perguntei.
– Estava nos Estados Unidos. Me formei lá.
– Muitos jovens dariam tudo para morar lá.
– Eu sei. - Ela respirou fundo. – Eu não queria voltar, mas meu pai me fez vir, disse que precisava da família toda junto para passar uma imagem positiva na candidatura.
– Acha que ele pode ganhar?
– Ele sempre consegue tudo que quer. Se ele quiser, ele vai acabar ganhando.
– Ultrapassando por qualquer um.
– Exatamente. - Ela virou-se para mim. – E eu sou como ele, consigo tudo que quero.
– E o que você quer? - Perguntei.
– Você.

Eu me virei para frente. Tentei não olhar para ela. Não havia nada mais para lhe dizer. Mas, ela não iria me ter. Por mais que eu me sentisse atraído por ela, e meu corpo respondesse a essa atração, ela não iria me ter.

Entramos na mansão, e todos os convidados já estavam lá. Via o delegado Fernando Freire. A médica Luíza Garcez. Alguns donos de empresas da região. Me sentia numa cúpula da ONU. Raimundo me serrou com o olhar enquanto conversava com o delegado. Senti que não seria bem-vindo naquele jantar, mas não iria sair dali correndo como uma criança.

Me sentei a mesa ao lado de Bárbara. Estavam todos conversando alto e com sorrisos no rosto. Eu estava completamente calado. Sentia os olhares de todos sobre mim. Como se eles estivessem se perguntando o motivo pelo qual eu estava ali.

Raimundo se levantou de sua cadeira e bateu com o talher em uma taça. Todos começaram a prestar atenção nele e aos poucos ficando em silêncio.

– Como todos vocês sabem, estou pronto para enfrentar essa missão de administrar essa cidade. Serpentina sempre fora uma cidade irrelevante na divisa de dois estados. Mas, assim como eu, acredito que muitos de vocês têm o desejo de por essa cidade no mapa, nem que isso leve anos.
– E quanto isso vai no render Raimundo? - Perguntou o homem que estava sentado a minha esquerda.
– Vocês querem retornos para suas empresas, e os demais querem um salário melhor. Me ajudem que eu os ajudo.
– Você sabe jogar Raimundo, isso você sabe bem. - Comentou o delegado. – Acho que todos agora, todos aqui têm um bom motivo para votar em você.

Todos começaram a aplaudir Raimundo. Menos eu. Não conseguia o aplaudir. Por sorte, ninguém perceberá.
Eu vi nascer um sorriso maléfico no rosto de Raimundo. Um sorriso de poder.
Com a ajuda de todas aquelas pessoas, ele facilmente iria conseguir o que tanto o que lhe produzia ambição.
De fato, Raimundo conseguia tudo.
Mas, a que ponto uma pessoa poderia chegar para conseguir o que deseja? Esse é o lado escuro do ser humano. O lado pecaminoso que faz de tudo para ser alguém, mesmo que isso seja por meios errados. Comprados.

Quando todos haviam terminado o jantar, eu ainda estava posto a mesa, ao lado de Bárbara. Ela não parecia está muito bem. Reclamava de uma pequena tontura. Mas, ainda conversávamos como ótimos amigos que haviam se encontrado a pouco tempo.

Mas, ela pegou em minha mão, e apertou firme. Me senti incomodado no início. Porém, não recolhi minha mão. Senti meu coração disparar um pouco. Meu sangue estava circulando com mais velocidade. E meus olhos não focavam em nossas mãos.

– Obrigada por ter vindo, odiaria ter que enfrentar esse bando de babacas sozinha.
– Disponha. - Respirei fundo. – Mas eu tenho que ir.

Eu me levantei e me despedi dela.
Resolvi ir caminhando para casa. Estava pensando em tantas coisas, que seria melhor fazer uma caminhada.
Era engraçado, mas, quando Bárbara pegou em minha mão, eu senti a mesma coisa quando o Pedro pegou na minha. Uma sensação parecida. Tive vontade de beijar ela, assim como tive com o Pedro.
Eu me sentia confuso, como duas pessoas distintas podiam fazer isso?

150 Detalhes de VocêOnde histórias criam vida. Descubra agora