Não vivemos sem temer!

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Faltando apenas alguns segundos para a meia noite, Oliver não sabia o que esperar do ano seguinte, não sabia como poderia continuar a viver, mas sabia que continuaria, ele pensou em tudo e em todos, pessoas, momentos e decisões, coisas que uma criança não deveria se preocupar, mas as circunstâncias pediam outro tipo e atitude, com seu nome em uma lista, e prestes a ser riscado, ele aguardava ansiosamente a visita dos seus, ele olhava para o seu pai como um herói, igualzinho a aqueles que nós assistimos e lemos em filmes e revistas em quadrinhos, quando eles iam até prédios em chamas e salvavam as pessoas era uma ação digna do amor de um menino, ou quando eles salvavam a donzela do "cara mau" e sempre acabava em alguma cena de beijo, logo ele largava a revista e gritava: "Eca!". Pois para ele seu pai não era diferente, qualquer ação, por menor que fosse, fazia com que o menino apenas quisesse ser como o seu pai.

A sua mãe, ele via como um anjo em plena terra, toda a vez que a abraçava, ele sentia como se estivesse seguro novamente, como se tudo o que o atingisse fosse deixado para trás, ou simplesmente esquecido quando ela estava por perto. Ele a amou muito. Mais até do que ele mesmo podia imaginar, certa vez, na escola algo de infeliz aconteceu, o garoto de apenas oito anos acabou por machucar o seu pequeno braço jogando futebol, o que na verdade era apenas um ralado que já no dia seguinte não mais o incomodaria, ele fazia parecer como se o próprio braço fosse cair, chorando e reclamando como se no dia seguinte, o mesmo viesse a morrer... Sua mãe estava lá, e logo ele saiu correndo para seus braços, esperando uma solução mágica, mas o que ela poderia fazer... não era tão bom assim, lavar a ferida e passar mertiolate o que no começo, Oliver se recusou, mas depois de muita persuasão o menino aceitou, e depois de alguns segundos (que para a criança foram longas horas) logo o seu braço não ardia tanto, e então ele a abraçou muito forte, e disse: "Eu te amo mãe, tem refrí?", e logo voltou a ser energético novamente.

Agora, não obstante, uma cama de um hospital era onde a maioria do seu tempo era gasto, apenas deitado la, nem a sua mãe, nem o seu pai estava ali naquele momento, mas estavam a caminho, o menino olhou para o teto branco, e reparou que o mesmo não estava tão limpo quanto na primeira noite que passou ali, uma criança que era, num instante, alegre e energética, agora estava sempre cansada, e triste, com os olhos caídos, numa cama de um hospital, esperando novamente a visita de um anjo, e de um super-herói, mas, para a sua total decepção, o mundo já não era mais o mesmo, tudo parecia agora sem cor, sem gosto, e sem vida... um menino que vivia sempre cercado de pessoas, um garoto inteligente e fascinante, divertia a todos, tanto bebês, crianças e adultos, adorado por todos os que o conheciam, agora sentia-se abandonado, e sozinho naquela cama daquele hospital, mas que maldito hospital! 

O tempo passava, o seu aniversário seria na semana que vem, e sem dúvida seus pais fariam algo de especial, como sempre faziam, no seu aniversário de oito anos, seus pais fizeram uma festinha com bolo e alguns doces, mas a alegria dele foi tamanha que o fez acreditar que seus pais eram os melhores do mundo, e nessa "festinha" foram convidados os seus primos, com quem ele conviveu durante todos os seus dias na terra, chamaram inclusive o seu primo mais velho, de mais ou menos 13 anos de idade ambos brincaram muito, e naquele dia Oliver sentia toda a felicidade que uma criança poderia sentir.

Ele gostaria de ter esse momento outra vez, agora, sozinho ele olhava para a porta do quarto no qual ele se encontrava sozinho, no canto, apenas uma televisão ligada com alguns desenhos famosos e engraçados passando, seria ainda mais deprimente se ele tivesse que aguentar aquilo tudo sem Flap & Jack, ele acompanhava as falas dos personagens, e estava tentando descobrir qual seria a nova estratégia do falange para chegar até a ilha açúcar, e ele também acompanhou com muito entusiasmo o garoto Jack seguindo o capitão até o restaurante da cidade, a "Barriga Doce", e a conversa dos dois ficava cada vez mais interessante, quando subitamente, algo aparece na janela do seu quarto, assim que ele olha, ele vê um super-herói, mas infelizmente ele não podia o salvar, o rosto dele se vai, e ele vê um anjo, que infelizmente não pode o abraçar, e depois os dois se apertam, o menino tem a visão das duas pessoas que ele mais amava, a melhor dupla dessa terra, um anjo e um super-heróis juntos, sua mãe. e seu pai.

Eles não podiam entrar, eles nunca mais poderiam entrar, e o menino sabia disso, ele olhou para o relógio, pode observar que, depois de alguns segundos, já seria meia-noite, então ele olha para os seus pais, e sorri, triste, deprimido, e sozinho, com medo. Ele poderia ter feito mais, ele alcançaria mais! Ele teria tudo o que, como criança, nunca almejou ter, ele não teria super-poderes, não teria asas, nem poderia, um dia, viajar por todas as galáxias para conhecer outras espécies de vida, mas ele teria tido uma vida, eu posso ver, ele teria sido casado, ele estaria bem, ele viveria uma vida feliz e próspera, mas isso lhe foi arrancado com a maior brutalidade possível, e foi proibido de ser feliz, o que foi tirado dele, a sua vida, ele não passava de uma criança, ele não passava de um menino sonhador... Mas até os sonhos lhe foram tirados, e cuspidos pelo próprio destino. 

Oliver, então, encara novamente o relógio que ficava no canto do quarto, e a sua visão borrada o impediu de contemplar o "00:00" que indicava ser enfim 2020, mas o barulho dos fogos ao fundo fizeram com que, sem muito esforço, Oliver entendesse que o ano anterior havia ficado para trás, o menino sorriu levemente e logo após olhou para os seus pais, que também sorriam, mas não com alegria, eles sorriam com tristeza em seu rosto, coisa que ambos tentaram esconder dele, que assim que percebeu essa tentativa, sorrio mais uma vez materializando um: "Eu amo vocês, mamãe e papai", e em contra-partida, os mesmos sorrirão tentando dizer: "Nós também te amamos filho"

Enquanto esses olhares eram trocados, o rosto do menino empalideceu, seus pais notando o olhar sem expressão, do menino, olharam para a maquina que monitorava os seus batimentos cardíacos, as ondas altas e aceleradas, acabaram por serem substituídas por uma grande e assustadora linha reta, e fez ecoar um barulho que não foi possível ouvir pelo outro lado da porta, mas atingiu aos pais do menino, e de um jeito que eles prefeririam ter levado um tiro, a contemplar aquela imagem, eles prefeririam levar uma facada, ou sentir qualquer outro tipo de dor, pois comparada com aquela na qual estavam vivendo não seria nada, a dor deles foi semelhante a dor causada por uma grande queda-livre, que assim que chegasse ao chão, causaria estragos e dores desastrosas, porém enquanto não chegasse ao chão, o desespero aumentaria cada a vez mais, e mais até que a insana loucura lhe tenha tomado toda a mente, e tudo o que restasse fosse apenas deixar o seu corpo acertar o chão, não é tão fácil como parece, admito, mas os pais de Oliver iriam descobrir isso da pior maneira possível.

O menino ficava mais pálido a cada segundo, ele não esperava, e nem queria isso, ele queria naquele exato momento que um super-herói quebrasse a parede do hospital e tirasse ele de lá, ou que um anjo aparecesse, e o permitisse descansar debaixo de suas asas, o fato é que, por tudo o que passou aquele menino, nem eu consigo acreditar, ele sofrendo de uma doença degenerativa, que chegou a apodrecer as suas pernas, e tiveram que arranca-las, logo após isso o menino começou a respirar por aparelhos, sentir dores extremas no corpo e não poder mais ver de perto os próprios pais, pois todos achavam que aquilo era contagioso, o mental do menino, ia se deteriorando aos poucos, até no fim só sobrar uma criança triste, e perturbada. E a cada segundo que passava, ele sentia a morte mais próxima, nos seus minutos finais, tudo ficou escuro, ele não pode ver, nem ouvir mais nada, ele só podia sentir um imenso vazio tomando conta dele, ele sentia como se uma espécie de lodo preto invadisse o seu corpo e fosse o dominando pouco a pouco, preenchendo todo o espaço que havia, só que causando mais vazio, transformando tudo em uma espécie de pasta, e no final se congelando, dentro dele, e quando a vida finalmente esvaiu-se dele, ele encontrou o descanso que precisava.

A vida é injusta;

A vida é cheia de dor;

A vida é chorar e perder;

A vida é aceitar e se render;

A vida é continuar para perder;

A vida é amar para não ter;

A vida, não é viver para ser;

Não vivemos sem temer!

Oliver, no seu pouco tempo, apreciou cada instante, brincou e foi feliz, e em toda a sua pura inocência viveu até o último instante da sua vida, uma criança pura, e de bom coração, cuja a vida foi arrancada de um jeito trágico e cruel, agora não mais chora, seu silêncio continuara para sempre aqui, mas, onde quer que ela esteja agora, sendo em um paraíso, nos confins do universo, ou em qualquer outro lugar, sabe que mesmo com toda essa dor, a melhor coisa que um menino como ele poderia ter feito, foi viver.


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⏰ Last updated: Jan 02, 2020 ⏰

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A vida é injustaWhere stories live. Discover now