Sonho

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Ele era um ano mais velho do que eu, mais baixo e mais branco também. Eu gostei dele assim que eu o vi entrar na sala do primeiro ano do ensino médio. Eu sonhei com ele, pensei nele e até fantasio um futuro com ele. É estranho pra mim. Sempre me falaram que os meninos tem uns sonhos eróticos e sexualmente explícitos quando gostam de alguém, não que eu nunca tenha tido, mas com ele foi diferente.

Eu nunca sonhei nada sexual com ele, apenas sonhei com nós dois vivendo como dois amantes apaixonados, como aqueles de filmes da tarde que passam na televisão. Eu sempre imaginei isso.

Eu estava andando na rua quando vi um grupo de pessoas conversando, mas o quem me prendeu o olhar foram duas meninas, cada uma estava conversando com outra pessoa, mas ambas estavam com um pé pra fora da sandália e encostando os pés. E isso me fez imaginar. Elas aparentavam ter a minha idade, e algo que eu nunca tive com ninguém, intimidade. Não sexualmente falando, mas afetivamente falando. Era como se elas estivessem tão ligadas entre si que se tocavam magneticamente sem notar, era como se elas estivessem tão juntas que mesmo falando sobre assuntos diversos com outras pessoas, elas ainda estavam lá, com os pés se encostando e não parecendo se importar e não notar isso, conectadas ao acaso.

Eu pensei nele, era exatamente com isso que eu sonhava. Certo dia quase falei pra ele, mas me retraí ao ouvi da sua boca que ele estava ficando com uma menina. Quase que instantâneamente eu odeie a menina, desejei que sumisse, se mudasse. Isso não me impediu de sonhar.

Sonhei que estávamos os dois no ônibus voltando da escola, a tarde já ia embora e o céu estava laranja com o por do Sol. Ele sentado ao meu lado encostado a janela com os fones no ouvido. Eu sentado ao seu lado, suando de nervosismo, fastei-me sinuosamente pra mais próximo ao seu corpo e coloquei minha mão perto da dele, que por sua vez não se mexeu ao sentir meu singelo toque. Então aproximei mais a mão. Ele virou a palma macia para cima e eu repousei a minha áspera mão em cima da dele, que logo depois flexionou os dedos prendendo-me sem olhar. E ficamos lá, os dois sem trocar um olhar, apenas olhando o por do Sol com as mão juntas, estávamos concectados.

O sonho se repetiu dia a pós dia. Eu sofrendo calado com o meu iludido amor. Era uma tortura vê-lo entrar na sala, cada dia mais feliz, sem eu poder partilhar dessa felicidade. Dias se passaram e eu me afastei dele. O medo de me revelar me afastou.

Hoje olho para trás e lembro disso, não com um peso no peito, mas sim com um contentamento descontente. Com um vazio com milhares de "talvezes", talvez se eu tivesse falado, talvez se eu tivesse me permitido, talvez se eu tivesse mais segurança, talvez se eu pensasse menos e falasse mais.

Talvez.

As tristes crônicas que eu escrevi sem quererWhere stories live. Discover now