Capítulo XIX

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A P R I L


QUANDO CHEGUEI NA SALA, boa parte do quadro já estava tomada por anotações. A professora de História estava tão concentrada em terminar o rascunho de um mapa que sequer levantou os olhos do giz para me cumprimentar. Era sempre assim: primeiro, um bom resumo do conteúdo sobre a lousa, depois, aula.

Nunca fui de me incomodar com o burburinho que preenchia a sala de aula, mas naquele dia foi diferente.

Assim que dei as primeiras passadas em direção ao meu lugar, eu percebi. Algo estava errado. As conversas, antes animadas, se tornaram baixas. Algumas cabeças se viraram para arriscar um olhar, sem esconder a curiosidade. Aos poucos fui invadida pela sensação de que meu nome corria pela boca de toda turma.

Tudo bem. Talvez eu estivesse paranóica. Jackie sempre dizia que eu entrava na defensiva por besteira. Não havia razão para perder a calma.

De qualquer forma, minha resposta foi apertar o passo, decidida. Eu abria caminho entre as mochilas jogadas no chão com o queixo erguido. Não importava se meu cabelo ainda estava meio molhado por causa da chuva ou se minha sapatilha fazia barulho contra o piso.

Eu era April Wright. Ninguém me intimidava.

Para minha felicidade, meu lugar ainda estava vago. Era próximo à janela, ao lado de Zack. O guitarrista largou a caneta sobre o caderno para se espreguiçar. Não olhava para mim e, sim, para o quadro.

Posicionei minha bolsa de educação física sob o assento. Estava prestes a fazer o mesmo com a mochila quando uma voz feminina me chamou atenção:

— Hunter Campbell esteve aqui — era uma garota de ascendência asiática que se sentava no fundo da sala. Ela tinha cabelos curtos e escuros, cortados na altura do queixo, e seus braços estavam cruzados em sinal de irreverência. Havia um escudo azul bordado no bolso de seu uniforme. Uma Thomas. — Ele perguntou onde era seu lugar — eu continuei em silêncio, sem esconder minha confusão, e ela abriu um sorriso: — Não se preocupe, ninguém olhou.

Não respondi. Não havia nada que eu pudesse responder.

Ninguém olhou o quê?

Dei as costas para as meninas. Ainda tensa, me sentei na cadeira e ajeitei minha mochila sobre o apoio das costas. Nada fazia sentido. Hunter não seria maluco de me procurar. Não depois de ontem, não na frente de tantas pessoas. Ele não podia fazer isso.

Maldito seja.

Se a intenção de Hunter era me atormentar, então ele havia conseguido. Meu coração estava disparado desde o momento em que ouvi seu nome.

Foi apenas então que eu vi.

Um pequeno papel branco dobrado sobre o tampo da mesa. Tinha meu nome nele, escrito numa caligrafia desconhecida.

Eu o abri com cuidado.


Te devo aulas de direção.

— Hunter

Só isso.

Nada mais.

Virei o papel à procura de mais uma anotação, alguma pista do que estava acontecendo. Algo escapou por uma das pontas e caiu sobre a mesa. O barulho metálico me assustou. Consegui pegar antes que escorregasse para o chão. O objeto delicado se enroscou em meus dedos e eu abri a mão sem acreditar.

Era o meu colar.

O mesmo que havia perdido dias atrás. Não fazia ideia do paradeiro daquela joia e, de repente, Hunter a entregava para mim. Eu acompanhei o pequeno pingente de ouro com o polegar, me perguntando quantos segredos ainda escondia. Era lindo. Nem um outro parecia tão certo para o meu pescoço.

BULLSHITWhere stories live. Discover now