Capítulo XVI

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Cornualha

Sexta-feira, 12 de setembro de 2014

Tarde, 13h01

Eldric Heartland não ouviu o pronunciamento no rádio, pois durante todo o seu trajeto até Exeter o deixou tenso o bastante para que não suportasse ouvir nada que não fosse o bater do vento contra seu rosto, permitindo-se mandar uma mensagem para Harley perto das treze e trinta apenas para se certificar de que ela estava melhor do que ele.

A grama tinha um cheiro engraçado naquele dia, doce e úmido, apesar de não ter chovido mais, e o acompanhou até a entrada da cidade, assistindo aos poucos e baixos prédios cinzentos surgindo à sua frente, elevações que rompiam com o bucolismo exacerbado da estrada e traziam uma realidade dura ao dia a dia.

Ou talvez tudo isso foi bobeira e Eldric estivesse apenas remoendo a raiva dentro de si e culpando-se por nunca ter desconfiado, realmente, de que Lenny Lover poderia encobrir provas. O homem sabia que não tinham ainda uma ligação direta com ele, porém, conforme batia a porta do seu carro na frente de um edifício de três andares, Eldric tinha certeza de que Harley descobriria algo.

Aquela mulher confrontaria até o Diabo!

Segundo o endereço, aquela construção pálida e apática, por onde manchas escuras escorriam da janela como maquiagem borrada no rosto de uma prostituta chorona, era a atual morada de Dariel Adams, logo no primeiro piso. Ainda assim, demorou para que o interfone tocasse em resposta à chamada de Eldric.

Possivelmente, Dariel estava checando o monitor do interfone, se perguntando o que um homem alto, de ombros largos e cabelo raspado queria no meio da tarde, sem reconhecer suas fisionomias ou postura.

É, deve ser por isso que ele está demorando...

Mas não era. Dariel Adams estava bem atrás dele, com duas sacolas de papel reciclável recheadas das compras do mercado no instante em que perguntou:

— O que você quer aqui?

Ouvir uma voz grossa atrás de si fez o detetive girar nos calcanhares, admirado com a figura do homem que estava ali. Dariel Adams tinha quase cento e noventa centímetros, corpulento, puro músculo, com a pele bronzeada e cabelos tão loiros quantos os de Elena, apesar de seus olhos serem devidamente enegrecidos, como chocolate, o queixo pontudo em um maxilar quadrado que parecia ter sido feito por um cirurgião, o peito firme coberto — se é que se pode dizer assim — por uma regata de malha fina que não se envergonhava em mostrar sua incapacidade de cobrir a pele.

— Dariel Adams? — perguntou só para ter certeza, apesar de já tê-lo reconhecido.

— Sim. O que quer aqui? — insistiu agressivo conforme o som de um porta-malas se fechando ressoou perto deles, guiando os olhos de Heartland até um sedã prateado onde um outro homem, tão forte quanto, vinha com as últimas sacolas.

— Sou o detetive Heartland, Sr. Adams — apresentou-se com um sorriso frouxo. — Precisamos conversar.

— O que foi? — perguntou a nova figura entre eles, a voz mais fina e com uma barba rala por fazer. — Está tudo bem.

— Eu não sei. — Dariel estreitou o olhar, confuso. — Está?

Eldric sentiu um bolo formando-se em sua garganta.

— Acredite, se eu estou aqui, não é por algo bom.

...

Uma profusão de latidos os recebeu assim que entraram na casa, ignorando a escadaria no lado esquerdo, forrada de um carpete que já precisava ser trocado, e que levava para os outros dois inquilinos acima deles.

Passado Perverso (DEGUSTAÇÃO)Unde poveștirile trăiesc. Descoperă acum