Meu Indomável Devasso

Felipe

A luz crepuscular se instala sobre a estância, em alguns minutos estarei indo para casa, falta apenas mandar uma proposta para a compra de um cavalo árabe. Dou uma última lida em minha oferta antes de mandar. Quando acabo de passar o e-mail ouço uma batida em minha porta e tiro os olhos do computador.

— Felipe, você tem visita — informa Mônica, uma das secretárias.

— Quem é? Não espero por ninguém.

Ela dá um sorriso sem graça.

— É a sua mãe — revela.

Estava demorando, ela deve estar incomodada com minha falta de comunicação, tem três semanas que pus Roberto para correr, e seguindo o conselho da minha prenda decidi ignorar a Solange. Sabia que ainda estava em Santa Clara de Assis, decerto aguardava que a qualquer momento iria procurá-la. Imagino o quanto se frustrou, já que resolveu aparecer.

— Mande-a entrar. — Melhor atendê-la logo, ou conhecendo bem a Solange virá até que seja atendida, e provavelmente fará algum escândalo.

Mônica assente e logo Solange entra como se fosse dona do lugar, ela não perde a soberba nunca.

— Felipe, precisamos conversar — diz atravessando a sala.

— Não tenho nada para falar com você — respondo enquanto desligo o computador. — Só permiti sua entrada para não constranger minha secretária com seus escândalos.

Sem ser convidada ela senta-se ficando de frente para mim. Finalmente olho em sua direção. Ela está muito maquiada como sempre e tem o cabelo armado como se tivesse acabado de sair do salão.

— Você deve estar pensando mal de mim, mas quero que saiba que o Roberto armou para cima de mim, tudo faz parte de uma trama entre ele e aquela guria.

Bem típico de Solange não assumir suas tramoias. Assisto sua postura altiva e não sei como uma pessoa pode ser tão perversa. Ela não tem consciência, por isso debater com ela é como dar murro em ponta de faca. Essa mulher age e acredita ser incontestável. Para ela, tudo que faz é normal, não interessa se está ou não prejudicando alguém.

Creio que seja a hora de aceitar quem é Solange, ela não vai mudar nunca. É uma mulher sem sentimentos, é gananciosa e só gosta dela mesma. Passei uma vida inteira tentando entender por que agia assim, tive raiva dela e muita das vezes descontava essa raiva em outras pessoas. Sempre que estava por perto, despertava em mim uma mágoa e acabávamos brigando, sentia que ela gostava de me ver assim, pois assim sentia que tinha algum controle sobre mim.

Agora isso acabou, estou aqui a olhando e não consigo sentir nada. Solange não pode mais me afetar.

— Tudo bem — digo e me levanto. Pego o celular e vejo a hora. Não posso me demorar, pois combinei de levar minha professorinha para comer um sanduiche. Coisa de grávida. — Se era isso que tinha para falar já falou, agora preciso ir. Tenho um compromisso.

Noto que ela se levanta e a encaro, sua expressão é de pura surpresa, ela aperta a alça de sua bolsa de oncinha, então fecha os lábios apertados antes de falar.

— Felipe, eu sou sua mãe. Se hoje você é um fazendeiro de sucesso é por minha causa, tudo isso aqui sempre pertenceu a minha família. — Ela não perde a oportunidade de jogar isso em minha cara.

Esse era o momento em que eu perdia a paciência.

— Vamos fazer o seguinte: Já que você tem tanta certeza disso procure um advogado, vamos resolver tudo legalmente — proponho e sei que ela não fará isso, pois sabe que não tem mais nenhum direito sobre essas terras. — Poderemos documentar tudo e então te dou sua parte sem nenhuma dificuldade.