METADE DA MINHA LARANJA

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No começo eu me sentia estranha, quando nos encontrávamos no show para trabalhar, não por mim ou pelo Henrique, que cada dia nos sentíamos mais à vontade um com o outro, mas por algumas pessoas da banda, que insistiam em fazer piadinha e me deixar desconfortável.

Eu tentei agir como uma funcionária igual os demais, mas aos poucos minha ficha foi caindo que isso jamais será genuíno, afinal, sempre que pode o Henrique intervém a meu favor, seja para viajar com ele de carro ou de Jatinho, diferente do restante da equipe que vai sempre no ônibus. Então concluí que preciso aceitar que sou sim parte da equipe e preciso dar meu melhor com a minha fotografia e meu comportamento profissional enquanto ele está no palco, mas que quando estamos juntos, tentar reprimir nossa vida por causa de comentários de terceiros, não é o certo a fazer.

Confesso que desde que assumimos a nossa relação publicamente, nossos dias ficaram mais fáceis, sem tantos problemas, mas incrivelmente agitados. Nos dividimos entre ficarmos juntinhos, com nossas famílias e o nosso trabalho. Durante os primeiros dias da semana geralmente ficamos aqui em casa, por causa do meu estúdio e da escola da Lúcia; já nas quintas a noite ele quase sempre volta pro Sul e então nos reencontramos na sexta, antes dos shows, geralmente em meio a milhares de pessoas.

O convívio entre a Lucia e o Henrique se estreitou muito nesses meses, o que me deixa imensamente feliz. Na realidade desde o início eles se deram muito bem, mas com o passar do tempo ele foi se mostrando um homem muito carinhoso, dedicado e paciente com ela, entrando em aventuras de cabana na minha sala ou ensinando-a pescar no lago da fazenda dos pais dele, onde aprendeu a andar de cavalo com o Pedro, que também se deu bem com ela muito rapidamente.

A Lídia e o Roberto fazem questão de demonstrar a todo instante, quando vamos para Bagé, o quanto a Lúcia é bem-vinda e enche de luz a casa e a vida deles. Vê-los com ela assim é de emocionar e quem observa de fora, nem consegue imaginar que eles não sejam avós de sangue dela e isso, claro, me deixa ainda mais feliz. Minha relação com eles também é carregada de muito carinho e quanto mais conheço os dois e vejo-os interagindo felizes com a Lulu e com o Henrique mesmo, minha admiração só aumenta.

A única pessoa próxima a mim, que não ficou nada contente com a notícia e desde então não faz mais questão de esconder o seu rancor e magoa é a Beatriz, avó da Lucia. Ela aproveita toda e qualquer oportunidade para insinuar que estou trocando a Lucia pelo Henrique ou pelo trabalho. Que a estou terceirizando e jogando minha responsabilidade de mãe, para a minha mãe, que tinha que ser apenas avó. Confesso que minha vontade muitas vezes é confronta-la e dar um sacode, mas em respeito primeiramente a idade dela e ao sofrimento que sei que carregará pela vida toda, eu optei apenas por ignora-la e falar o básico do básico, somente quando estritamente necessário.

O tempo parece passar tão acelerado quanto nossa rotina e nem consigo acreditar que daqui a dois dias já vamos comemorar seis meses de namoro, superando qualquer expectativa, já que muita gente duvidava que fossemos durar um mês sequer juntos. Nesse tempo o Henrique fez questão de me fazer sentir segura com nossa relação e extremamente confiante de seu amor por mim. Cada oportunidade que têm de me surpreender e me encantar, ele o faz, tornando nossos dias cada vez mais cheios de amor. Claro que eu também me esforço ao máximo para fazê-lo se sentir tão amado quanto me sinto e tenho certeza que consegui isso no dia do seu aniversário de 35 anos, quando juntei todos daqui de Sampa e os carreguei para Bagé, para fazermos uma festa surpresa, com direito a fogueira, quadrilha e muitas bandeirinhas, já que ele faz aniversário em junho.

Para comemorar esse marco e também aproveitar uma semana que teremos livre na agenda de shows, vamos viajar para os Estados Unidos. E isso, apesar de ser uma delícia, por realizar um sonho antigo, dá um trabalho gigantesco, que eu nem imaginava. Fico as voltas com passagens aéreas, aluguel de carro, hospedagens, passaportes e visto norte-americano para Lúcia e eu, já que o Henrique já viajou para lá antes. Como sou a única responsável pela Lucia, não preciso de autorização, mas a Beatriz já deixou claro que não queria que ela viajasse para fora com um estranho, como ela sempre se refere ao Henrique.

A ideia inicial era que a Melissa e o Paulo fossem conosco, mas ela teve um aumento da pressão nas últimas semanas e a obstetra recomendou que cancelassem a viagem, para que ela possa repousar, já que ela está no terceiro trimestre da gestação, então seremos só nós três, como uma família.

RECOMEÇARWhere stories live. Discover now