Anne
A caminho de casa meus pensamentos voam sobre Marilla, sua paixão improvável e seu doloroso romance trágico. Eu nunca havia amado para compreender completamente a sua dor, mas as leituras de meus preciosos livros proporcionaram-me um conhecimento ao menos superficial.
Pego-me pensando também naqueles olhos indecifráveis. Gilbert é como uma criatura mística, que paralisa-me com apenas um olhar. Quando há tal conexão, não sei o que pensar, agir ou falar, apenas encarar.
— Ora, ora, ora, se não é a cadelinha. – surpreende-me Billy ao surgir de repente.
Aperto o passo para desviar-me de suas palavras ácidas e de seu toque emproado.
— Pensa que eu me esqueci da nossa conversinha? Ainda não terminamos, você deve-me um pedido de desculpas apropriado. – ele exclama parando em minha frente e impedindo a passagem.
— Não ouse tocar em mim!
— Ah, e por que eu tocaria em alguém como você Anne Shirley? É, e sempre será, como um rato repugnante que se esgueira por canos velhos.
Sinto meu corpo estremecer, minhas mãos começam a soar e as persistentes lembranças da minha infância traumática invadem minha mente.
— Veja só, hoje o seu protetor não está aqui. Então, repito como da última vez: ajoelhe-se, implore meu perdão e beije meus pés! Um apropriado pedido para alguém tão miserável quanto uma cadela de rua, ou um rato nojento.
Permaneço imóvel tentando lutar contra meus pensamentos sombrios. Billy violentamente empurra-me, fazendo-me deslizar com o chão ainda molhado pela chuva, e cair de joelhos.
— Agora faça o que lhe mandei! – ele grita.
— Eu prefiro sair daqui machucada a ter que pedir perdão para um ser humano tão desprezível quanto você. – digo encarando-o corajosamente.
— Que assim seja. – ele esbraveja empurrando velozmente meu rosto contra o chão com seus pés.
Minha boca bate agressivamente contra a calçada de pedregulhos, e imediatamente sinto um gosto metálico apossando-se de meus lábios.
Antes que pudesse protestar, percebo-o sendo tirado de cima de mim e ouço ruídos de briga. Viro-me e vejo-o sendo agredido por um garoto desconhecido.
Billy leva vários socos no olho direito e mesmo tentando rebater falha, saindo correndo.
O garoto se vira para mim e ajuda-me a levantar.
— Você está bem? – ele pergunta analisando-me.
— Já estive melhor. – digo rindo e gemo ao sentir uma dor anormal em meus lábios.
— Seu lábio está sangrando muito, acredito que tenha sido um corte bem profundo. Venha, eu trabalho na cafeteria Sonho Doce, lá tem um telefone e você pode ligar para seus pais.
— Muito obrigada. Meu nome é Anne Shirley, com E. – digo estendendo a mão.
— Sou Cole Mackenzie. – ele responde sorrindo e cumprimentando-me.
Cole é um garoto muito bonito. Cabelos loiros, olhos azuis esverdeados e um sorriso meigo e simpático.
— Qual a sua idade? – pergunto ao chegarmos na cafeteria.
— Quinze, e a sua?
— Quinze também... – digo pegando o telefone – desculpe a pergunta, mas você já trabalha?
— Infelizmente minha família não vive em boas condições, então temos que fazer certos esforços.
— Entendo, mas mesmo assim você estuda, certo?
Ele olha-me como se não quisesse mentir, entrega-me um saquinho com gelo e antes que pudesse responder Marilla atende nosso único telefone fixo.
— Alô, Marilla? – digo com dificuldade por conta da boca.
— Anne, onde você está mocinha? Estamos preocupados! – ela diz eufórica.
— Eu estou numa cafeteria perto de casa. Estava andando e acabei caindo numa calçada de pedregulhos, uma pedrinha perfurou a minha boca, mas está tudo bem. – Cole lança-me um olhar de reprovação.
— Anne Shirley-Cuthbert, quantas vezes tenho que lhe dizer para ser menos desmazelada? Passe-me o endereço da cafeteria que estamos indo buscá-la.
Enquanto espero Marilla e Matthew tento puxar assunto com Cole.
— Então, ainda não me respondeu. Você estuda, certo?
— Se eu lhe disser, promete não me julgar?- assinto e ele continua – Eu deixei a escola.
— O que? Cole, seus pais sabem?
— Sim, e não fizeram questão para eu voltar.
— E por que você deixou-a?
— Eu sofria inúmeros ataques de bullying de pessoas como aquele menino que estava com você. E por mais que tenha denunciado para professores e meus próprios pais, eles sempre disseram que era drama.
— Eu lhe entendo Cole. Mudei-me há poucos dias para cá, e mesmo sendo difícil, continuo persistindo. Eu prometo lhe acolher e não deixar que nenhum mal lhe aconteça se pensar em estudar na minha escola.
— Obrigado Anne. – ele diz com os olhos marejados.
— Já ouviu falar de almas irmãs? Sinto nossas essências interligadas, assim como de minha melhor amiga, Diana. Espero que sejamos grandes amigos. – digo abrindo um sorriso extasiante e logo me reprimindo pela dor causada.
Marilla e Matthew chegam.
— Ó Anne, cada susto que você nos dá! Por que raios está toda molhada? Se não acabar ficando doente, certamente serei eu. – diz Marilla.
— Perdão Marilla, prometo tentar ser mais delicada. Este é Cole, meu amigo. – aponto para o garoto atrás da bancada – Ele me viu tropeçando e me ajudou. – Cole novamente lança-me um olhar de reprovação ao omitir a verdade.
— Muito obrigada Cole. – diz Marilla. Tiro o saquinho de gelo e ela espanta-se – Anne, isto está muito profundo, teremos de levá-la ao hospital!
Por mais que tente convencê-los do contrário, estão certos, a dor me dilacera.
— Muito bem, deixe-me ver. – diz o médico – Por Deus, o que aconteceu?
— Eu caí em uma calçada de pedregulhos. – minto. O doutor olha-me desconfiado.
— Isto me parece bem mais grave do que uma simples queda.
— Costumo ser bem distraída. – ele dá indícios de que ainda não está convencido, mas resolve manter minha omissão.
— Certo, sinto lhe dizer, mas isso renderá vários pontos. Tome mais cuidado mocinha. – entendo seu alerta e apenas assinto, agradecendo-o mentalmente.
Oii gente, desculpa pelo chá de sumiço por dois dias. Como eu disse, meu estoque de textos acabou e minhas aulas voltam semana que vem.
Até que eu consiga fazer uma boa cota de capítulos, vou postar de dois em dois dias.
Muito obrigada por acompanharem❤️
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Anne With An E - século XXI - fanfic - EM PAUSA🚫
FanfictionApós dois anos vivendo em seu tão amado e apreciado lar: Green Gables, em Avonlea, Anne e seus pais adotivos se mudam para cidade grande: Charlottetown, em busca de novas oportunidades. As expectativas para a nova vida os anseiam, gerando dilemas qu...