Doze

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Restavam apenas três dedos de bebida no fundo da garrafa quando a ligação me fez perceber que Kai tinha acordado. Com uma careta, tomei mais um grande gole. Não estava nem perto de ficar tão bêbada quanto desejava. Encarei o armário de bebidas, calculando a distância e os obstáculos até lá. Precisava de outra garrafa. Olhei para o resto de veras, hesitando um instante antes de virar tudo e me levantar. A sala rodou, e esperei alguns segundos antes de sair do lugar. Com passos cuidadosos, fui até o armário e peguei a outra garrafa de veras que tinha visto. Me sentei pesadamente, encarando a garrafa como se ela pudesse me dar as respostas que precisava.

Patético.

Uma parte de mim ainda me repreendia por aquilo. Minha época de beber para esquecer os problemas já tinha ficado para trás. Mas não conseguia pensar em outra forma de reagir. Era isto ou cair na histeria. Com esforço, levantei todos os escudos ao redor da minha mente, lutando contra a ligação que queria que estivesse completamente aberta para o homem. Ele não veria nada de mim, não enquanto eu tivesse forças para evitar. E depois... Eu preferia morrer a ser controlada por alguém que me traíra.

A porta se abriu, me tirando do meu devaneio. Meus olhos na garrafa, me concentrei em tirar o lacre. Não queria nem mesmo olhar para Kai. Não queria ouvir o que ele teria a dizer, nem ver sua expressão.

– Aíla? – homem chamou.

Respirei fundo, tentando conter minha reação. Não tinha esperado pelo tom hesitante e preocupado que ele usara. Em silêncio, terminei de soltar o lacre, abrindo a garrafa logo em seguida.

– Já conseguiu o que queria, pode parar de fingir. – falei, minha voz soando fria e cortante, mesmo sob efeito do álcool.

– Do que você está falando?

Kai se aproximou, seus movimentos mostrando que não se recuperara completamente. Ele parou ao perceber a garrafa já vazia ao meu lado, seu olhar se desviando para minhas mãos.

– Veras? – ele perguntou.

– Te dou outras garrafas depois. – respondi, dando de ombros e bebendo um grande gole. – Sei onde comprar desta aqui.

– Aíla, olhe para mim. – sua voz soou contida e marcada, como se ele estivesse fazendo um esforço para falar.

Me virei para ele, minha cabeça levemente inclinada e minha expressão completamente vazia. Mas meus olhos eram gelo. O silêncio se estendeu, e vi quando ele ergueu a mão, como se fosse me tocar. Ergui uma sobrancelha, deixando claro que não aceitaria o gesto. Sua expressão se fechando, o homem me deu as costas.

– Não foi culpa sua.

Dei de ombros, mesmo sabendo que ele não veria o movimento, antes de tomar mais um gole de veras.

– Não foi culpa sua. – ele repetiu, se virando, sua expressão agora perfeitamente controlada. – Não tinha como saber que os airenis escapariam levando Edel.

Ah, então ele achava que eu estava bebendo assim por isso? Não consegui conter uma risada gelada, e vi a surpresa passar pelos olhos do homem.

– Os airenis não tiveram a menor chance de recapturar Edel. A essa altura, ele já deve estar em Linas. Agora que já estou online na nossa rede novamente, alguém irá me informar assim que a situação se definir. – respondi.

O silêncio voltou a se estender, tenso e desconfortável. Desviei meus olhos, virando a garrafa mais uma vez. Alguns minutos se passaram antes que Kai cedesse, sua voz soando estranhamente intensa.

– O que aconteceu, Aíla?

Balancei a cabeça, um sorriso amargo no meu rosto. Será que ele realmente imaginava que eu era tão ingênua assim?

Sentinela (Crônicas de Táiran #1) [Degustação]Where stories live. Discover now