Capítulo Único

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"Ao meu Kanji,

Pensei muito em como lhe dizer o que você significa para mim. Lembro quando me apaixonei por você pela primeira vez, como se fosse ontem. Deitada, nua, ao seu lado naquele apartamento minúsculo. Ali, me dei conta que eu fazia parte de algo maior.

Antes, eu vivia minha vida como se eu soubesse tudo e de repente uma luz forte me sacudiu e me fez acordar: a luz era você. Nem acredito que já se passaram 50 anos que estamos casados. E, ainda hoje, dia após dia... Todos os dias... Você me faz sentir como se eu fosse aquela garota a embarcar nessa nossa louca aventura.

Feliz aniversário de casamento, meu amor.

Meu amigo até o fim.

Ass: Akemi."

Atrás de seus olhos de vidros, Sasuke sussurrava estas palavras para concluir mais uma carta que enviaria a um desconhecido qualquer atendendo a mais um pedido dos infinitos que chegavam em sua mesa. Essa era sua rotina, melhor, era seu trabalho. Trabalho de vida. Ele era destaque na empresa que trabalhava pelas palavras e sentimentalismos que colocava em suas cartas. Cartas que eram pedidas por apaixonados, por filhos, por mães, pais ou ex-guerrilheiros desesperados para colocar em folha o que sentiam, mas não tinham tal sensibilidade.

O Santuário de Naka era uma empresa renomada no Japão que tinha o objetivo simples de terem escritores, especificamente de cartas, para atender aos pedidos de seus clientes de que se escrevessem cartas. Os pedidos normalmente vinham com um breve resumo das principais características à serem abordadas nas cartas, sejam elas características físicas do destinatário ou remetente, histórias à serem relembradas, até mesmo um apenas: "Fale sobre amor ou perdão ou saudade".

Sasuke se dava bem com isso, ele gostava muito de escrever sobre sentimentos, ele apenas se transportava para dentro do personagem tentando sentir na pele o que o remetente sentia e, dessa forma, a carta fluía. O que ninguém poderia imaginar é a vida fodida que Sasuke vivia. Não pela parte financeira já que tinha tudo de última geração, um apartamento muito bem decorado com janelas que conseguia ver toda a cidade e uma coleção de bebidas alcoólicas que causava inveja à qualquer boêmio negligenciado por aí. Mas, sim, sua vida sentimental. Esta era verdadeiramente uma merda.

Como pode alguém com palavras tão lindas ser tão raso?

— Imprima – Assim ditou para seu computador que entendia muito bem os seus comandos para, enfim, colocar a carta em um envelope, assinar o destinatário e colocá-la na caixa de postagem. Pronto. Mais um trabalho concluído. Mais uma pessoa feliz e emocionada. Então, assim, satisfeito pensou: Hora de ir pra casa encarar a realidade nua e crua.

Deixando seu cubículo muito bem organizado e harmonioso para trás atravessou o salão que era possível ouvir tantos outros empregados ditar cartas que seriam entregues para destinatários tão ansiosos quanto os seus.

Já no elevador lotado da empresa como era de se esperar ao fim do expediente, ele se encosta na parede apoiando a cabeça para trás e a fim de calar todo murmúrio alheio coloca seu fone de ouvido sem fio e pede: "Toque uma música melancólica", assim como esperado de uma máquina extremamente inteligente, o celular logo começou a tocar uma música da característica que lhe fora mandado em seu ouvido.

Decepcionado com a escolha dos algoritmos, torna a pedir: "Toque uma música melancólica diferente" dizendo em tom de voz normal pois nesta era é normal que as pessoas conversassem com seus sistemas operacionais. Imediatamente, a música fora trocada por uma que agradava melhor o teu cerébro.

Fora do prédio a caminho do metrô, em meio à multidão e ainda com a música triste que combinava com sua vida de fundo, tornou a pedir: "Check os e-mails" e uma voz feminina robótica em seu ouvido lhe respondeu:

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