Capítulo 19

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[...] Então você tem que se animar,
você tem que se deixar levar.
Você nunca será amado até que faça
por si mesmo. Você tem que enfrentar,
você tem que conquistar o que é seu.
Você nunca conhecerá o topo antes
de ficar muito embaixo [...]

So Sorry- Imagine Dragons

528 anos antes...

Os joelhos de Cassian quase cederam no chão enlameado que já se enchia de neve novamente. Aquele era o mesmo ciclo de todos os dias. Acordar, ajudar nas tarefas do acampamento, lutar, lutar e lutar até que seus ossos ficassem tão fracos que pareciam que a qualquer momento iriam se estilhaçar, e depois, arranjar um abrigo decente ou passar a noite tendo como teto as estrelas e o frio mortal como sua única companhia. A blusa gasta e suja que vestia era tão fina ao ponto de parecer que não vestia nada. Aquela era sua existência miserável, ter que mostrar seu valor até mesmo para ganhar uma migalha.

As costas totalmente esfoladas e sangrentas devido ao "encorajamento" do acampamento o fazia ranger os dentes a cada passo que dava. A dor latejante parecia descer por sua coluna e depois para as pernas.
Kiron havia o "encorajado" a continuar tendo um bom treino há algumas horas atrás. O sorriso asqueroso que ele havia dado para Cassian quando pegou o chicote, fez o estômago do menino se revirar. "De joelhos, verme bastardo" disse Kiron para o garoto. Cassian obedeceu, mesmo que ele quisesse esmagar o crânio do guerreiro de mais de 4 séculos. O jovem apenas engoliu em seco e se preparou para sentir o primeiro golpe do chicote em contato a sua pele.
Ele contou mentalmente cada golpe.
1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10.
10 golpes de açoite, e em nenhum momento ele deu o prazer a Kiron de ouvir um só grito seu de piedade.

Não importava quanto tempo passasse, Cassian nunca se acostumaria com o fato daquilo ser considerado normal no acampamento. Ele estava se saindo bem comparado na primeira vez que aquilo havia o ocorrido. O menino havia socado, gritado e chutado, feito o que conseguiu para não ser açoitado. Mal sabia ele que não havia escolha, e quando o chicote desceu em suas costas até então macias, sem nenhuma marca ou cicatriz, seus gritos de súplica e dor ecoaram todo o acampamento.

O menino continuou andando, procurando alguma qualquer coisa que pudesse chamar de abrigo na vasta floresta que agora se estendia a sua vista, até que a luz amarela da varanda de uma casa foi acesa, e uma fêmea com duas crianças -provavelmente seus filhos- o chamou gentilmente para se aproximar. Cassian hesitou por um instante, mas qualquer coisa -literalmente qualquer coisa- era melhor do que passar o restante da noite de estômago vazio e dormir sem um abrigo. A varanda da bela cabana em que a fêmea se encontrava era considerada muito luxuosa se comparada as outras residências existentes em Illyria. A madeira do piso rangeu quando ele entrou na grande varanda. Cassian se aproximou ainda mais da fêmea, ele enrijeceu a postura o que fez um grunhido de dor escapar de sua boca.
"As costas feridas, idiota" lembrou ele a si mesmo.

Olá criança — cumprimentou a fêmea illyriana. Cassian não sabia com o que ele ficava mais surpreso, com a beleza estonteante dela ou o caloroso sorriso de mãe com que ela o recebeu.
Mesmo assim Cassian não ousou abrir a boca, apenas um leve aceno de cabeça. "Jamais dirija a palavra a seus senhores, você não é digno nem mesmo disso". Uma regra importante que Kiron o havia ensinado desde o primeiro dia no acampamento.

Cassian olhou para as crianças da fêmea, o menino ao seu lado, e a menina em seu colo, apesar de já ter idade suficiente para saber andar. Ele franziu o cenho para a roupa engomadinha e bonitinha que o garoto a sua frente vestia. As asas retraídas por conta do frio e os olhos violentas que olhavam de vez em quando para sua provável mãe, logo depois se deteram em Cassian e no olhar que o mesmo dava para suas roupas. O garoto a sua frente grunhiu de leve.

Corte de Chamas e Caos (Nessian)Donde viven las historias. Descúbrelo ahora