capítulo 1

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Crec, crec, crec.

É o som padronizado dos meus passos no cascalho, do que imagino ser, a rua. Estou indo para a escola como de costume sozinha, acompanhada do meu fiel amigo, Carinho.

Carinho é meu labrador porte grande, que, além de ser meu melhor amigo, é também meu guia de todas as horas. Ele sempre me acompanha para a escola, já que minha mãe está sempre ocupados demais fazendo alguma-coisa-mais-importante-que-a-Melissa, e eu não tenho nenhum amigo disposto a me acompanhar todos os dias para a escola, na verdade, eu não tenho nenhum amigo na escola. Então somos só eu e meu eterno companheiro, Carinho.

Todos os dias, deixo Carinho no pet shop, que por sorte é ao lado da escola. Como estou ouvindo passos e vozes mais fortes, percebo que cheguei ao meu destino. Subo 1,2,3,4,5,6, e ufa, 7 degraus com as pernas vacilantes. Hoje é o meu primeiro dia de aula no primeiro ano do ensino médio, e mesmo eu sabendo que tudo vai, bem, continuar sendo a mesma coisa de sempre, fico meio apreensiva.

Eu não os vejo, mas sinto os olhares de todos me encarando e as borboletas no meu estômago se agitam e ficam em constante movimento. Encaradas que recebo com razão, afinal, sou a única aluna dessa escola inteira que usa óculos escuros e bengala, por motivos de: Não enxergo absolutamente nada.

Percorro o longo corredor e encontro a inspetora, que louvada seja, me levou até minha nova sala, a última do corredor da direita, já lotada com pessoas para mim completamente conhecidas, e que me ignoram desde o dia que entrei nessa escola (Sou cega meus queridos, mas não sou invisível). Sento na última carteira como sempre, e acontece a mesma rotina:

O sinal toca.
Passos apressados até as salas.
Burburinho e conversas paralelas.
O professor entrando, com ar imponente, e silenciando todos os meus colegas.
E é claro, todas as 4 carteiras ao redor de mim completamente vazias.

Nossa, como que eu estava sentindo falta da escola! É maravilhoso estar de volta!

Quando eu abro meu tablet e conecto meu headfone (já que não uso cadernos e não sei escrever, todos meus livros são audio books. Uso um headfone e faço as anotações com auxilio de alguns aplicativos.) ouço passos, 4, para ser mais exata. Nunca tinha os ouvido antes, e o tilintar dos chaveiros de uma das mochilas me chamou a atenção: dois alunos novos.

Ouço seus passos aumentarem de intensidade até o meu lado, um se senta na minha frente, e outro, ao meu lado.
Sinto um perfume masculino forte e uma risada feminina fina abafada. A pessoa da minha frente (muito provavelmente a menina que emitiu a risadinha abafada)

- Oi, eu sou a Clara!

Por quê ela está falando comigo? Ela nunca ouviu que, se tem alguém de óculos escuros cobrindo metade de seu rosto, excluida ao fundo de uma sala de aula, essa pessoa DEVE continuar sozinha?

- E eu sou o Pedro, prazer.

Quando o garoto falou, senti que ele também deu um sorriso de canto de boca. Eu, vacilante, disse as palavras mais sábias e mais bem pensadas que vocês lerão nessa história inteira:

- Eu, sou, amnn... Eu me chamo Melissa.

Invisível aos olhosWhere stories live. Discover now