Capítulo 01 - A intragável e desigual balança do poder

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— Te chamei para informar que você fará parte da comissão de segurança dos senadores e candidatos no evento de mais tarde — Rodolffo Mathaus disse no seu tom que, como quase sempre, era impaciente. Bianca, no entanto, não se apegou a sua indiferença corriqueira.

Calejada de tempos pelos impropérios em forma de ordem que ultrapassavam os lábios finos do delegado-chefe da secretaria de polícia do senado federal a agente sequer se esforçou em ofertar-lhe qualquer indício de insatisfação, nem mesmo com seu típico dedo do meio levantado escondido.

Porque a verdade, no fim, era que não importava no mais mínimo a vontade com que o homem proferiu o discurso se acabou por convoca-la para uma tarefa coerente com o cargo que ocupava. Era a primeira oportunidade efetiva de Bianca Andrade depois de nove semanas atuando somente em questões de natureza administrativa, mesmo que tivesse potencial de muito mais.

E não era a agente que informava ser capaz e sim os fatos. Aprovada em primeiro lugar no concurso do Senado Federal para o cargo de policial legislativa havia sido remanejada para o departamento de segurança comandado por Rodolffo que pareceu insatisfeito desde o momento que Bianca cruzou a porta da divisão.

Afinal, desde aquele episódio o homem moreno de rosto mau encarado parecia ter se encarregado pessoalmente de retira-la de todos os casos com as desculpas mais diversas:

"Ela não consegue garantir a segurança e integridade física do patrimônio no Senado"

"Não me parece apta para assessorar a administração da Casa no exercício do poder de polícia"

O que todas tinham em comum? Um teor indisfarçável de machismo. Sendo a única mulher a trabalhar o recinto Bianca passava seus dias se desdobrando ao máximo para ser a número um quando bem sabia que, apesar de suas aptidões, sempre seria a segunda em relação a qualquer homem.

Ao menos você não passará mais uma noite passando café e arquivando casos não resolvidos como se fosse uma secretária.

A carioca relembrou na sua mente a título de contentamento e o atingiu mesmo que misturado com certo amargor. Por mais que não fosse da maneira que idealizou ao menos era uma primeira chance de provar que era a melhor entre os presentes, já que só sua trajetória da aprovação até ali não bastava.

Não era esse seu sonho?

Sua mente a relembrou e foi esse pensamento que manteve em sua mente conforme se sentou em sua cadeira em frente ao computador sem ainda começar a trabalhar naquele início de manhã.

A Bianca de cinco anos estaria orgulhosa.

Filha de uma mãe viúva cujo marido havia morrido pela farda a jovem de 25 havia experimentado a dor e a delícia de conviver de cedo no meio de uma família que valorizava as leis, a disciplina e a ética. As três palavras construíram sua índole e a conduziram até literalmente o lugar que ocupava. Jamais sonhou em fazer outra coisa. Enquanto sua irmã mais nova se divertia entre carrinhos e bonecas Bianca assistia programas policiais e fingia pregava sobre seu peito com um grampeador o desenho de um distintivo.

Nunca pensou em não ser como Marcos Andrade e sua mãe a incentivava a seguir aquele modelo incorruptível de moral, respeitando sempre a vontade da filha que mais consentia. A carioca sabia que Monica não fazia diferenças entre ela e Íris, mas era verdade que só uma delas podia levar as namoradas para casa.

Para Íris era sempre: Dezoito anos é muito cedo para ter um namorado. Enquanto para Bianca, ao contrário, a mãe só pedia que ela só não a abandonasse por um dos muitos rabos de saia que a procuravam.

E não era que a agente fosse mulherenga, não era nem perto disso, porém, com sua profissão e horários atribulados sequer poderia pensar em um compromisso mais fixo. E sabia qual seria a conclusão se pudesse.

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