Não me obrigue a te amar. E isso é uma ordem!

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— A senhorita quer que eu prepare seu banho? — Sebastian perguntou, pegando meu casaco e fechando a porta da mansão.

— Não precisa. Já pedi para Marye fazer isso... — respondi, apressando-me para subir as escadas. — Não precisarei mais de você hoje, está liberado.

Subi as escadas e fui direto para meu quarto. Sentei-me em minha cama e comecei a me despir, assim que tirei minhas luvas pude ver pequenas manchas em torno de meus pulsos. Não pude evitar de me lembrar do momento, um tanto quanto estranho, no qual os lábios de Sebastian tocaram os meus... A sensação maravilhosa... Toda aquela ternura...
Distraídamente toquei meus lábios, era normal estarem tão dormentes mesmo depois de tanto tempo? E o calor que sentia ao relembrar do ocorrido? Essas sensações eram porque Sebastian não era humano ou...
Levantei-me e sacudi a cabeça espantando todas essas memórias para longe. Terminei de tirar a minha roupa e fui para o banheiro, logo afundando todo o meu corpo na água quente da banheira.

Me forcei a mudar o rumo dos meus pensamentos e eles me levaram ao Ciel, nome que, diga-se de passagem, fazia jus aos seus olhos. Foi errado ter me permitido estar em seus braços de forma tão sentimental, assim como Sebastian notou algum outro nobre também poderia tê-lo feito... ou pior, Kyro poderia ter notado.
Apesar do noivado, nos relacionávamos como amigos, ou melhor, sócios. A honra de sua familia estava acima do que sentia por mim, e não seria dificil me descartar por um bem maior como esse. Eu o entendia, tal sentimento era mútuo.
Continuei ali por um bom tempo, os olhos fechados e a mente preocupada unicamente em se manter vazia, até que senti minhas mãos começarem a enrugar. Levantei-me e peguei meu roupão, enrolando-me nele. Estava prestes a abrir a porta do banheiro quando Sebastian o fez, sorrindo ao ver meu rosto corar bruscamente.
Automaticamente eu abaixei a cabeça, tentando me controlar enquanto apertava o roupão até o pescoço, privando Sebastian de qualquer "vista privilegiada" que pudesse ter.

— É o conde Tokudaiji. Ele acabou de chegar carregado por dois de seus empregados. Está muito ferido. — ele começou, logo dando um passo para trás para que eu pudesse sair do banheiro e me sentar na cama.

— Tem certeza que é ele? Nós acabamos de sair da mansão... Estava tudo bem até agora há pouco, certo? — perguntei enquanto pegava minha roupa de dormir.

— Pouco depois que saímos ele foi atacado por um grupo de SM. Aparentemente, poucos sobreviveram e alguns ainda estão desaparecidos...

Senti um arrepio percorrer minha espinha. Meu primo, meu noivo e, aparentemente, meu amor de infância estavam naquele baile. Até agora apenas meu noivo tinha chegado... Será que algo tinha acontecido aos outros?!

Como que lendo meus pensamentos Sebastian soltou um longo suspiro e continuou.

— Não se preocupe. Seu primo e a noiva dele estão bem, saíram do baile pouco antes da senhorita, eu os vi. E... Aquele garoto que dançou com my lady também está bem, o vi na mesma carruagem que trouxe o conde. Infelizmente ele só me pareceu um pouco traumatizado...

— Entendo... Amanhã logo pela manhã resolveremos este caso. Por agora só quero descansar um pouco. — resmunguei, ignorando o comentário maldoso de meu mordomo e indo até uma área isolada do quarto, logo começando a me vestir de costas para a "parede" sanfonada que me separava de Sebastian.

— E quanto ao conde?

— Assim que cuidar de seus ferimentos, leve-o para um quarto e dê-lhe algo para beber. Eu irei falar com ele amanhã...

— Amanhã? — Sebastian ergueu uma das sobrancelhas, aparentemente sem entender o que eu quis dizer.

— Ele deve estar cansado, nesse estado não vai conseguir nos dizer o que aconteceu. Deixe-o dormir um pouco.

— Como quiser, my lady...

Assim que ele saiu do quarto, encolhi-me ligeiramente e respirei fundo. Foi difícil agir normalmente perto dele, fingir que o beijo não acontecera e que eu não estava nervosa, nem pirando de tão confusa.
Tão logo me acalmei um pouco, ergui-me e arrastei meus pés até a cama, sentia meu corpo pesado, cansado... Abotoei os últimos botões de minha camisola e me deitei. Fiquei pensando em tudo o que tinha acontecido, resolvi esquecer o beijo e agir normalmente, afinal, tinha coisas mais importantes com o que me preocupar...
Um ataque tão descarado dos SM's por exemplo.
Será que estavam atrás de mim ou tudo foi só uma infeliz coincidência? Eu devia ter ficado mais... Como caçadora eu devia ter descoberto um ataque grande assim antes mesmo de ele cogitar existir... Mas eu estava tão abalada...

Fechei os olhos e tentei dormir, eu não podia voltar atrás mas podia alcançá-los e estar um passo a frente amanhã. Respirei fundo e relaxei, foi quando finalmente notei que inexplicavelmente o cheiro de Sebastian estava impregnado em meus lençóis e, quanto mais eu me mexia, mais o cheiro se espalhava... Ele estava jogando um jogo comigo, essa era a única explicação plausível para o que estava acontecendo.
Os olhares... O beijo... Ele estava só sendo o demônio que era,por fim.

— Sebastian! — gritei, vendo meu mordomo aparecer poucos segundos depois.

— Sim, my lady?

— Não sei o que você planeja com isso, — disse séria, indicando os lençóis — Mas quero que pare agora! E isso é uma ordem ouviu bem?! Você não acha que tenho muito mais coisas com as quais me preocupar?!

— Perdão, my lady... Mas... não compreendo... — ele realmente parecia confuso... Mas eu não estava disposta a cair no jogo dele. Ah não, não dessa vez.

— Você está jogando comigo Sebastian?! Está tentando me enlouquecer, fazendo-me pensar em você a todo instante? Me lembrar do beijo e tudo o mais...? — indaguei, atropelando as palavras.

Sebastian ficou sério por mais alguns segundos e logo em seguida sorriu, se aproximando cada vez mais de mim — que a essa altura do campeonato já estava de pé a poucos metros da minha cama. Eu fui dando pequenos passos para trás, até que pude sentir a cama atrás de mim.
Me desequilibrei e caí deitada na cama, Sebastian debruçou-se sobre mim, aproximando nossos rostos.

— Eu não estou fazendo nada, my lady... Tudo isso é coisa da sua cabeça, seus sentimentos... — ele aproximou os lábios do meu ouvido, sussurrando — Você está pensando demais em mim, digo, em nós.

Eu fiquei em silêncio por alguns segundos, apreciando o hálito quente dele em meu pescoço... o ritmo de nossas respirações quase se sincronizando... Ali estava o calor de novo, cada milimetro do meu corpo sendo consumido por ele em poucos segundos...
Logo eu voltei a mim e o empurrei bruscamente. Por que eu estava ofegante?

— Esqueça o que eu disse. — eu virei para o lado, ainda deitada, dando as costas à ele. — Saia.

— Sim, my lady... Como preferir... — ele disse, enquanto caminhava até a porta.

Eu fechei meus olhos. Só queria dormir logo e esquecer tudo o que tinha acontecido hoje... Antes do quarto escurecer completamente, pude ouvir Sebastian dizer, quase que sussurrando:

— Boa noite, my lady...

Eu apenas me encolhi mais ainda sobre meu lençol e respondi num tom ainda mais baixo:

— Boa noite...Sebastian...

Naquela noite, dormi logo. Porém não sonhei com nada... Apenas com um eterno paraíso negro, onde não havia cor ou som para me orientar.

Começo a desconfiar que algo muito ruim está prestes a acontecer... mas ainda não sei o que, nem por quê...

Tudo o que me resta então é continuar sentada nesse paraíso negro e esperar que alguém venha me buscar. Que ele venha me buscar.

Devorar-te-ei: memórias póstumas de um amorOnde histórias criam vida. Descubra agora