Capítulo 3 - Acordei no sonho

6 3 0
                                    

  Acordei, e lentamente abri os olhos. Eu estava deitada sobre um asfalto, duro, gelado, e a visão do alto era cinza, o céu estava repleto de nuvens escuras. Eu me sentia sem forças, desanimada, como se algo me aprendesse ali, me impedindo de levantar, a respiração pesada e um frio quase insuportável, assim como o ar, onde pairava o cheiro leve de fumaça. Respirei fundo, tossi muito, assustada, pensei que alguém viria me ajudar a se levantar; talvez eu tivesse sofrido algum acidente ou desmaiado, mas ninguém apareceu e eu não tinha a menor idéia de como tinha ido parar naquele lugar estranho e silencioso. Devagar, tentei me colocar de pé, senti muita dor, é me dei conta de que o meu jovem corpo estava ferido, porém, a única  parte que sangrava um pouco era um dos meus pés, descalços; apesar de me sentir muito fraca, consegui me sentar, e fiquei assombrada com o que vi ao meu redor, um furacão parecia ter passado por ali há pouco tempo, enquanto eu dormia. Havia bastante desordem por todos os lados, as moradias estavam destruídas e no lugar dos automóveis havia uma quantidade assustadora de lixos, me dei conta de que eu estava como numa imensa piscina, suja, imunda. Logo tentei me levantar, com as dores latejando; com uma das mãos me apoiei naquele asfalto em ruínas, e com dificuldade me ergui. Olhei para as minhas roupas, pareciam não ter sido lavadas há anos, assim como o meu corpo, que parecia desconhecer o banho.

- Onde estou? -questionei para mim mesma enquanto olhava ao redor.

  Eu não sabia onde eu estava, não houve resposta, silêncio total, como se o mundo inteiro tivesse parado ao meu redor, e estava.

  Com o corpo carregado pelas dores e feridas, comecei a caminhar, fui vendo que haviam mais lixos e mais moradias em ruínas, algumas incendiadas, e no meio daqueles lixos vi muitos ossos, senti fortes odores que me causaram náusea, prendia respiração, e comecei a correr, sem direção certa, sem saber para onde ir.

- Socorro! Alguém me ajude, por favor! -saí gritando pela extensa rua esburacada, e o meu brado ecoou, quebrando o silêncio ao redor.

  De repente, enquanto corria, senti o meu pé bater forte contra um buraco, a dor foi intensa, gritei alto, mas ninguém ouviu, caí de cara no chão. Novamente ali estava, deitada sobre o asfalto, porém, gemendo de dor, é chorando em posição fetal, abraçando os joelhos; pensei em continuar ali, estagnada, enquanto uma mini cachoeira corria pelo meu rosto, mas minha vontade era fugir dali; eu só não sabia para onde. Ainda em lágrimas, me coloquei de pé, desta vez ainda com mais dificuldade, já quase não conseguia caminhar; senti algo gelado cair sobre minha pele, me arrepiei; calma, a chuva começou a cair, mas continuei andando. Devagar, andei por vários lugares, é encontrei mais escombros e ossos, decadentes ruelas sinuosas, e mais odores ruins, além de muita poeira, que me fez tossir muito enquanto a chuva se intensificava. Caminhei e caminhei, até chegar a uma ponte velha de madeira, da qual algumas partes já haviam caído, mas com muito cuidado, consegui atravessá-la, correndo o risco de cair lá em baixo e desaparecer. Após chegar ao outro lado, vi que havia uma colina bem próxima, e segui rumo à ela, então comecei a subi-la, em direção ao cume.
  Foi muito difícil, eu estava exausta, mas consegui chegar ao topo, a chuva cessou, minhas vestes estavam encharcadas, uma breve brisa gelada se passou por mim, senti um frio congelante, naquele momento eu só queria um forte abraço.
  Fui caminhando, até chegar à ponta, olhei para baixo, a altura era assustadora, fiquei tonta, mas mais assustadora foi a imensa catástrofe que vi lá de cima, tudo parecia ter sido destruído, haviam muito mais lixos e ossos do que antes, não haviam árvores, nem flores, nem lagos, a natureza parecia não existir  mais, assim como também os seres humanos e os animais, o que havia restado eram apenas os esqueletos, eu não conseguia enxergar nem um pouco de beleza no meio daquele caos, para min era o dia e o lugar mais sombrio de todos. Chorei, chorei como nunca havia chorado antes, passei as mãos pelos meus cabelos curtos, e levei as ao local onde meu coração pulsava, fechei os olhos, senti as palpitações do meu coração, inquieto; respirei fundo, estava a ponto, estava a ponto de tentar "voar como um pássaro", quando de repente senti alguém tocar o meu ombro carinhosamente; sobressaltada, me virei, e me encontrei de frente a uma senhora, magra, de cabelos grisalhos, e olhos brilhantes.

- Não faça isso. -disse ela. -se vida é muito valiosa. -a abriu um belo sorriso.

- Onde estou? -balbuciei, trêmula.

- No planeta Terra. -respondeu ela.

- Creio que a senhora está enganada. O planeta Terra que eu conheço é lindo, onde posso andar, admirar e cuidar da natureza, da minha família e também dos outros. A cada amanhecer sinto o meu sentimento de esperança renovado, mas neste lugar aqui onde estou agora eu só vejo caos e tristeza, e sinto um forte desejo de "fugir" daqui.

- Esse lugar aqui é o que o planeta Terra se tornou.

- O quê? -perguntei assustada.

- Mas como isso foi acontecer?

- Houve um tempo em que os seres humanos começaram a se tornar muito egoístas, gananciosos, se esqueceram do amor e da paz, deixaram de cuidar da natureza e uns dos outros, e então muitas coisas ruins aconteceram, e foram se intensificando cada vez mais, até chegar nesse estado assombroso. Todos morreram, exceto você.
 
  Eu estava petrificada de espanto após tudo que havia escutado.

- Mas a senhora também sobreviveu. -falei.

- É porque eu sou você, é esse lugaré o futuro inesperado e catastrófico.

  Ela se aproximou mais de mim, colocou as mãos sobre o local onde meu coração palpitava, lento; fechou os olhos, segundos depois se afastou devagar, e as fechou como se houvesse pegado algo invisível dentro dele. Olhou para mim, e as abriu devagar, uma após a outra, e lá dentro, sobre as palmas dela haviam duas sementes brilhantes. Ela disse:

- A semente na mão direita é a semente do amor, e não mão esquerda é a da esperança, pegue e plante-as. -ela ordenou, e eu obedeci sem compreender exatamente.

  Me sentei ali, naquela terra úmida pela chuva que havia caído, comecei a cavar um buraco com as mãos, e plantei as duas juntas no mesmo lugar. De repente um belo e radiante sol apareceu em meio às nuvens cinzas, um pequeno broto surgiu, e em poucos segundos foi se tornando uma árvore, linda, saliente, carregada de belas flores vermelhas brilhantes, foi incrível, tudo ao redor foi se transformando sob a luz daquele brilhante sol, os lixos se tornaram lindas flores e árvores, as moradias voltaram a ser como eram antes, várias pessoas apareceram, sorridentes e felizes. Dos meus olhos correram lágrimas de alegria intensa.

- Siga o amor, acredite na esperança. Cada um de nós é como uma pequena semente, é juntos podemos transformar o mundo num lugar mais belo, onde o amor e esperança prevalecem. Acredite, faça. Abri um enorme sorriso, "uma pequena gota de esperança começava a desaguar em mim", nos abraçamos forte.
  Acordei, era de manhã, a luz fraca a aconchegante do sol adentrava o meu quarto; sonolenta, abri os olhos, e fiquei pensando no sonho que eu tive.

"O mesmo céu que chove é o mesmo céu que faz, sol
Quando a escuridão vier te abraçar, encontre o seu farol..."

- Vitor Kley - Farol

"Jamais desista da vida e nem se auto abandone, mesmo se o mundo desabar sobre você e ninguém o compreender. Escreva nos mais difíceis momentos de sua vida, os mais belos textos de sua história".

- Augusto Cury

Contos FiccionaisWhere stories live. Discover now