O poder do rei mago

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Silas insistiu na tola tentativa de remover as rochas que impediam a continuidade de sua caçada. Vencido pelo avançar do tempo, acabou por admitir que aquela seria uma tarefa melhor desempenhada por escravos munidos das ferramentas apropriadas. Grunhindo palavrões, deu meia volta, ordenando aos seus soldados que fizessem o mesmo. Retornaram sobre o próprio rastro, levando nas costas o pesado fardo do fracasso.

Após ser anunciado, o general PETRUCIANO entrou na sala do trono, um ambiente que exalava pura luxúria. O doce perfume das dançarinas seminuas inebriaria até o mais casto dos homens, e mesmo a extrema disciplina do general, tão característica de sua linhagem, não o pouparia da tentação de perscrutar a voluptuosidade daquelas formas opulentas.

Ao fundo da assembleia de silhuetas femininas que se contorciam ao sibilar preguiçoso de uma flauta, jazia sobre um trono ornado de ouro a figura indolente do monarca. O rei mago parecia em estado de torpor, embebido nas vicissitudes de sua mente pervertida. Epaminondas era um velho de longa barba, cujo corpo esguio repousava sob uma longa túnica de seda, a cabeça ostentando orgulhosa uma coroa encrustada de gemas preciosas.

– Silas, disse ele. – Presumo que a insurgente já esteja devidamente agrilhoada.

– Perdão, meu senhor! A herege nos escapou ao tomar os vales abismais.

Epaminondas saltou de seu trono rosnando pragas incompreensíveis. Silas prosseguiu, imperturbável.

– Por muito pouco, não tive seu coração na ponta de minha espada. Uma avalancha selou a passagem através da qual ela escapou.

– ANDRONOS parece ter um interesse especial por essa amazona, disse o rei mago, andando impaciente de um lado a outro. Silas compreendia o motivo da preocupação. Tana ganhava fama, e seu exemplo poderia inspirar outras escolhidas a também se insurgirem.

– A esta altura, ela já pode estar em qualquer lugar, e levará dias para atravessar uma rota alternativa ou desobstruir a passagem, considerou o general PETRUCIANO. Epaminondas gargalhou como uma hiena, seus ombros sacudidos por uma onda de escárnio.

– Sim, meu caríssimo general. Para um homem comum isso pode ser um problema intransponível, mas, para mim, o representante do maior de todos os deuses entre os homens, tal tarefa nada mais é que uma brincadeira infantil. Agora, observe:

O rei mago fez um gesto para uma de suas dançarinas. A provocante varoa passou a se mover, a princípio, com a languidez de uma serpente. O flautista, conservado de pé sobre o estrado real, soprava uma melodia proibida, repassada aos primeiros magos na infância da humanidade. Logo o ritmo da música tornou-se febril, fazendo com que a moça rebolasse sensualmente.

Epaminondas recitou palavras há muito esquecidas, e o salão foi pouco a pouco tomado por uma névoa fantasmagórica. A dançarina, agora em transe, jogou-se ao chão com um grito agudo, arrancando do corpo suas diminutas peças de roupa. Fazia isso com uma urgência voraz, como se um calor arrebatador a consumisse. Em seguida, começou a gemer, e para Silas, não havia a menor dúvida de que algum ser invisível a possuía.

A fumaça foi ficando mais densa, à medida que os gemidos se convertiam em gritos de dor. O flautista soprava com mais força, suor escorrendo por sua testa. O rei mago continuava a murmurar e gesticular, até que um último grito emergiu da garganta da mulher, que assumiu imediatamente uma palidez cadavérica. Nesse momento, um rosto humanoide, projetando da testa um grande chifre, surgiu no centro da sala, delineado pela estranha fumaça.

O esboço gasoso rosnou algo para o rei mago. O som era como o retumbar de um trovão, como o timbre ameaçador de uma fera titânica. O restante das mulheres agora entoava um coro de gemidos, retorcendo-se no chão, como entregues a um transe coletivo. O mago passou a falar, mas sua comunicação com a entidade se dava em uma língua desconhecida para Silas, o único observador que parecia conservar algum traço de sobriedade.

A imagem de Tana brotou com extrema nitidez da névoa que tomava todo o salão. Estava caçando, espada em punho em meio às sombras da floresta. Os contornos da paisagem, apesar da noite que caía densa, eram claros como o lampejo de um relâmpago. Silas identificou, sem qualquer dificuldade, o lugar onde a amazona se encontrava. A bruma refez seus traços, reorganizando-se de maneira a mostrar os vales abismais.

Silas reconheceu a estreita depressão por onde sua presa havia escapado. As rochas estavam lá, impedindo a passagem de seus soldados. A imagem de ANDRONOS rosnou uma ordem e, subitamente, o amontoado de pedras voou com uma estrondosa explosão. Depois que a poeira baixou, a passagem estava liberada, para satisfação de Epaminondas, que gargalhou triunfante.


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