O Altar

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O templo real de ANDRONOS era a mais ostentosa obra PETRUCIANA, uma luxuosa câmara cerimonial encravada bem no centro da cidade-estado. Suas laterais exibiam grandiosos portões talhados em madeira nobre, adornados com ouro, de maneira que mesmo as pessoas do lado de fora pudessem assistir aos rituais. Ao seu redor, havia uma vasta praça, repleta de monólitos e símbolos ANDRONISTAS, com capacidade para reunir grandes multidões.

O interior do templo era totalmente recoberto por uma rica tapeçaria, bordada a fios dourados, que reproduziam uma infinidade de mosaicos com significados místicos. O piso era feito com a mais lustrosa porcelana, e o teto com cristais de variados matizes. O altar amplo, contornado por pedras preciosas, erguia-se sobre os espectadores, opressor. Atrás dele, ANDRONOS, o deus PETRUCIANO, era representado por uma estátua de ouro com o tamanho de um homem.

Ariadne deveria ser sacrificada em um templo menor, um dos muitos construídos nas terras de cada um dos clãs, porém, a profanação da menina, ao fugir com Tana, motivou Epaminondas a fazer questão de sacrificá-la entre as paredes da luxuosa matriz, como exemplo aos desobedientes. Assim, toda a PETRÚCIA assistiria ao pavoroso ritual.

Tanto a praça quanto o auditório estavam lotados. Ao entrar no templo, coberta por uma bata cerimonial, Ariadne ouvia um coro de orações sussurradas, suplicando a ANDRONOS que a recebesse como oferenda em troca de bênçãos divinas. Ela subiu em um amplo estrado, onde dois acólitos a despiram. Em seguida, repousou seu corpo virginal sobre o mármore frio de seu leito de morte. O sacerdote se aproximou, proclamando solenemente o início dos trabalhos. Era o próprio Epaminondas, grão mestre e sumo sacerdote da teocracia PETRUCIANA.

Os pais da garota estavam na parte da frente do auditório. Contemplavam a cena com uma estranha mistura de devoção e medo. Epaminondas começou a recitar suas evocações. O salão foi obscurecido por uma névoa surgida de lugar nenhum. À medida que o rei mago falava, algo de bizarro acontecia com a estátua dourada de ANDRONOS.

A imagem esculpida pelos mais talentosos ourives PETRUCIANOS passou a ganhar vida, e onde antes havia apenas a inflexão do ouro, agora vislumbrava-se a mobilidade da carne.

Assim que o monólito despertou, a divindade anunciou sua chegada com um rosnado aterrador. Os fiéis prostraram-se trêmulos, e um silêncio sufocante se impôs. ANDRONOS desceu do patamar onde antes jazia imóvel, e se dirigiu até a Ariadne. A moça estava dominada por uma espécie de transe, e não esboçou qualquer resistência à aproximação de seu carrasco.

Os olhos vazios de ANDRONOS, sedentos por prazer carnal, exploraram a nudez da virgem. Seu corpo gigantesco repousou sobre o dela, violando com ânsia bestial sua castidade. Ariadne ficou em silêncio durante todo o processo, até que, por fim, explodiu em um grito de morte, seguido pelo grunhido repugnante do monstro.

Após a cerimônia, o corpo da garota foi depositado em um esquife de prata, levado por um silencioso cortejo até sua casa. Uma fria neblina pairava no ar. Sua família, assim como a família de qualquer escolhida, resignava-se com a vã ilusão de que aquilo era necessário para um bem maior, um bem tão inquestionável quanto irracional.

A multidão foi se dispersando, até que não restou mais que alguns poucos familiares. Cantavam canções tristes de despedida, observados por um punhado de guardas que ostentavam o brasão real.

Atraídos pelo som de um galope manso, todos os presentes sessaram as cantigas e murmúrios. Era Tana, chegando melancólica sobre seu cavalo. Aproximava-se vagarosa, o rosto rígido e frio como uma lápide.

– É a rebelde, sussurrou um soldado a um de seus companheiros.

– Ouviu falar sobre o que ela fez com o general? – retrucou o outro. – Fiquemos quietos e preservemos nossas cabeças, – concluiu um terceiro.

Sem descer do cavalo, a amazona parou ao lado do corpo. Fitou a jovem com olhos imperscrutáveis, atrás dos quais agitavam-se miríades de pensamentos. Os pais de Ariadne estavam junto ao caixão. Sua mãe chorava cabisbaixa, enquanto seu pai erguia a cabeça para encontrar o olhar duro de Tana. Encararam-se em silêncio por um momento, então os olhos do velho encheram-se de lágrimas.

Tana rugiu, fazendo seu cavalo empinar sobre as patas e dar meia volta. Sua figura fabulosa ganhou as ruas, desaparecendo em meio à bruma como um delírio febril, uma miragem. Deixara para trás o incessante burburinho em torno de suas proezas, narradas por bêbados e poetas na penumbra dos becos e tavernas, onde se cantava: – Salve a guerreira leonina, salve a poderosa Tana.

O Rugido da Leoa Where stories live. Discover now