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Os olhos da jovem bailarina já não conseguem mais conter as lágrimas e elas escorrem pelo rosto. Nas mãos, está a última carta que mandou para o namorado, a visão turva causada pelo choro já dificulta a visualização do carimbo informando que não encontraram o destinatário. Entre soluços, Lunna tenta não pensar no pior, o que é muito difícil.

Não, o Jota não morreu, ele deve ter mudado de área, só isso. Ele está bem. Ok, mas como vou fazer para me convencer?

Ao ver a filha em prantos num canto do chão, a mãe senta-se com ela para abracá-la a fim de tentar confortá-la, pois já sabe de tudo o que aconteceu e a considera muito jovem para estar sofrendo tanto. Já basta a situação deplorável que estão vivendo: A família agora precisa morar em um abrigo temporário para refugiados, junto com tantas outras famílias brasileiras.

Devido a falta de documentação adequada e o preconceito, todos têm dificuldades para conseguir qualquer tipo de trabalho e muitas vezes, não têm o que comer.

Depois de meses, o pai de Lunna consegue um emprego não registrado em uma empresa de reciclagem, porém, as condições de trabalho são precárias e o salário é pouco. Mesmo assim, sua esposa consegue investir em fazer comida para fora, improvisando um fogão portátil no abrigo mesmo. Lunna, por sua vez, a ajuda no preparo e seu irmão na entrega. Dessa maneira, as coisas melhoraram um pouco.

Certo dia, Lunna está a caminho de um pequeno mercado para comprar alguns temperos para a mãe e passa em frente a um bar, e na porta mesmo, ela para a fim de olhar a a televisão embutida na parede na qual está mostrando como está a situação de sua terra natal. A garota não entende quase nada, mas sabe que é sobre a guerra. Percebe então um homem sentado numa mesa bebendo e tenta perguntar algo utilizando seu "portunhol" arrastado.

— O que está acontecendo? — Aponta para a televisão.

— Es brasileña? — Responde o homem sem animação.

— Sim, sim! — Balança a cabeça rapidamente.

— Dicen que mataron al líder del terrorismo.

— Mesmo? — Ela abre um sorriso enorme. — Quer dizer que tudo acabou?

— Es lo que aparece.

— Muchas gracias por deixar meu dia melhor!

O homem responde com um pequeno sorriso amigável e acena a cabeça.

Ao chegar no abrigo, ela pega a foto de Jota entre suas coisas. Finalmente, agora você vai voltar para casa. Ao meu lado ou não, só quero que você seja feliz. Pensa, e solta uma pequena risada contente, já o imagina dentro de um avião voltando.

Na verdade, ainda há conflitos em seu país, mesmo que em poucas proporções. Mesmo assim, Jota acaba de ser dispensado. Com o peso de 1 ano e meio nas costas, agora o rapaz sente-se mais leve, grato por estar vivo e de dever cumprido. Ele, porém, não pode negar que também sente seu coração partido, pois sabe que terá de lidar com as sequelas da guerra, tais como ter sua cidade devastada e a ausência de Lunna.

Seus pais o recepcionam com abraços e beijos no aeroporto assim que ele chega. Eles demonstram o tempo todo o quanto estão orgulhosos do filho. Agora, Jota irá morar em uma pequena cidade do interior na qual não foi invadida pelos terroristas.

Como Rogério, o pai, é policial militar, consegue alugar uma boa casa para morarem. Ela é pequena e simples, porém, bonita e conservada. Jota terá um quarto só para ele, a primeira coisa que faz, é deitar-se na cama.

Que saudades de uma cama confortável... Pensa enquanto olha em volta. Então percebe que na verdade o quarto todo é confortável e muito bem decorado. Com muito carinho, a mãe organizou o cômodo ornando azul escuro e branco. Logo ele lembra-se de Lunna e o quanto gostaria de vê-la.

Entre sapatilhas e coturnosDonde viven las historias. Descúbrelo ahora