Capítulo 3. Akira

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CAPÍTULO 3

AKIRA

"Sabedoria afiada, ser de extrema delicadeza, sutileza e acolhimento"

Meu dia começa cedo, com muitos planos. Assim que acordo, alimento as galinhas, que já estão agitadas e correndo pela entrada, possivelmente atrás de comida. Depois faço o café, organizo a casa antes que meu pai desça e passo o fim da manhã e começo da tarde na estufa.

Em meio às plantas, ao verde e ao cheiro de terra, eu relaxo completamente, esquecendo do mundo lá fora. Uso frações da minha ligação com a terra para crescer as que preciso para repor a loja, adubo mais outras que necessitam de nutrição e rego tudo com cuidado. Depois de horas presa cavando sob raízes que pegaram fungos, só os deuses sabem como, somente reparo que meu pai colocou a cabeça para dentro quando pulo com o pigarro dele, alertando sua presença.

— Pelos deuses, pai, que furtividade é essa?

— Desculpe, sua mãe me ensinou bem. — sorrindo, mesmo falando sobre minha mãe, o que raramente vem acompanhado de um sorriso. Ele entra por completo e se senta no banquinho baixo próximo ao meu, onde continuo cavando. — Eu vim pedir um favor.

Ergo uma sobrancelha ao encará-lo, esperando.

— Sairei para levar Tara para um curandeiro na pequena aldeia a dois dias daqui. Aquele senhor elfo usuário de Magia Curativa, se lembra? Preciso que cuide do corujal até eu voltar, daqui a dois dias. Não tem nenhuma venda programada, então é só alimentar e dar uma olhada.

Assinto, concordando com o pedido; cuidar dos Corujins não é nenhum sacrifício para mim. Inclusive acordei com vontade de fazer isso hoje, passar mais tempo com eles. Não que nossa mínima conversa de ontem à noite tenha tido alguma influência sobre isso...

— Claro que me lembro dele, um dos melhores curandeiros da região. Não se preocupe, pai. Espero que tia Tara melhore logo, se o chá que indiquei a ela não funcionou deve ser algo mais profundo.

Magia Curativa serve para curar terceiros, como o próprio nome diz, e é uma das poucas que não utiliza um dos quatro elementos primordiais (água, fogo, terra e ar) em sua composição. O uso dos elementos, mesmo através de nós, consiste mais em usar o que já existe. Já a Curativa, pelo contrário, vem do usuário. Eles retiram do próprio sangue pedaços mágicos que moldam sobre outros para remendar, costurar, retirar venenos profundos, criar sangue novo, realizar partos ou curar qualquer machucado físico.

Antes que papai saia, dá um beijo no topo da minha cabeça e pega a bolsa que não o vi deixando no canto da porta, mantendo-a entreaberta. Já me acostumei a ficar alguns dias sozinha, afinal, tem dias que ele acompanha as vistorias nas casas dos clientes pessoalmente. Mas sei que por dentro ele se corrói em me deixar só, mesmo que por dois dias.

— Ah! e coloca um óleo em sua mão. Está começando a ranger de novo — sai, acenando.

Olho para minha mão esquerda, flexionando os dedos de metal e ouvindo o que ele quis dizer: rangidos pequenos nas juntas.

Como não ouvi antes?, me repreendo em pensamento. Suspiro indo até o pequeno armarinho com portas de vidro trabalhado e abro uma das portinholas, puxando o pequeno frasco com óleo de semente de girassol de dentro. Encharco um pedaço de pano limpo, decidindo que já terminei meu trabalho pelo dia. Tranco tudo e vou até o corujal passando o pano nos cinco dedos barulhentos, os flexionando para espalhar bem.

Aproveito o restante do paninho oleoso e passo sobre a orelha, que, mesmo não se mexendo, ainda assim gosto de lustrá-la.

Paro no meio do quintal para observar os relevos de ramos com pequeninas folhas neles, nos diminutos membros, o metal agora brilhando. Perdi todos os dedos da mão e a orelha esquerda quando era pequena e precisei refazê-los por um ano com a ajuda de papai, muita paciência e alimentos ricos em ferro.

Dragões de Cristal - Saga Dragões de Kristallys (DEGUSTAÇÃO)Onde histórias criam vida. Descubra agora