Capítulo 4. Ryuu

213 55 156
                                    

CAPÍTULO 4

RYUU

"Sorrateiro"

Mais uma vez sou acordado no susto, pulando sobre as quatro patas em posição de defesa. Olho para a porta, onde uma senhorita entra com um balde e de cabeça baixa e, por reflexos, ajo rápido puxando a serragem em volta de mim, sobre meu corpo, me encolhendo embaixo de tudo. Ouço a breve conversa da moça com Nanite, que pia pouquíssimas vezes e exclusivamente comandos para que eu fique em silêncio, o que me faz entender que essa mulher não entende as falas da Corujin.

Espero e espero, até que sinto minhas escamas vibrarem de repente. Não ouso me mexer, apenas aguardo.

Saia daí! — algo cai perto de onde estou e escorrego para o alto como um raio, grudado na parede mais escura, pousando rente à tábua no teto para que não me vejam.

— O que houve?

Espio inclinando a cabeça para fora da madeira me estreitando para que meu corpo não seja visível de baixo, e vejo Nanite no chão com a pata apoiada na mão da mulher. Daqui consigo ver apenas o topo de sua cabeça. Os cabelos verde-escuros de ontem eram dela.

A Corujin volta ao alto, dessa vez pousando na mesma madeira que eu, em minha frente. Me contorço ao seu redor para ver o que a outra está fazendo e vejo-a virada exatamente onde eu estava, meu monte agora mais baixo. As costas de Nanite ficam tensas, o rabo ansioso balançando inquieto.

— Nanite... — a voz doce da garota vem em nossa direção, então a semiave estica as asas enormes para esconder meu corpo de uma possível aparição e cutuca as penas em distração, agindo de forma tranquila.

Grudo o corpo na aspereza de onde estou, esticando a cauda e a forçando a ficar parada. Passamos a tarde observando a mulher limpar a serragem antiga e trocá-la pela nova, comigo ainda escondido pelo corpo de Nanite, tenso.

Após terminar sua limpeza, vejo o pontinho verde se posicionar em frente a uma das pilastras do fundo e apoiar suas mãos nela. De longe vejo algo mais claro na sua mão esquerda, mas não consigo identificar o que. Aos poucos, galhos se formam deste pilar, crescendo como em uma das árvores do lado de fora. Pequenas folhas verde-claro brotam aqui e acolá pelo galho firme. Terminada essa, ela pula para outra estrutura. E outra. E mais outra. Assim chegando nas detrás de onde estamos, com Nanite virando a cabeça para acompanhar seus movimentos.

De perto dá para notar que o "algo claro" que não identificava antes são seus dedos. Metal reveste da ponta dos cinco dedos até a junção deles com o corpo da mão. Qual o motivo..., penso ainda olhando.

— Você está me deixando desconfortável, passarinho. — volto a cabeça para trás da Corujin, de onde nem notei a ter tirado para assistir os movimentos da jovem, e espero.

Ela fala algo mais que não entendo bem e sai, com os cabelos voando atrás de si. Ergo o pescoço para olhar Nanite, que relaxa e assente com a cabeça, indicando que está tudo bem por agora.

Ela foi buscar os outros, creio que não voltará tão cedo ao corujal, Dragão.

Os outros entram voando quando a porta é aberta mais uma vez e a voz doce da moça entra desejando uma boa noite. Enfim fechada de novo, a entrada passa a ser vigiada por diversos pares de olhos escuros. Alguns Corujins voltam para os ninhos, outros testam os galhos, brincando de correr um atrás do outro e puxando seus rabos com as patas.

Por que não me avisou que ela viria? — pergunto assim que Nanite e eu voltamos para o chão, perto de onde estava o monte que eu dormia.

Somos sábios, não videntes. Akira vinha todo dia e passava a tarde conosco, antes de ter sua loja. Depois suas visitas foram rareando, até deixar de vir. Não sei o motivo de ter passado aqui justo hoje, mas creio que seu pai, nosso cuidador, esteja fora da cidade.

Dragões de Cristal - Saga Dragões de Kristallys (DEGUSTAÇÃO)Where stories live. Discover now