𝑷𝒓𝒆𝒇𝒂́𝒄𝒊𝒐

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"Eu me lembro quando conheci Matilda.

A memória desse dia ainda é algo tão real em minha mente quanto todas as canções que escrevi para ela nos últimos anos. Ela era tão iluminada e diferente das outras. Trazia consigo uma marca especial de beleza, amabilidade e sensualidade, como se fosse feita especialmente para mim.

Os românticos incuráveis enxergariam nossa história como a nascente para um amor avassalador, daqueles que são capazes de quebrar correntes onde somente os livros clássicos e contos lúdicos salientam. Também existem aqueles — os céticos e que foram deturpados precocemente pelo amor — que enxergarão muito mais do que somente gracejos e promessas profundas. Esses, tão realistas, que mantém seus pés firmes no chão, há de enxergar o que a minha consciência tão adoecida pela paixão lutou anos para compreender: A dor e a doçura de conhecer Matilda, inteira e verdadeiramente.

De fato, essa história está longe de ser considerada um conto de amor qualquer. Eu e ela nunca fomos pessoas qualquer, ainda mais estando juntos. Mas é ardiloso separar esse sentimento tão transcendente de nós quando me lembro dos momentos incontestáveis que vivi ao lado dela.

Essa minha ensandecida aventura teve início num verão inesquecível no interior de Bethel, no estado de New York. Era quase o início da incandescente década de setenta — final do verão de 1969, para ser mais cronológico. Tempos turbulentos para quem vivia em um mundo alucinado por manifestações, muita agitação política e social, ares de esperança para um futuro próximo e um refúgio denominado efervescência cultural.

Eu a conheci em um dos cenários históricos mais marcantes dos Estados Unidos, no festival mais revolucionário do século. Minha carreira como astro do rock ainda estava engatinhando como um bebê sem equilíbrio, nada comparado ao pedestal em ascensão no qual vivo hoje. As imagens daquele dia ainda permanecem intactas em minha memória, resguardadas numa espécie de caleidoscópio constituído com as lembranças daquela época, onde nossas histórias tão controversas foram alinhadas através do destino.

Enquanto as cordas da minha guitarra elétrica rasgavam os altos-falantes do Woodstock, eu escovava meus lábios contra o microfone e a letra de uma das minhas faixas com nome de fruta dançava para fora da minha garganta. A poucos metros em minha frente, resplandecida entre a multidão de milhões, ela festejava e florescia com a minha canção. Quando vi Matilda pela primeira vez em seu estado tão eufórico e fascinante, nunca pensei que ela seria muito mais do que uma garota hippie de cabelos longos acobreados, com miçangas envolta do seu lindo pescoço pálido e que exalava uma liberdade pelo qual parecia estar em busca há tempos.

Mesmo sem saber o seu nome e sequer trocar uma palavra com aqueles lábios virtuosos, eu sabia que ela poderia ser tão emocionante e intensa quanto os crepúsculos mornos da costa oeste da Califórnia. Ela era tão bela quanto qualquer alvorecer e tão misteriosa como qualquer criatura noturna. Um pouco avançada para a sua idade, sim. Mas que carregava um ar juvenil e olhar sonhador capazes de despertar perdição em qualquer homem que cruzasse o seu caminho. De certo ângulo, portava uma fachada dócil e vulnerável e de fato, a maior parte do tempo ela era assim — exceto quando estávamos embolados na cabine traseira do meu Mustang amarelo, ou debaixo dos lençóis da minha cama.

Mas o que Matilda não contava para ninguém e que eu demorei tempos para perceber, é que apesar dela dançar conforme a música e desabafar sobre a dor como se tudo ao seu redor estivesse bem, havia um pedaço dentro de si que estava morto. Assim como qualquer mísera chance dela me deixar amá-la da maneira como ela merecia ser amada".

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With love, B.

𝐌𝐚𝐭𝐢𝐥𝐝𝐚 | 𝐇.𝐒Where stories live. Discover now