Capítulo 1

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Duas cores chamam bastante atenção no chão barrento e alaranjado do sertão. A primeira delas é o verde das folhas e dos cactos que, mesmo com a pouca chuva de algumas épocas, teima contra a natureza do sol e se mantém vivo e chamativo. A segunda é o branco dos pés de algodão, capaz de fazer alguns pensarem que as nuvens inexistentes no céu enraizaram naquela terra seca. Não estamos, entretanto, em um ano de seca. O algodão, já prestes a ser colhido, esconde quase toda a terra do sol.

Brancas também são as casas grandes das fazendas que, em sua opulência e janelas azuis, tanto contrastam com as casinhas da mesma cor barrenta que tingia o chão, nas quais a maioria do povo mora.

Era numa dessas grandes casas de fazenda, de paredes brancas como o algodão e janelas azuis, que morava Manoel Sousa. O comerciante português fez fortuna entre o novo e o velho império, mas nunca tivera lar muito certo entre as duas, sempre estando onde melhor os negócios se fizessem. Tinha como fardo uma menina que se fizera mulher entre longas viagens e livros contábeis, porque não havia lugar para uma filha sozinha nas terras do pau brasil, e nem sua irmã quisera criar aquela pequena dentre os próprios filhos na velha Lusitânia, não dando a Manoel outra escolha que não se habituar em mantê-la consigo.

Contando com mais de setenta anos de idade, talvez não fosse uma boa ideia viver no inóspito clima do sertão cearense, mas os hábitos de toda uma vida não eram fáceis de serem mudados. Manoel gostava do desafio que aquela inospitalidade lhe impunha, bem como não era a primeira vez que ele lá buscava pouso. A primeira fora há muito tempo, e o homem passara mais do que meia dúzia de anos por aquelas terras.

Conheceu alguns aspectos da vida difícil, mas também fez bons negócios com o gado. Casou-se com uma mulher de pele avermelhada, arrendou algumas propriedades e até mesmo estabeleceu ali um administrador, que, há três anos, deixara as graças deste mundo para trás e alcançou a paz divina, trazendo de volta a cabeça calva de Manoel para o Brasil.

Na graça do ano de 1861, não havia melhor comércio para se fazer naquelas bandas do que o algodão, que, plantado em qualquer pedaço de chão que o gado não pudesse esmagar ou ruim o suficiente para que não nascesse a cana-de-açúcar, era mandado às rumas para a Europa. Uma considerável parte do algodão cearense, quando não vinha das fazendas de Manoel Sousa, era por este intermediado antes de chegar ao porto da Fortaleza de Nova Bragança. Nas vésperas da colheita, o maior desafio que se fazia era encontrar as ágeis mãos para tirar dos pés os capulhos em troca de um mínimo de moedas e um bom pouso enquanto houvesse trabalho a ser feito.

Na primeira vez que estivera naquelas terras, Manoel usou-se de escravos, negros e índios, para garantir sua produção. A primeira seca, porém, mostrou ser inviável a manutenção deles. Vendeu os que pôde e libertou aqueles por quem não conseguiu um bom preço, oferecendo um pedaço de terra para que cultivassem víveres. Cobrava como paga parte da produção e lhes pagava algumas moedas quando trabalhavam nos cultivos ou com o gado do próprio Manoel.

O Algodão da Tua Pele [DEGUSTAÇÃO]Onde histórias criam vida. Descubra agora