Lutando contra alvas formas etéreas, esquálidas, quase invisíveis,
Caio simplesmente em mais um dia, como se eu caísse dum abismo;
E na parte absconsa de minhas membranas onde estas são perceptíveis
Reconheço nas suas imagens etéreas, o momento infeliz de meu batismo.
As horas davam passos longos sobre meus pensamentos inquietos,
Dando rodopios em meio às luzes sepulcrais de um novo abismo;
Era como se, entre um multidão de pedaços animais entre um milhão fetos,
Encontrasse o prazer febril de um perturbador neologismo!
Via em frente a minha cova um grande símbolo ying yang,
Sendo talhado pela minha mão gélida, purulenta e esverdeada,
Enquanto a outra secava de meu rosto gordas lágrimas de sangue
Que escorriam para uma poça de lamentos onde minha sepultura foi cavada!
Naquele encontro de morte e vida representado num eternal noctâmbulo
Abrindo com meus dedos mais uma das virulentas pústulas do infeliz
Via-me de repente metamorfoseado em um tuberculoso e num sonâmbulo
Que gastava no escarro a gota de saliva duma língua que muito se maldiz;
Capengando pela noite escura, deixando na estrada as gotas da boca ensanguentada
Perdendo-se na vastidão do mundo, em busca de mais uma estrada,
Dando mais um passo e mais um suspiro fundo...
E, capotando num abismo desconexo,
Na insânia incoercível do não ter nexo...
----Profundo, profundo, sempre mais profundo!
Via na luz ao fundo do abismo, uma legião de coisas obscurecidas:
Era o prélio do inferno, almas em agonia, a tradução perfeita do tormento
Donde o instinto bárbaro de um único demônio famulento
Dava a alma de qualquer pessoa a expressão mais dura e entristecida.
Oh! Aglomerado carbônico de caos eterno! Tens nessa dor colossal
Uma tendência natural ao abismo, em que, resumindo todo inferno, já desafiado ao ceticismo ,
Vivencia um compêndio de pesadelos acordados,
Que obriga a aposta esdrúxula dos dados
Joga-se dados com os mortos para que se tenha
Uma simples premonição. Seguindo canções e clamores tortos, entre seis faces numeradas faz-se a anunciação:
Lançados à sorte os seus últimos dados,
Na esperança de não ser consumido pela própria peçonha,
Cata-os de volta e os
Lança novamente; estes rodopiam mais uma vez, e então, nos derradeiros movimentos,
Escorregam de cima da lápide, precipitam para os excrementos.
E, inclinado e observando,
Nota, na insalubridade enfiado naquele cubículo roto, as mortalhas que cobrem o próprio corpo,
Embalando-se na consciência carbônica
Das esperanças faraônicas ao abismo de vergonha!
Era, enfim, o inferno quem regia uma existência crítica
Permeando minha cabeça com uma consciência fatalística de tudo;
- Oh, alegria traída! Tormento surdo! Maldita língua paralítica!
E em meu cárcere de consciência aterradora,
Pressentia uma sequência de Mortes assustadoras,
- Sentia-me triste, sem vontade de cantar, como uma ave de olhos furados!
Onde a besta que me guardava na tortura duma maldição de preguiças,
Colava-me horrorizado, com o gemido de mil degredados, entre as barras e corrediças;
Queimava-me a pele, tirava o tutano pelo quebradiço dos meus ossos,
Fazendo-me escrever esses versos sobre inúmeros destroços,
Cujo dolor dos gritos vibravam por entre as fibras que revestiam minhas quilhas.
Ensinaram um novo modo de cantar a ave que habitava o meu peito,
Jogaram-me com as asas cortadas, para não fugir das armadilhas;
E de repente, entre o silêncio de todos os pensamentos errôneos
Encontrei novamente abraçada àqueles demônios
Agradecendo a sabe lá quem por não ter estado só naquela estranha ilha.
Como que na vida o homem apenas erra, vi-me encimado por toneladas e toneladas de terra,
A terra arenosa cujo dourado das estradas a alegria em tenra idade fôra palmilhada;
Hoje não resta mais alegria, nem dourado e nem estradas;
- Fui enterrado junto a uma série de grandes medos.
Medos pólipos do Orgulho que a nada vai senão para terra!
Como que na vida, o homem apenas erra
-Minha cova? Quem cavou?
Pois este é neologismo das aves mortas que canta ainda agoram:
Uma série de olhos que apagados ainda choram
Por serem perseguidos por uma série de tristes platonismos!
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Sonata-Poema
PoetryColeção de "músicas" em forma de poema ou de poemas em forma de música.