Capítulo 2

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Lorenzo sentia a fadiga das pernas ao sentar-se à longa mesa com os jovens Escorpiões para jantar, os dias em que estava de vigia na torre eram fisicamente exigentes. Bruno e Júlio, ao seu lado, discutiam sobre quem seria o líder da próxima missão ao passarem o prato com frango assado adiante. Os outros à mesa também estavam envolvidos em conversas animadas paralelas. Lorenzo não prestava muita atenção, o encontro inesperado com os pais no mercado da vila, mais cedo, lhe deixara aéreo.

O modo como acenaram ao longe, com os olhos cheios de orgulho por ele ser um Escorpião, mas também de tristeza por serem agora quase estranhos um ao outro. A vontade contida de correr e abraçá-los ou mesmo voltar a sentar-se à mesa da cozinha e falar sobre a saúde das cabras ou a qualidade do leite o encheu de saudade. Contudo, Escorpiões e Viúvas tornavam-se parte do castelo, e lá estavam suas novas famílias, antigos laços não deviam mais importar.

Desde quando ele e Bruno eram crianças a família acreditava que Bruno seria o primeiro dos Bonetto a abandonar a criação de cabras e honrar a família sendo um Escorpião. Afinal, era o irmão mais velho que apresentava força e habilidade para a luta desde o início, e era incansável em sua obstinação. Estavam preparados para "perder" um dos filhos para o castelo por um bom motivo. Mas não cogitaram que ambos os Bonetto tivessem o mesmo destino. Nem mesmo Lorenzo.

Desejava ser um Escorpião para deixar Bruno orgulhoso, como também por Katrina e, assim, os três pudessem estar juntos como sempre foi. Porém, não tinha convicção de que seria possível. E quando venceu a prova dos 17, há seis meses, ouvia as palmas e gritos animados de Bruno e Katrina como se estivesse em um sonho embaçado. Só mais tarde, deitado na cama em seu novo quarto no castelo, que realmente a percepção dos acontecimentos lhe atingiram.

— Soube da notícia trazida pelos uruguaios, quando voltaram da missão há pouco? — Bruno lhe cutucou as costelas trazendo o irmão mais novo ao presente. Lorenzo acenou em negativa, vira a embarcação vinda do Uruguai, com um grupo de caçadores de uma comunidade amiga, chegar, mas não conversara com os integrantes. Júlio também se inclinou sobre ele para participar da conversa. — Houve alguns sequestros na fronteira, e depois encontraram alguns corpos sem sangue.

— Vampiros? — Lorenzo inquiriu surpreso.

— Meu pai e o comandante Antonello acreditam que sim — Júlio comentou vangloriando-se de ter informações privilegiadas. — Vão solicitar ao rei para averiguarem as notícias.

— E finalmente nós teremos uma missão de verdade. — Bruno sorriu com os olhos brilhando.

Lorenzo sorriu por ver o irmão tão animado. Não lhe importava qual seria a missão, estar com Bruno e garantir que nada lhe aconteceria era seu objetivo principal. Observou Katrina conversar com uma das Viúvas do Harém ao jantar à mesa Real, mais adiante no salão. Várias mesas de Viúvas e Escorpiões os separavam, mesmo assim seriam capazes de se comunicar se seus olhares se encontrassem. Queria compartilhar com ela a alegria por ver Bruno feliz e a sensação angustiante de não saber exatamente como agir ou o que sentir sempre que cruzava com seus pais na vila. Mas ela não o olhou.

— Vi nossos pais hoje — sussurrou para Bruno, era difícil guardar isso apenas para si. Katrina estaria com o irmão à noite, então não teria com quem desabafar.

— Soube que eles estão bem. Têm vendido bastante leite de cabra nessa temporada. — Bruno sorriu tranquilo, sem compreender aquilo não dito pelo irmão.

— Sim, estão — Lorenzo concordou voltando a se concentrar no prato com frango e batatas douradas na manteiga à sua frente.

O irmão sabia que seria um Escorpião desde antes de conseguir falar a palavra corretamente, e, talvez por isso, também se preparara para abandonar emocionalmente aqueles que os geraram e criaram. Mas essa distância ainda era difícil para Lorenzo, ainda mais quando estar no castelo não era exatamente ter uma família calorosa.

— Após o jantar, a sessão de filme terá início no pátio do castelo! — um dos serviçais comunicou a todos em voz alta.

— Espero que seja um filme de ação — Júlio falou ao enfiar o último pedaço de frango na boca e levantar-se.

— Vamos, Lo. — Bruno o puxou pela camisa com pressa. — Quero pegar um bom lugar.

Lorenzo se deixou ser levado para fora do castelo, no amplo gramado um telão fora estendido em um pedestal. Muitas crianças estavam sentadas bem próximas, alguns adultos trouxeram cadeiras de armar e se posicionavam um pouco mais afastados. Bruno os levou para junto dos outros Escorpiões, que haviam puxado umas toras para usarem como bancos não tão longe do telão.

Algumas serviçais juntamente com Elisa preencheram os lugares vazios à frente deles ao sentarem-se na grama. Júlio se inclinou e cochichou algo no ouvido da irmã, que riu ao escorar as costas nas pernas dele. Ela virou para trás e acenou para Lorenzo ainda com um sorriso, mas se tornou séria ao cumprimentar Bruno de modo seco. O irmão mais velho fingiu não se importar, e Lorenzo empurrou o ombro dele com o seu, implicante. Elisa fora a única garota que nunca caiu na lábia de Bruno.

Essas pequenas implicâncias e brincadeiras trazidas dos anos anteriores, quando suas únicas preocupações eram estudar, treinar e ajudar os pais com as cabras, o fazia pensar que nem tudo havia mudado. Ainda havia espaço para serem um pouco como antes, espontâneos.

As sessões de filmes mensais era o acontecimento mais esperado pelas crianças e por alguns adultos. E não era diferente para eles, mesmo que fossem agora fossem treinados para serem assassinos em potencial. Os jovens Escorpiões mantinham os olhos fixos na tela, Lorenzo também relaxou. Lamentava não ter Katrina ao seu lado para rirem das cenas duvidosas normalmente presente nos filmes de ação dos anos 90, o qual fora o escolhido de hoje.

A liga dos Escorpiões I - Conde VampiroOnde histórias criam vida. Descubra agora