05 - Desespero e calmaria

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- Eu sabia! Eu SABIA que não devíamos confiar em você! Faz alguma coisa, o meu irmão já tá azul!

- Droga, droga, eu NÃO SEI o que fazer!

Newcomen, o navio de Toni, atravessara a passagem entre as dimensões a toda a velocidade, e assim continuava pelo céu, sem um condutor e sem rumo. As pessoas a bordo estavam desesperadas demais para se preocupar com a direção que a embarcação tomava. O início de noite parecia predizer o destino de Perna de Magia com seu céu agourento totalmente negro, sem lua ou estrelas. Ren gritava a plenos pulmões com Irene, que, angustiada, estava ajoelhada ao lado de Toni, tentando alguns feitiços, porém sem sucesso. Os olhos dele começavam a desfocar, e o corpo padecia de dor, mas escutava as duas perfeitamente. Caso não estivessem tão nervosas, as mulheres notariam que ele sufocava como um peixe fora da água.

- Não adianta, não adianta! Não dá pra desfazer o feitiço daquela velha bruxa dos infernos se eu não souber as posições de mão corretas!

Quando Irene acabara de terminar a frase, Toni a agarrou firmemente pelo ombro e sacudiu um pouco, fazendo com que prestasse total atenção nele. Fez então dois símbolos com a mão esquerda. Ela piscou, como se não entendesse. O rapaz repetiu os dois movimentos, com mais urgência. Em um movimento, os dedos afastados, como se estivesse segurando um copo, mas com a mão na vertical. Em outro, os dedos unidos numa ação parecida com pegar água de um riacho, com a mão em concha. Os olhos de Irene se arregalaram quando tomou consciência.

- Certo, Perna de Magia, e quais eram as outras posições de mão? As que ela fez atrás das costas?

Praticamente gritou na cara dele, a saliva voando. Ele a encarou com puro desespero no olhar. Não sabia.

- Irene, os outros dois movimentos eram assim!

Ren se ajoelhou do outro lado do irmão, de frente para a mulher de cabelos castanhos. Também com a mão esquerda, demonstrou o primeiro movimento: Um golpe seco no ar, como se cortasse algo, com os dedos indicador e médios juntos, porém separados do anelar e mindinho, formando uma espécie de V. O segundo, a mão se fechando, num golpe para baixo.

Num átimo, Irene concentrou todo o seu poder e refez os símbolos a ela mostrados. Findos os movimentos, espalmou ambas as mãos no peito de Toni. Uma luz se desprendeu dos dedos, penetrando o corpo combalido. Quase que instantaneamente, o jovem conseguiu preencher os pulmões com o tão necessário ar, fazendo um chiado enorme. Ren sorriu como uma criança, com lágrimas de alívio escorrendo pelo rosto. Quase o abraçou por impulso, mas ele precisava de espaço para respirar. Irene se jogou de bruços ao lado de Toni, com a cabeça virada para ele, aliviada como nunca se sentiu na vida. Ninguém notou que a perna mágica continuava sumida.

Alguns minutos se passaram em total silêncio, a respiração descompassada do trio se acalmando. A escuridão da noite os envolvia, apenas uma luz fraca vinda do interior da cabine da nau os iluminava. O sentimento de alívio envolvia os três, unindo-os numa comunhão estranha.

Quando a situação se tornou esquisita demais, Toni tentou se levantar. A irmã ajudou, amparando-o com um braço nas costas. Ele se sentou e observou a mulher que acabara de salvá-lo, a qual também se erguera e ajeitara-se com as pernas cruzadas.

- Pode me explicar O QUE FOI AQUILO?

- Longa história, Perna de Magia. Tão longa que dá preguiça.

- Você quase me matou, Irene!

- Er... Tecnicamente, foi você quem pulou na minha frente, lembra? Muito obrigada, aliás. Mas não entendo. Por que fez aquilo?

- Porque é um idiota, inconsequente! Eu também quero saber que porra foi aquela, Antonio!

- Você só me chama de Antonio quando fica brava comigo. Me desculpa, Ren, eu sei que deixei você preocupada... Eu não pensei em nada na hora, só agi.

Perna de MagiaWhere stories live. Discover now