Capítulo 03

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03/01/2020

Era aniversário de Melina, sua amada filha. Catarina não acreditava que ainda estava ali dentro.

Sabia que os advogados tentavam todos os meios possíveis para ela responder em liberdade, só cumprir uma sentença depois que ela fosse dada. Porém, parecia que nada adiantava, nenhum juiz dava o privilégio da dúvida para ela.

Quase dois naquele lugar. Por agora, sua rotina era isso mesmo, rotina. Acordava no horário, arrumava sua cama — depois de tanto tempo, ela tinha uma só pra ela —, tomava o café da prisão — que não tinha nada de nutritivo, nada que sustentasse.

Com o tempo lá dentro, ela começou a ajudar na cozinha, e então ia lavar a louça. No horário do banho, era quando aproveitava para chorar. Não lembrava quando o choro foi diminuindo, mas lembrava que o banho sempre era o lugar mais fácil, onde ninguém a olhava feio por estar chorando a tanto tempo.

Depois de dois meses, as pessoas se acostumaram com o sofrimento de Catarina, depois de mais algum tempo, ela se acostumou.

Não que não sentisse falta das mesmas coisas de sempre, ela apenas se conformou com sua situação. A culpa, obviamente, era de Augusto, quem mandou ele morrer?

Em dois meses, faria dois anos que tudo aconteceu, as lembranças ainda eram nubladas para Catarina. Ela só conseguia lembrar da mensagem que recebeu de seu chefe, de estar no apartamento dele, o corpo estirado no chão e a arma do crime em sua mão. Até sua prisão era algo enevoado em sua mente, não se lembrava de muita coisa, apenas do olhar dos policiais e da voz de um deles dizendo que ela estava sendo presa por assassinato.

Provavelmente foi o choque do momento, por isso ela apagou da mente tudo aquilo. A verdade é que não havia nada que ela pudesse fazer para mudar aqueles dois anos. Só podia pensar nas atuais defesas, só podia pensar na sua família, nos seus filhos sendo criados pela avó, só podia pensar que Arthur estava mais ocupado do que quando tinha que cuidar dos filhos — eles se mudaram para a casa de Sueli em julho de 2018 —, para não ir mais até a penitenciária ver a mulher, e as cartas estarem cada vez menores e com mais demora para chegar.

Pelo menos, naquele Natal ela tinha recebido um presente.

Sua filha tinha escrito uma carta, que era mais um bilhete...

"Mamãe, sinto sua falta, volta logo para a casa"

Eram nove palavras, que, muito provavelmente, Melina não escrevera sozinha. Mesmo assim, foi um dos melhores presentes que Catarina poderia receber. Sua menina lembrava da mãe. Sentia falta da mãe, mesmo tão pequena.

Catarina sabia que Gustavo não tinha memória com a mãe, agora, com quase três anos, não lembrava da pessoa por quem ele chorava dois anos antes. Sabia que sua mãe — que reservava um final de semana por mês para visitá-la — contava para Gustavo sobre Catarina, falava o quanto ele era amado pela mãe. Mas o menino não tinha a imagem da mãe.

Já Melina se lembrava da mãe, inclusive, tinha escrito que sentia sua falta. E, justo naquele dia, a filha estava completando cinco anos.

Catarina, apesar de estar ambientada com o lugar, com a rotina e diminuído bem as lamentações, naquele dia era impossível. Sua filha estava completando cinco anos, já sabia o alfabeto, tinha aprendido a andar de bicicleta sem rodinha, não estudava mais no colégio de antes, junto com a mudança para a casa da avó, mudaram também da creche particular para a escola da rede pública, mesmo assim, a menina ainda brilhava. Brilhava, e muito, mas longe do alcance da mãe. A menina que só era um bebê quando a mãe foi presa, agora já estava se tornando uma criança. Com toda a certeza, já começava a ver graça nas coisas, já tinha algumas opiniões formadas... E os maiores medos de Catarina se concretizavam. Os filhos crescerem sem a mãe, ela não os ver crescendo. Estarem "sozinhos". Não que estivessem, mas não tinham a mãe.

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