[ X X I ]

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Kieran demorou um bom tempo entre os saltos que dava para sair do alcance de uma lâmina muito hábil, dentro do espaço limitado do quarto, até entender exatamente o que estava acontecendo ali. E mais uma vez, tinha se deparado com o santo conselheiro, assassino com sede de sangue. Então era ali que ele estava aquele tempo todo?

― Mas isso de novo?! Você não cansa não, ô!

Um passo de Kieran para o lado e o tecido sobre o dossel da cama foi partido ao meio. Mais outro salto, e o criado-mudo foi o alvo. Kieran sentiu a ardência da ponta da espada cortando sua pele na altura do peito, outro movimento perigosamente próximo do pescoço, e num movimento rápido e pouco calculado, ele se colocou atrás da poltrona em que Avestan estava sentado, o que só incentivou o conselheiro a lançar a própria espada em sua direção como se fosse só uma pequena adaga, e ao desviar do golpe violento ― parcialmente assustado que o homem tinha mesmo lançado uma espada daquele tamanho em sua direção ―, a espada atingiu o biombo que que separava a banheira logo além deles.

― Não vai uma ajudinha aqui com essa sua magia não, Idris?! ― Kieran apelou para o rei, e de novo, a pronúncia do nome do regente parecia colocar sangue nos olhos do ladrão. ― Ele vai me matar de verdade!

― Minha magia não funciona nele. ― Avestan continuou tirando as tranças e Kieran foi obrigado a correr na direção da porta quando Radulf puxou duas adagas da cintura para avançar de novo em sua direção, não importava que estivesse usando o próprio rei como escudo. Mas a informação sobre a magia não funcionar em Radulf foi muito nova e surpreendente para o ladrão, era por isso que ele era um "santo"?

― Como assim não?!

Kieran saltou para longe do rei e Radulf, por pouco, não usou a própria poltrona de Avestan para pular por cima do homem e alcançar Kieran mais rápido. A mesinha de centro entre as poltronas que foi o alvo da fúria dele e se despedaçou sob o peso do impulso do conselheiro.

― Você vai mesmo deixar que ele me mate?! ― Kieran ainda questionou para um Avestan que tinha terminado de soltar o cabelo, levantando-se da poltrona.

― Você não veio aqui para morrer?

― Mas pela sua mão, não a del—

Ele nem teve tempo de completar a sentença, precisou se desviar de outro ataque que fez com que Radulf fincasse uma das adagas na parede, e passou tão perto que lhe causou um corte na altura do ombro. Kieran já estava a ponto de pedir ajuda do regente mais uma vez, e ao se abaixar para fugir de Radulf e observar Avestan agora de pé, uma coisa inédita o distraiu: era um sorriso discreto que estava vendo no canto dos lábios do regente?

― Isso não tem graça, Idris! ― ele reclamou com Avestan, e precisou agir rápido para tentar se livrar de Radulf, que sempre parecia com mais sede de sangue ao som do nome do rei.

A fuga de Kieran não foi tão eficaz daquela vez, quando ele correu para o lado, escapando por baixo dos braços de Radulf, sentiu o impacto forte nos pés ao ser atingido por uma rasteira que veio combinada com o movimento do conselheiro em descer uma das mãos contra o seu rosto, apontando a segunda adaga bem nos seus olhos. Naquele momento, Kieran realmente sentiu a vida passar diante dos olhos com o brilho prateado da lâmina de Radulf bem próximo de seu rosto. O desequilíbrio causado pela rasteira lhe fez cair no chão, e uma mão ele levou às costas para tentar aparar a queda, enquanto erguia o outro braço acima da cabeça para impedir que a lâmina lhe atingisse em cheio no rosto. Um ferimento grave no braço ainda era melhor do que uma morte dolorosa com uma adaga enfiada no olho. Mas a sensação da lâmina contra o seu braço não veio, nem a morte rápida caso a lâmina tivesse lhe atingido o rosto, e só então ele percebeu que tinha fechado os olhos com força para esperar o desfecho doloroso.

O Ladrão dos 13 Corações [Parte I] [Concluída]Onde histórias criam vida. Descubra agora