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|| Ronam Carvalho ||

📍Rio de Janeiro, Bangú, Sábado, 17:00.

O coração que bate no seu peito é igual ao meu. O sangue que corre em minhas veias é vermelho como o seu. Então o que te faz pensar que a cor da sua pele te faz ser melhor que eu?

A frase se repete na minha mente inúmeras vezes enquanto eu puxo a fumaça do cigarro com calma, precisando o sabor mentolado nela e suspirando em seguida enquanto solto a mesma no ar.

Desde ontem não me sai da mente o porque do Augusto ter que dar corretivo em alguém, desgraçado ainda não me ligou pra explicar, e eu tô por um tris de fugir pra descobrir, eu hein, não se deixa um curioso sem informação.

Fora que essa história tá muito estranha, do nada uma confusão no morro. Chega uma notificação no meu celular descartável que veio essa semana. Rolou um upgrade no negócio , agora até WhatsApp o pai tem. O mesmo vibra embaixo do travesseiro fino, pego disfarçadamente olhando do que se trata, e arqueio as sobrancelhas quando percebo que o Augusto me enviou um vídeo.

Abro e começo a assistir com o fone de ouvido pra que os outros não ouçam, vejo uma morena baixinha, do corpo esculpido por Deus carregar a vagabunda da Manuela pro pátio da escolinha e subir em cima da loira começando a deferir vários golpes na outra que apesar de ser o dobro do seu tamanho, apanha desesperada por socorro.

Escuto tudo que ela diz e sinto meu estômago embrulhar em saber que a desgraçada pôde ser tão baixa de ofender uma criança tão linda e inocente apenas pelo seu tom de pele.

Escuto um resmungo do Augusto xingando a maluca e em seguida ele entrega o celular pra alguém, indo fazer com que a briga termine. Vejo uma pequena mãozinha na frente da câmera, e em seguida vira a mesma pro seu rosto, me fazendo perder os sentidos, a voz e até mesmo esquecer como respira.

Encaro a pretinha encantadora que dá risada envergonhada quando um dos vapores diz pra ela que a maluca não tinha razão em nada, e que ela é linda do jeitinho que ela é. E entendo ali que a briga rolou toda por causa dessa princesa.

É a menina mais fofa que eu já tive o prazer de por meus olhos, tão delicada, tão meiga, ela vira novamente a câmera, mostrando a mãe dela arrumando os cachos soltos e grandes entre as mãos, e em seguida secando as lágrimas do seu rosto.

Pareço hipnotizado olhando essa mulher, ela é tão pequena, tão detalhadamente desenhada, cheia de curvas, a pele dela brilha de um jeito diferente refletindo o sol, e quando ela encara a tela do celular, minhas mãos começam a tremer. Um sorriso brota em seu rosto quando se aproxima da filha, e eu juro que meu coração parou até de bater por um segundo.

Eu tinha prometido quando cai nunca mais pensar em ter algo sério, mas consigo facilmente imaginar um futuro inteiro ao lado dessa deusa que parece ter roubado meu fôlego. Nunca fui emocionado, a desgraça que me jogou aqui demorou seis meses só pra conseguir me fazer querer algo, mas essa mulher, em meio segundo já me fez imaginar como seria envelhecer ao seu lado.

Respiro fundo tentando recuperar meus sentidos e nem percebo que o vídeo já terminou. Meus dois neurônios começam a trabalhar pra entender toda informação que acabaram de receber, primeiro o fato de ter tido um caso de racismo no meu morro. Me fazendo prometer pra mim mesmo resolver essa pendência pessoalmente quando sair daqui.

Segundo, o fato de eu ter me encantado por uma criança que nem sequer conheço pessoalmente, e olha que eu nunca gostei de pirralho nenhum, inclusive, sempre fui o "tio" chato que não chega perto dos catarrentos.

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