A CALMARIA ANTES DA TORMENTA

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Em algum lugar no céu, fevereiro de 2015

"— Melhor você voltar para a cabine e preparar as coisas, vamos ter uma tempestade. — disse o capitão para Olívia sentada atrás dele. Ela vê através do painel de controle via um céu azul e limpo. Para poder ver o cenário que sobrevoavam, se levantou. Buscou algum indício que comprovasse o que o piloto dizia. Nada. Apenas o uma larga extensão de terra. "— Por que o senhor diz isso? Me parece que as condições são bastante boas!", "— Aí é que está, minha jovem! Condição climática muito calma é razão para se preparar. Porque pode estar se aproximando uma tempestade bastante forte". Olívia, sem entender, inclinou a cabeça, e ele explicou "— Para se propagar, as tormentas precisam de ar quente e húmido. Esse tipo de ar é puxado dos arredores e viaja através dela para alimentá-la, sendo levado até o topo por uma corrente ascendente e enviado para as nuvens de trovoada. A região de onde se tirou o ar húmido fica envolvida pelo ar seco e quente, que é mais estável e por isso muitas vezes há um sentimento de calma antes de uma tempestade chegar".


Bairro de Sant Gervasi, outubro 2020

— Bom dia, para vocês dois! — cumprimentou Cecília sonolenta ao sair do quarto em seu pijama de algodão do Mickey.

Olívia e Gerard, ainda usando a roupa do dia anterior, colocavam a mesa para o café da manhã.

— Uhnnn... que cara boa! Café da manhã brasileirinho: mamão papaia e até queijo minas! Vou ter que invadir o desayuno romântico do casal! Oli, coloca um café na máquina de expresso para mim também porfa! — pediu antes de entrar no banho.

— Também temos pão com tomate! — disse Gerard que voltava para a sala com a cesta de pães. — E com o melhor pão da aldeia, ou melhor dizendo, pan de payes: o da padaria Turris!
— Um café da manhã de dupla nacionalidade, então! — Olívia apareceu atrás dele rindo segurando a bandeja com os cafés.
— É assim um mamão? — Gerard olhou com curiosidade para a travessa de porcelana branca sobre a mesa de vidro.
— Sim. Nunca comeu?
— Claro que já comi. Minha mãe deixa as frutas descascadas e picadas no meu freezer. Eu só tenho que colocar no liquidificador! Nunca tinha visto como era a forma do mamão antes. — Suas bochechas coraram e ele sorriu, tímido.

Olívia e Cecília acharam graça.

— Ai que bebê da mamãe eu arranjei, meu Deus! — brincou, Olívia.

Ela se aproximou dele por detrás e o envolveu com os braços.

Gerard se encolheu com as cócegas que fez o deslizar do nariz dela por seu pescoço. Olívia riu, divertida. Mesa posta, esperaram por Cecília para tomar café.

A mesa, comprada em um aplicativo de coisas usadas, era uma das poucas coisas que havia no apartamento delas. Cada cômodo tinha apenas o essencial. Cozinha, fogão e geladeira, quartos, cama e guarda-roupa. No de Cecília nem guarda-roupa tinha.

Com o primeiro salário previsto para o mês seguinte, Olívia comprou no cartão de crédito um moderno sofá vermelho bordeaux que estava para chegar. Mas apesar do apartamento parecer um bastidor de teatro, com coisas usadas e sem lugar definido espalhadas por todos os lados, o apartamento ganhara atmosfera de lar. Talvez fosse pelo cheiro de alho e cebola refogado de Olívia, ou à Cecília sacudindo a cabeleira com um copo na mão, virando e revirando o disco dos Novos Baianos, único que tinham; ou ainda de Gerard, com um martelo ou uma chave de fenda em mãos, e olhos curiosos e sorridentes; ou pelas conversas carregadas de entusiasmo, e planos possíveis, graças ao recuo do contágio por coronavírus. Fosse qual fosse a razão, alguns meses depois, quando Olívia já não fosse aquela mulher, e me contasse essa história, eu perguntaria: "— Você foi feliz em Barcelona?", ela fixaria em mim seus inquietos olhos amendoados, pensaria um pouco, e sorrindo seu sorriso triste, balançando a cabeça como se nada mais lhe importasse diria: "— Feliz? Se você tivesse que ficar preso em um dia do seu passado, vivê-lo para sempre, qual seria? O meu podia ser qualquer um daqueles dias".

A RESPOSTA DE ALINA ( EM REESCRITA)Onde histórias criam vida. Descubra agora