Capítulo 1

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Ravi

A água bem temperada cai sobre meu corpo com uma pressão mediana que me relaxa e, ao mesmo tempo, me desperta, mais uma longa noite de sonhos, sonhos que me confundem e que acabam me tirando do eixo.

Procuro o vidro de shampoo e dispenso um pouco na palma da minha mão, o devolvo para a prateleira e espalho sobre os fios que atualmente escorrem até a altura dos meus ombros.

Aproveito a espuma e desço as mãos para minha barba mediana e esfrego a região com cuidado. Volto aos cabelos, espalhando um pouco de condicionador e enxáguo os fios com afinco.

Por fim, termino de lavar meu corpo, fecho o registro e puxo a toalha me secando brevemente, visto a cueca e enrolo a toalha na cintura. Torço um pouco os cabelos, retirando o excesso de água e com uma toalha de rosto seco-os um pouco.

Tateio a bancada do banheiro e encontro um pequeno vidro com uma tampa de bulbo e sei que é o balm para a barba, aplico um pouco sobre as mãos e espalho na região do rosto e logo o leve cheiro amadeirado e cítrico se espalha pelo ambiente.

Saio do banheiro e logo sinto a presença de Anny, uma das nossas colaboradoras, a mais antiga, por sinal.

— Bom dia, Anny! — Digo rapidamente e sigo em direção ao closet com o intuito de tentar não constrangê-la.

Depois de tantas histórias, a cegueira e o acidente, perdi completamente a vergonha sobre a minha nudez, mas tento evitar o constrangimento alheio.

— Aí está você! — Escuto a voz acusadora de minha mãe enquanto caminho em direção as roupas.

— Bom dia, mamãe! — Respiro fundo enquanto tateio as placas em Braile tentando encontrar o que procuro.

— Já separei uma linda roupa para você. — Escuto sua voz açucarada e abro um sorriso.

— Aposto que é um terno e gravata azul. — Respondo enquanto tiro uma calça jeans preta.

Retiro a toalha da cintura e apoio no móvel enquanto entro na calça sem dificuldades.

— Meu filho, você não deveria andar expondo esse belo corpinho por aí! — Escuto a gargalhada da senhora Chloe e abro um sorriso.

— Pobre Anny! — Retruco enquanto visto uma camiseta preta e por cima uma blusa de manga longa de tecido de linho também na cor preta.

— Ravi não faça isso! Ela é casada, se o marido dela descobre pensará mal dela! — Ela ri enquanto tenta manter o tom de preocupação.

— É como digo, se não quer ver estrelas, não olhe para o céu! — Devolvo enquanto borrifo um pouco de perfume.

— Você é um convencido, isso sim! — Ouço os passos de minha mãe pelo ambiente e sei que ela está ansiosa.

— Pode pegar aquelas botas pretas para mim? — Peço enquanto me apoio novamente no móvel e calço as meias.

— Claro! — Ouço seus passos largos e respiro fundo.

Depois do acidente, a cegueira veio com tudo, mas se estabilizou, uma doença que gradualmente ia consumindo minha visão e agora estabilizamos, vejo poucos vultos e a luminosidade e sou extremamente grato por isso.

Agora com um ano de recuperação quero voltar a minha vida, aliás já voltei boa parte dela, o trabalho, as aulas, mas quero um ambiente mais privativo, sem minha mãe escolhendo minhas roupas como um garotinho.

Calço as botas e amarro os cadarços notando o silêncio da mulher ao meu lado. É difícil para ela também, mas quero que ela e meu pai vivam anos dourados e não fiquem cuidando o tempo todo do filho cego.

Sob as Noites de Luar. Where stories live. Discover now