A Escolha

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– Acordou cedo – Jéssica comenta assim que chega na mesa para tomar café.

Sorrio animada por perceber, a minha primeira mudança é evitar os atrasos, isso é coisa de livro, a mocinha está sempre correndo contra o tempo, além de ser desastrada, e eu resolvi sair do mundo da fantasia.

– A dona Maria é realmente sabida, o remédio me fez muito bem – com uma aparência melhor minha mãe elogia os conhecimentos da senhora.

– Aquela velha faladeira é raça ruim, não gosto dela vindo em casa, daqui a pouco enche sua cabeça de ideias, ou sai fazendo fuxico da gente. – no seu eterno mau humor, meu pai critica.

– A dona Maria é muito gentil, e gosta de ajudar, não tem nada de ruim. –saio em defesa da senhora.

– Gosta é de cuidar da vida dos outros. Vocês estão proibidas de receber aquela fofoqueira aqui em casa. – determina.

– Querido, a dona Maria é um amor de pessoa, se ela quiser vir me visitar será sempre bem vinda – minha mãe discorda usando o tom baixo e cauteloso de sempre.

– Não entendi Luiza, está dizendo que vai receber quem eu não quero na minha casa? Exijo que respeite, sou o homem que sustenta vocês. – dirige a minha mãe um olhar cortante.

– Essa casa também é minha Fábio, não se esqueça que sou eu quem trabalha o dia todo e ainda fica até a madrugada fazendo doces e salgados para pagar as contas. – sou pega completamente de surpresa com sua resposta firme.

A tensão se instala no ar, hesitante encontro o olhar de Jéssica refletindo a mesma apreensão que o meu, a mesa de repente se transformou num campo minado, onde cada movimento do meu pai é observado com receio do que está por vir.

– Tem certeza que quer me enfrentar mulher? Vá em frente, me desobedeça, traga quem quiser aqui, mas saiba que vai se arrepender dessa decisão– estremeço com o seu tom frio, é ainda mais assutador sem qualquer explosão de grito ou raiva.

Depois de proferir a ameaça simplesmente se levanta e sai, o barulho quase imperceptível da  porta se fechando ecoa dentro de mim como um alarme estridente, e sinto o gosto metálico do sangue na minha boca, percebendo só agora meus dentes cravados com força na bochecha.

Vejo minha mãe em silêncio encarando a xícara de café, o nervosismo estampado no seu rosto pálido, um suspiro alto e sofrego escapa dos seus lábios trêmulos.

– Eu não estou me sentindo bem –murmura tentando buscar  apoio na cadeira, porém cai inconsciente no chão.

– Ela desmaiou, o que a gente vai fazer? – fico desesperada.

– Calma, me ajuda – Jéssica pede e nós duas com dificuldade  conseguimos levantar a mulher e carregá-la até a sala.

Deitamos Luísa com a cabeça na almofadada e a perna elevada pelo braço do sofá, balanço uma tampa acima do seu rosto para ventilar, apenas para não ficar parada esperando que acorde.

– E se a mãe morrer? – fico assustada em ver os minutos passando e nada dela reagir.

– Que morrer Marcela, vira essa boca para lá.

– Você nem liga, né ? Sai desse celular. – reclamo agitada com toda a situação.

– Toma aqui, vê o que estou pesquisando! – bruscamente Jéssica coloca o aparelho na minha frente, na tela o site aberto traz informações sobre o que fazer em casos de desmaios.

– Me desculpe, é que estou preocupada – tento me explicar.

– E eu não, acha que só você fica triste, com medo? Me dói ver todo dia brigas, também sou xingada, humilhada.
Não é porque não choro pelos cantos ou surto revoltada com Deus e o mundo que não me importe, que eu não sinta. – admite com seriedade e fico mal por mágoa-lá.

Delírios de Marcela (Pausada) Where stories live. Discover now