3. A Espuma do Mar

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Muito tempo se passara desde que Aziraphale presenciou o nascimento das nebulosas, e como uma ladainha incessante, todos os dias ele se perguntava, mesmo que inconscientemente, se veria novamente aquele anjo...
Foi somente quando o grande plano foi iniciado e ele se tornou o anjo guardião do portão leste do Eden que ele pode novamente olhar aqueles olhos, mas agora eles eram diferentes.
É impossível explicar tudo que ele sentiu naquele momento, quando a serpente que acabara de cumprir sua função no jardim, que acabara de fazer a humanidade ser expulsa do paraíso, parada ao seu lado, se metamorfoseia num rosto conhecido.
E ele conhecia aquele rosto mais do que o seu próprio, pois não havia um dia sequer que não houvesse pensado nele desde o dia em que viu as estrelas nascerem.
"Ele caiu." pensou o anjo, sentindo uma tristeza genuína.
"Ele questionou demais, fez perguntas demais, sua curiosidade foi longe demais"
Aziraphale lutava agora com sentimentos conflitantes, parte dele, a parte sagrada, bendita, sabia que aquilo era o certo a se fazer, afinal o senhor não comete erros. Mas uma parte dele sentia uma empatia enorme, dolorosa, uma vontade de gritar aos quatro ventos que não havia problema algum em fazer perguntas, e essa parte o anjo tentava sufocar com todas as suas forças.
Então o demônio sorriu pra ele.
E naquele sorriso o anjo viu toda a beleza do mundo, viu as estrelas, as nebulosas, a vastidão do universo e muito mais, viu coisas que ele não entendia, coisas que ainda não haviam sido criadas, ele viu o amor, e viu a si mesmo.
Aziraphale sempre podia sentir ondas de amor onde quer que estivesse, mesmo com seu corpo de carne e osso, todos os anjos sentiam. Naquele momento, no muro do jardim, observando o casal que se afastava levando sua espada e a tempestade, a primeira tempestade, que se aproximava, ele sentiu pela primeira vez a onda de amor. Sentiu como o balançar calmo do mar no fim de tarde, que toca gentilmente a areia com suas espumas graciosas. Achou que, apesar de tudo, o amor vinha da criação, agora livre no mundo depois do pecado, mas ele também estava errado.

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