Saturno

183 50 20
                                    

Saturno – Jeon Jungkook

Eu sou muito medroso. Um bebê assustado, como os amigos do papai e da mamãe gostam de dizer. Meus pais não concordam, mas eu sei que é verdade. Eu finjo uma independência que não existe apenas para não precisar deles para tudo. Mas a verdade é que eu sempre precisei e ainda preciso. Às vezes eu choro por perceber isso e saber que no ponto de vista deles, isso não é tão importante quanto é para mim.

Apesar de ter nascido e crescido em Saturno, eu sou meio da Terra e meio de lá e é um tanto estranho. Eu não tenho nada de parecido com minha mãe, exceto o cabelo loiro natural e os olhos roxos. Mas a pele é como a do papai e todas as outras características físicas também. Dizem que puxei a beleza da minha mãe, também.

Eu cresci independente porque não tive escolha, não foi minha opção não ter cuidados de alguém após meus cinco anos de idade. Eu virei um pequeno adulto por total falta de opção. Mas nunca me importei, esse foi o aprendizado que me fizeram ter e eu cresci assim, ponto.

No planeta em que eu nasci, há algumas crenças. Como nossa população é pequena, diferente do que há na Terra, e como somos todos diferentes (exceto meu pai e eu), não existe gênero, mesmo que nem todos tenham os mesmos órgãos reprodutores. Diferente do que a biologia terrestre ensina, nós não acreditamos nisso e não definimos uma pessoa por ser homem ou mulher, embora eu saiba que na Terra as coisas são diferentes. Por isso, qualquer relacionamento, no nosso ponto de vista, é igual e tem o mesmo valor.

O que também é diferente dos humanos terrestres, é que nós temos uma lenda um pouquinho bizarra para quem vê de fora. Quando nascemos, ganhamos um cobertor que, por regra, só pode ser tocado por nós e nossos pais, e que deve ser dado de presente para a nossa outra metade. Como se todo mundo em Saturno tivesse sua alma gêmea e só pudesse estar com ela, para primeiro beijo, primeira vez e tudo que vem depois. Apesar de que eu disse ao Ji hyung que se ele tocasse no meu cobertor precisaria ir embora comigo para tudo isso, eu exagerei, porque não é verdade.

Apesar de que eu só posso dar meu cobertor a uma única pessoa, não precisa ser recíproco e, se não for, eu sou fadado a morrer sozinho. No meu planeta, pessoas desacompanhadas de sua cobertinha são como pessoas renegadas e elas não merecem o amor de quem busca sua outra metade. Um pouco extremista para outros planetas, mas no nosso faz sentido. Até hoje eu só conheci um renegado, e eu acho que serei o próximo, mas isso ainda não vem ao caso.

Alguns meses atrás, em um dia triste da minha vida, a curiosidade aflorou e eu entrei em uma nave. Foi o meu maior erro, porque eu saí do meu planeta, quase morri de fome e de todo o sufoco que passei, e vim parar na Terra sem a mínima noção do mundo, agarrado apenas a um pijama fininho e meu cobertorzinho amarelo. Ele está sempre comigo, afinal.

Eu fui ensinado todos os idiomas do universo desde o meu nascimento, tenho registro de mais de cem línguas diferentes em meu cérebro e sei me comunicar perfeitamente em todas elas, mesmo que só tenha experimentado cinco ou seis. Por essa razão eu pude me comunicar com o anjo que me salvou.

Park Jimin é o seu nome e eu nunca serei capaz de dizer o tamanho da minha gratidão.

Porque depois de ter me perdido e ainda ter apertado botões demais que fizeram minha nave voltar ao planeta de origem sem meu corpo dentro dela, eu não achei que fosse ser acolhido de tal forma por um anjo. Porque é isso que Jimin é. O jeito preocupado que ele me olhou, que me segurou quando minhas pernas não aprenderam a lidar com a gravidade, e que me guiou para a sua casa sem fazer maiores perguntas, me fez entender que não deve existir alguém como ele em nenhum outro canto do universo. Ele é único.

E eu sempre fui muito medroso, de seres e situações, mas a calma dele me deixou protegido e confortável o suficiente para não temer. Eu tive medo de outras coisas, claro, como vídeos no celular, a tela gigante da televisão – que eu ainda acredito ser radioativa e ter o poder de me matar – e o chuveiro que solta água que queima em minhas costas – apesar de que agora eu já aprendi a tomar banho sem morrer queimado. E crianças no mercado, elas são pequenos monstros e eu quero correr de todas elas e chorar mais que todas juntas.

As Estrelas de Saturno | jjk + pjmWhere stories live. Discover now