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O mês de agosto terminava naquela sexta-feira. Significava que só faltava mais um mês para o fim do meu estágio. Um mês passava depressa. Um mês era trinta dias com fins-de-semana pelo meio. Estava quase...

Sentia-me exausta e um pouco irritada. Não me apetecia falar com ninguém. Cheguei a casa, tomei um duche, enfiei-me no quarto a ouvir as minhas cassetes de música dos anos 50 e 60 e a escrevinhar poemas vazios.

Tinha recebido mais um salário que deixei na mesa de entrada, as notas ainda dentro do envelope. Era assim que me pagavam, em dinheiro vivo. Devia ser para não entrar na contabilidade oficial porque eu não existia. Era uma sorte receber aqueles cinquenta contos, porque havia estágios não remunerados, afirmara a professora São durante o nosso encontro no bar, a lançar uma das suas prédicas que nós escutávamos com muita atenção. Continuávamos a considerá-la como a nossa mentora, orientadora, psicóloga. Um farol numa noite escura. Não havia nenhum outro adulto com quem nos pudéssemos aconselhar. Era só ela.

Respirei fundo. O que ganhasse em setembro seria para mim. Já estava destinado para as despesas da universidade e sentir-me pobre desmoralizava-me muito. Queria ir a Nápoles! Queria fazer uma surpresa a Diego no início de outubro e estava a ver que seria muito difícil. Se pedisse dinheiro emprestado ao meu pai não lhe iria conseguir pagar e ele ficaria desconfiado. Não tinha outro remédio senão controlar as minhas despesas ao máximo e continuar a amealhar a mesada semanal.

A Marta tinha-me convidado para passar o fim-de-semana em Portimão e eu tinha recusado. Não podia. Ela não percebeu, pois eu trabalhava à semana, tinha os fins-de-semana livres, mas acho que consegui convencê-la parcialmente alegando que usava o sábado e o domingo para descansar e para passar algum tempo com a minha família. Ela ficou aborrecida, eu sabia, mas não podia fazer nada. Uma saída imprevista delapidaria a minha conta bancária e Nápoles tinha prioridade.

O telefone tocou. Ouvi-o apenas quando a minha mãe gritou para que fosse atender.

Desliguei a música e abri a porta do quarto que tinha encostado.

– Já vou, já vou – bufei. – Mas sou só eu que atendo o telefone nesta casa?

O meu pai não tinha chegado do trabalho, senão tinha-me repreendido. Era uma sexta-feira, último dia de agosto e quando no calendário esses dias eram coincidentes – o mês a fechar numa sexta – ele costumava fazer horas extraordinárias. Se eu juntava o meu dinheiro para uma viagem a Nápoles, ele estava a juntar para comprar um barco. Iria acontecer no fim do verão, que era quando estavam em saldo e havia pessoas que os vendiam por não quererem cuidar das embarcações durante o inverno.

Levantei o auscultador. Seria a Marta a insistir para irmos para Portimão? Ela costumava voltar à carga quando as coisas não aconteciam como ela queria ou tinha pensado. Lamuriava-se e eu cedia. Daquela vez, não. Pensava em Nápoles, na silhueta do Vesúvio recortado na paisagem do golfo e repetia. Desta vez não, menina Marta!

– Estou!!

Silêncio.

– Estou? Marta, já disse que não posso ir para Portimão. Estou muito cansada e tenho um jantar qualquer amanhã com uns amigos dos meus pais. Não dá mesmo para ir.

"Olá, Tina. Espero que esse jantar não te impeça de me vires visitar."

A voz de Diego tirou-me o fôlego.

– Ah... ah... Diego. Olá... olá Diego – ofeguei, em português.

"Boa tarde, Tina de Puebla."

– Boa... tarde.

"É a ligação que está má ou és tu que estás a gaguejar?"

– Sou eu! Sou eu que estou a gaguejar. Desculpa... não estava à espera. Estava longe de pensar... Dá-me um minuto. Olá, Diego. Desculpa. Ainda não estou em mim.

O Palco que Fica AbandonadoWhere stories live. Discover now