CAPÍTULO 5, meu beijo é interrompido

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Esperanza's pov

      Escutar passos dentro do Bunker 9 não me assustava, porque eu sabia que na maioria das vezes seria um dos meus colegas de chalé ou, quem sabe, a única campista que não tinha descendência nenhuma com Hefesto que era capaz de se localizar lá dentro e, claro, a minha melhor amiga. Ariel só era realmente assustadora em jogos de Capture a Bandeira quando ela segurava a sua adaga e apontava na sua direção. Em geral, ela parecia uma garota doce e gentil ── e realmente era.

      Às vezes, eu pensava que Ari tinha herdado todas e somente as qualidades dos seus pais. Ela era bonita, gentil, atenciosa, inteligente, leal, um pouquinho sarcástica e, definitivamente, uma pessoa incrível de coração e alma. O que tornava meio impossível que, em algum momento, eu não acabasse me apaixonando por ela.

      Para ser sincera, os sentimentos estavam lá desde que eu tinha treze, quando a nossa amizade deixou de ser só uma amizade e nós ficamos realmente muito próximas. Eu a achava incrível, além de muito, muito, muito bonita mesmo. Claro que, na época, eu ainda estava descobrindo a minha sexualidade, então só fui entender o motivo de eu querer estar com ela o tempo todo e sentir meu rosto ficar estranhamente quente quando decidia assisti-la treinar um ano depois (no mínimo).

      Apesar disso, as coisas só foram mudar entre a gente mesmo naquele verão. Não tinha mais uma conversa nossa em que não acabássemos flertando uma com a outra e, portando, deixássemos nossos amigos de vela. Jason até tinha reclamado ── “Se eu não posso beijar aquele garoto do chalé de Hermes, vocês não podem ficar flertando tão descaradamente na minha frente desse jeito.” era o que ele sempre dizia.

      Eu não sabia que horas eram. Geralmente, depois do café da manhã, eu entrava no Bunker 9 e só saía quando alguém aparecia exigindo que eu fosse jantar para não acabar desmaiando de fome. Portanto, como o local não tinha janelas, eu nunca sabia se era noite ou se era dia. Minha suspeita era que o Sol devia estar se pondo naquele ponto.

      De repente, ouvi os passos de alguém se aproximando cada vez mais, e torci para que a pessoa não viesse até o canto em que eu estava trabalhando caso ela não fosse Ari. Eu não tinha nada contra o restante dos campistas do chalé nove, mas era meio natural para a gente evitar ao máximo interações sociais. Nenhum de nós gostava; todos evitávamos. Acho que, se fosse biologicamente possível, todos nós ficaríamos enfurnados naquele bunker sem falar com ninguém pelo resto das nossas vidas, como o próprio Hefesto fazia, já que era um Deus e realmente podia fazer isso sem morrer.

      Então a pessoa chegou ali, mas eu consegui suspirar aliviada ao ouvir alguém mexer nas minhas engrenagens atrás de mim. Sempre que ela chegava, fazia isso. Olhava as engrenagens, mexia nos meus rascunhos e só então falava comigo. Eu não me incomodava. Ela era organizada o suficiente para nunca tirar nada do lugar que eu tinha deixado, por mais bagunçado que já estivesse.

       ── Boa tarde, princesa ── falei, sem desviar a minha atenção da espada de um filho muito frustrado de Ares que tivera a sua arma quebrada por uma filha de Hécate em um duelo e agora queria que ela ficasse boa até o próximo Capture a Bandeira. Ariel sempre compreendia quando eu não tinha tempo para conversar, mas não deixava de ir falar comigo nunca. Ela entrava lá, notava que eu estava ocupada então deixava a água que sempre trazia para mim ao meu lado, se sentava em um banquinho e ficava lendo, em silêncio, como se estar ali fosse mudar tudo. Para mim, mudava. Era muito bom saber que ela estava ali ao meu lado, simplesmente. Podia parecer idiota, mas ainda era bom.

      ── Boa tarde ── ela respondeu educadamente, então ouvi o som do banquinho sendo arrastado para que ela se sentasse. Uma coisa impressionante era como o cheiro dela, um cheiro doce como um drink que você bebe na beira da praia, escondia qualquer outro quando ela entrava em uma sala.

DESCENDENTES, a fera acorrentadaWhere stories live. Discover now