Indomável (Romance Gay)

Capítulo 3 - Mais longe ainda

Bom, talvez tenha chegado o fatídico momento de admitir que fui um pouco longe de mais. Literalmente. Mas eu posso explicar.

Quando cheguei na imensa casa da fazenda, segui a lógica e fui até o molho de chaves que ficava próximo a dispensa da cozinha. A lógica estava errada. Então fui até uma sala semelhante a um escritório e lá estava em cima da mesa, a chave de uma Mitsubishi novinha em folha que vi mais cedo estacionada ao lado da casa. Tudo estava dando tão certo, eu voltaria ainda antes do almoço. Encontrei a Judy no corredor tirando a poeira de alguns quadros, mas ela nem desconfiou, se fosse mais esperta desconfiaria do meu excesso de carisma.
E foi ainda correndo que alcancei o carro e em poucos segundos já estava dentro dele. Mas alí estava a parte difícil. Dirigir.
Eu nunca precisei, na verdade. As pessoas que moram na civilização, elas tem acesso a aplicativos como uber, por exemplo. É tudo muito mais prático.
Mas eu tinha em mente que aprendo muito rápido, ainda mais em um carro moderno como este.

Coloquei o cinto, girei a chave, pisei no acelerador, puxei a macha e consegui fazer a curva para ir pra direita. Eu estava tão confiante, pensei até que poderia ir para casa assim em qualquer um desses momentos de tédio dizendo que voltaria mais tarde e nunca mais aparecer. Apareceu um ponto de sinal no meu celular, o que fez chegar algumas notificações e então eu fui conferir.
Aí eu bati o carro numa árvore.

Foi tudo tão rápido, nesse momento estou tentando escapar do airbag que quase me sufocou.
Tá bom, eu definitivamente fui longe de mais.
Após apertar o botão na chave para parar com o barulho do alarme, tiro o meu cinto de segurança e abro a porta. Por milagre não tive uma crise de ansiedade como mais cedo. Tropeço no meu pé após descer.
Ao me equilibrar, quando olho pra frente para ver onde estou, dou de cara com uma menina de cabelos castanhos em uma trança de lado e vestido florido que aparenta ter acabado de sair da adolescência. Parece ter vindo daqueles filmes do século passado, isso confirma que eu realmente estou em alguma espécie de faroeste, -se ainda haviam dúvidas- só faltam as armas. Se elas aparecerem, pode ser que eu precise de uma.

Logo atrás dela, um pouco mais afastado do caminho por onde dirigi, vejo uma espécie de bar. A estrutura de madeira marrom e envelhecida tem barrís de cerveja na frente e um letreiro apagado escrito "Bar Meia Noite" em cima. Mais abaixo, os dizeres "Bar e casa de shows" -só se for de horrores-.
É um estabelecimento isolado, tão isolado que não tem nenhum cliente na frente, além das duas crianças paradas na porta que observam o resultado do acidente. Isso tudo é ainda mais arcaico do que qualquer coisa que eu tenha visto na fazenda do meu avô.

-Oi!-Diz, sorridente e acenandando.

-Onde é que eu tô?-Questiono, sentindo uma dor fodida nas costas.

Aponta para o letreiro de uma forma animada.

-Bar Meia Noite!-Sorri ainda mais, como se fosse possível.-É da minha família.

-Ah...-Assinto, ainda observando ao redor e começando a ficar um pouco asustado.-Eu preciso de Wi-fi.

A garota então olha para o carro com a frente destruída atrás de mim e faz uma cara de preocupada, logo se torna um sorriso novamente, como se tivesse se dado conta de que o Wi-fi é mais importante no momento.

-Tudo bem! É só vir comigo!

Me pergunto se vou ficar assim da cabeça se passar mais um tempo por aqui e então a sigo. Se bem que, por conta dos últimos acontecimentos, eu duvido muito que o vovô não mude de ideia em relação a me obrigar a ficar.

Passamos pela entrada, as crianças sumiram e agora eu me sinto visitando um bordel do século 18. Tem até um palco aqui. Sinto cheiro amadeirado de whisky barato e a irritação que essa música country me causa, mesmo que em volume baixo. O salão é bem grande, cheio de mesas e quadros fora de contexto, com um grande balcão com bancos altos.
Se foi aqui que o meu pai e a minha mãe se conheceram, eu acabei de desenvolver um novo trauma.