Whiskey, paletós e sorvete

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Prezados,

Sabemos que a vida, em toda sua essência, é mantida por suas alegrias e seus momentos de glória. Entretanto, é necessário reconhecer e enfrentar suas desventuras, e estas, por sua vez, não são adeptas à misericórdia. Quando chegam, é sem aviso prévio, sem previsão de partida e, claro, sem ouvir as súplicas por paz.

Não seria diferente para nossos rapazes. A juventude e seus sentimentos não guardavam o futuro planejado por eles.

Jungkook desejava com grande frequência poder abrir os olhos em suas manhãs, olhar-se no espelho e ver um homem, aos seus 35 anos, bem sucedido e satisfeito com a vida que levava. Mas encontrava-se remoendo antigas frustrações, quando achava que finalmente seu coração havia ficado em silêncio — não esperava que estivesse em paz, seria pedir demais, apenas desejava não sentir nada —, um milhão de pensamentos lhe voltavam à mente e  o órgão parecia definhar.

Certamente não reclamava de sua família, sua esposa era ótima. Não o amava, mas Jungkook sabia fingir não ver suas saídas noturnas, sendo retribuído com a mulher ignorando quando o moreno bebia e sussurrava nomes desconhecidos em sono profundo, atordoado. Também não reclamava de suas condições financeiras, ou da casa bem decorada que moravam, muito menos do posto político que ocupava.

Posto político este conquistado por seu pai, ao conseguir concretizar seu casamento arranjado com Luiza, moça filha de uma família renomada. Sr. Jeon se orgulhava sempre que dizia ser o diretor da Associação de Imigrantes Coreanos no Brasil e passava boas horas semanais lustrando a placa dourada que abrilhantava sua mesa, ou gritando com funcionários toda vez que sentia necessidade de reafirmar seu poder.

Nomes e títulos não foram o suficiente para impedir que a enfermidade o atingisse. Ver o patriarca padecer em sua cama, vítima de uma doença que o corroía era triste, mas não posso afirmar que nutria alguma empatia por sua situação. Porém, foi doloroso assistir Jeon Jungkook herdar seu posto. Ser obrigado a abandonar seus livros de poesia, seu grafite e papéis rabiscados.

Com frequência, agora, empregados espiavam por sua porta e o viam sentado atrás de sua mesa, com o olhar disperso, uma caneta balançando entre seus dedos, mas nenhum documento assinado.

Em sua mente, era recorrente a lembrança de seus tempos na fazenda. Conseguia ver com clareza a enorme extensão verde, o cheiro do café moído e as mãos suaves de Kim Taehyung tocando suas bochechas com ternura.

— Kook, por favor, você pode olhar pra mim? – Taehyung implorava ao seu lado, a voz trêmula, dizendo frases com incerteza. – Não vai me dizer que vai aceitar tudo o que disseram.

Jeon olhava para o chão, não queria encarar os olhos do rapaz se estivessem tão carregados de dor quanto sua voz.

— Não podemos continuar com isso. Não tem como – disse tentando passar confiança.

— Ora, por favor! Sabemos que podemos dar um jeito se pensarmos um pouco mais. As críticas de seu pai foram tão duras que te fizeram desistir de tudo?

— Agora não é um bom momento para sonhar acordado, Taehyung. E se estiverem certos? E se for mesmo desprezível? – Jeon não desviou seus olhos do chão, não queria parecer fraco.

— Acha que o que temos é desprezível? – Taehyung indagou, incrédulo.

Silêncio.

— Acha. Você acha que o que temos é desprezível. Concorda com eles – sentiu a chateação em sua voz se transformar em decepção, esta que era quase palpável.

O mais novo não ouviu quando o outro deixou a sala e não voltou. Não sabe como teria sido caso contrário, mas no fundo desejou fortemente que Kim invadisse o cômodo, lutando por ele com as forças que ele próprio não possuía.

Da Cor do Vinho • taekookحيث تعيش القصص. اكتشف الآن