3. spice

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Sexta-feira, 10 de abril de 2022. 15:15h

POV: chaeryeong

Depois que eu, Lia e Yeji acabamos de discutir os planos da próxima sexta, fiquei enrolando no celular até o professor Park, de histologia, aparecer. Tinha me comprometido a arrumar as novas amostras para a aula dos calouros em troca de uma falta justificada no fim do mês. Era um trabalho longo e bastante entediante, mas quando o resto da turma estivesse sendo obrigada a assistir a aula de espécies silvestres da professora Moon, eu estaria em casa fazendo qualquer coisa melhor do que ouvi-la reclamar do marido e dos filhos por 4 horas seguidas ao invés de realmente passar o conteúdo. Podia ser chato agora, mas valeria a pena.

Enquanto esperava, recebi uma notificação da minha galeria de fotos: "neste dia, 6 anos atrás". Cliquei por impulso já sabendo que iria me arrepender. Dito e feito. Ao abrir a foto em questão, lá estávamos nós. Eu, meu pai e minha mãe. Na última viagem que fizemos juntos. Meus pais estavam sorrindo como se fosse o dia mais feliz da vida deles e eu estava fazendo uma careta. Tinha 14 anos e devia estar passando por uma fase rebelde, quase não tenho fotos sorrindo daquela época. A neve atrás de nós era bem branquinha e o sol estava brilhando forte. Era um dia lindo e tinha sido uma viagem maravilhosa, cheia de boas memórias. Memórias que ficariam comigo pra sempre, mas só. E por mais que fosse bom olhar pra trás e ver que tínhamos vivido a vida ao máximo quando ela estava conosco, hoje em dia acho que trocaria tudo isso por mais um dia com ela. Mais uma chance de dizer que a amava e que sentia sua falta. De pedir desculpas pelos meus erros e de lhe dar um abraço. Mesmo 6 anos depois, algumas coisas ainda eram demais pra encarar sem sentir o coração apertar e os olhos arderem.

Não é tão intenso quanto foi durante o primeiro ano de luto, quando qualquer mulher da idade dela me fazia chorar, mas ainda assim é difícil. E não sei se me incomoda mais o fato de que todos esses anos depois ainda dói muito ou o fato de que já não sou tão sensível quanto costumava ser. Não ter superado tudo ou já ter superado tanto, não sei dizer o que é pior.

Deus, odiava ficar tão emotiva em público. Ainda bem que o professor Park era breve nas palavras. Logo logo estaria sozinha de novo. Guardei o celular e me levantei, enxugando os olhos apesar de não ter chorado. Avistei o professor saindo da sala de aula com alguns alunos que seguiram seus caminhos. Ele veio até mim com as chaves do laboratório nas mãos e uma caixa de plástico embaixo do braço. Parecia pesada, o que significa muitas amostras. Tento disfarçar minha cara de decepção.

-Boa tarde, srta. Lee. Vamos entrar?

-Boa tarde, professor Park. -Respondo, passando pela porta que ele destrancou.

Apoio minha mochila no armário dos alunos e pego meu jaleco. Separo dois pares de luvas e um óculos protetor. Já estou de cabelo preso, tentando causar uma boa impressão no professor ao seguir todas as regras de segurança do laboratório, mesmo que eu não vá mexer com nada perigoso.

-Srta. Lee, aqui estão as amostras. Estão todas devidamente numeradas e identificadas. Não esqueça de descartar as antigas de maneira adequada. Obrigado mais uma vez pela ajuda.

-De nada, professor Park. Quando acabar, peço ao monitor do prédio para avisar ao senhor.

Ele acena positivamente com a cabeça e deixa a sala. Fico sozinha de novo e me sento, começando a contar as amostras antigas para descarte. Separo algumas, mas não consigo me livrar da sensação melancólica que me atingiu há alguns minutos. Sei que Lia e Ryujin estão na aula de dança e Yuna já deve ter ido embora. Talvez Yeji esteja livre.

Penso mais alguns minutos se realmente devo chamá-la e correr o risco de estragar seu bom humor ou se deixo pra lá e espero esse sentimento ir embora por si só. Um pensamento me ocorre de que, se fosse ao contrário e ela que estivesse se sentindo assim, me partiria o coração saber que ela resolveu não contar com a minha ajuda. Pego o celular e envio uma mensagem. A resposta dela não demora.

first encounters, accidents & other things you can't planWhere stories live. Discover now