𝗳𝗼𝗿𝘁𝘆.

209 20 3
                                    

— Vou orar para Deus matar seu namorado.

De todas as frases esquisitas que já ouvi, poderia concluir sem sombra de dúvidas que essa tinha sido a mais icônica.

Principalmente pelo fato de ter vindo de uma senhora de idade, acima de tudo, homofóbica.

Como morava sozinho, eu montava o jumbo de coisas da minha mãe. Passava no mercado para pegar algumas coisas em falta e para meu divertimento pessoal, sempre ia na mesma quitanda conversar com essa senhora para escutar ela dizer que eu namorar um homem era sacrilégio na religião dela.

Ela num dia qualquer se deparou comigo e Felix nos despedindo com um selinho rápido. Lógico, foi o fim dos tempos e logo as sete trombetas do apocalipse iriam soar.

Para a infelicidade da senhora Park, isso não aconteceu.

— É o fim dos tempos. Os homossexuais vão dominar o tempo e acabar com a raça humana...— Proferiu ela, tendo expressão de desprezo misturada com medo. — Vou orar bastante para aqueles como vocês irem direto pro inferno. Todos com as almas condenadas!

— Não esqueça de ir na missa pedir pelo meu fim também, não posso deixar meu amado sozinho com o diabo...

Foi o suficiente para ser expulso com insultos assombrosos, dos quais guardei alguns na memória. Poderia ser muito útil algum dia. Acompanhados de maçãs voando em minha direção, talvez fosse cruel da minha parte ser tão petulante com religiosos.

Nem sempre retiro um tempinho para perturbar alguém, porém hoje era um dia de contentamento. Poderia conversar com minha mãe pelo telefone, e finalmente conseguiria eliminar um pouco da saudade.

Meu maior desejo era tê-la morando em casa, como uma família. Tenho resquícios de memórias dela me deixando dormir consigo, mesmo com meu pai ficando irritado.

Eu não sabia quanto a saudade doía, até que me deparei com dias horríveis dos quais não poderia correr para os braços da minha mãe e ser acolhido. Quando a vi pela primeira vez atrás de um plástico enorme nos separando, pensei milhões de coisas. Minhas mãos tremiam quando encostei o telefone frio no ouvido e ouvi sua voz abafada pelo choro pedir desculpas.

Não respondi nada.

Nenhum ruído escapou da minha garganta.

O telefone desceu pelos meus dedos fracos de força e caiu com um baque surdo na mesa — os olhos vidrados num indivíduo idêntico a mim — por alguns segundos enxerguei uma desconhecida.

Amortecido pelo choque, apenas levantei aéreo de tudo. Lembro dela gritar para mim voltar e ser levada a força para sua cela.

— Hyune.

Com uma voz séria, minha mãe chama a minha atenção.

Igualmente que nossa frequência de se ver tenha diminuído drasticamente, nunca deixei de acatar nenhuma ordem. Com um bufada impaciente, volto o olhar para ela.

Não percebi que tinha começado um devaneio aleatório e encarei uma formiga morta por exatos dois minutos.

— O quê você quer me contar?

— Ah...Não é nada muito urgente. — Mexi os ombros incomodado. — A escola tem tomado muito meu tempo, tive que pensar em muita coisa e-

— E essa coisa tem a ver com uma namorada?

A maneira desta informação ser trazida a mesa me fez questionar minha maneira de esconder fatos importantes. Me vigiava constantemente para ter certeza que nunca mostrava a mão com uma aliança.

Ser assumido ou não, não era algo que enxergava como "problema" imediato. Como também jamais havia parado para refletir sobre ter desencalhado a alguns meses. Sem ter contado a ela.

— N-namorado, na verdade. — A corrigi com um sussurro medroso.

— ...

— Ele é da minha escola, de verdade, ele é muito engraçado, gentil, inteligente e tagarela. — Assegurei depressa. — Agora eu tenho amigos, é sério! nem mudei meu cabelo, ele tem estado intacto desde que o conheci.

Não tinha ensaiado nada, nem conseguido manter um sorriso falso diante desta situação. Tentando dizer mais rápido do que meu cérebro conseguia oxigenar, comecei a ficar zonzo ao me atropelar nas palavras.

Meu coração batia tão rápido que doía, a expressão de minha mãe era uma incógnita.

— Hyunjin! — Ela bateu a mão na mesa, impaciente. — Pare de tentar me silenciar, se fosse para te deserdar já teria te dispensado.

Soltei a respiração, aliviado.

Eu nem percebi que havia prendido a respiração.

— Você sabe que tentar fazer sua voz sobressair pela minha não vai mudar nada. — Continuou. — Espero unicamente que não tenha dormido com ele, entende? são muito novos e os hormônios a flor da pele.

Eu me recusava a beijar ele enquanto não largasse do fumo, e com esse grande incentivo consegui superar a mania. Porém no fundinho sempre tinha a vontade de tragar novamente, a abstinência foi horrível.

Outra coisa é que no processo de desapegar tive uma grande “ajuda” de Felix. Além do isqueiro, ele desaparecia com meus maços reservas. Em casa quase enlouqueci.

— Estarei intacto até o casamento, não se preocupe.

— Excelente. Mas como você arranjou um namorado se nem tem amigos? — Minha mãe indagou.

— Eu tenho amigos.

— Você foi adotado por um extrovertido? provável, os amigos dele devem ser divertidos...

Concordei mentalmente, adorava seus amigos e principalmente quando falava com eles. Morria de medo de Minho achar que estava o deixando de lado.

O medo passava quando Minho entrava na minha casa de noite e me avisava na hora que iria dormir ali. Um costume bobo que acabou se consolidado quando minha mãe foi pra trás das grades e eu não queria ficar sozinho.

— Eu sei que deve ser vergonhoso ter uma mãe...ahm...presa, entretanto está tudo se você não tiver contado isso pra ele, podemos nos conhecer quando eu for liberada.

Hwang Ji-Yu, 33 anos, presa por porte de drogas acima do limite para consumo próprio. Muitas investigações e nada dela dizer quem era seu fornecedor, fez acordo com a justiça e frequentou clínica de reabilitação.

Marido desaparecido a 4 anos e procurado por abandono de menor.

Não era o cenário mais saudável de todos, mas a terapeuta tinha feito milagre. Estive pensando seriamente nisso, logo apresentaria meu namorado para ela.

O que também era muito estranho, acostumei tanto a viver sozinho naquela casa que ter companhia parecia uma ideia irrealista. Minha mãe de volta para casa? nós seríamos a mesma coisa? eu ficaria bem?

— Hyunjin.

— Sim?

— Eu saio na próxima segunda-feira.

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relevem erro ortográfico 🎀

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⏰ Última atualização: Mar 03 ⏰

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𝘆𝗲𝘀 𝗼𝗿 𝘆𝗲𝘀  | HyunlixOnde histórias criam vida. Descubra agora