004- Beijos e abismos

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[Valentina Albuquerque]

Decidi começar meus planos infalíveis envolvendo Luiza em atividades que costumávamos desfrutar juntas, na esperança de reavivar as lembranças dos momentos felizes que compartilhávamos. Convidei-a para um passeio no parque, onde costumávamos caminhar de mãos dadas sob a luz do sol poente.

—Lu, que tal darmos um passeio no parque esta tarde?– propus, esperançosa de que ela aceitasse.

Luiza olhou para mim, seus olhos revelando uma mistura de surpresa e desconfiança. Era como se ela estivesse avaliando minhas intenções, ponderando se devia ou não aceitar meu convite.

—Eu não sei, Valentina... –ela começou, hesitante.

— Por favor, Lu, seria bom passarmos um tempo juntas, como costumávamos fazer. Um piquenique, nada demais!– insisti, segurando sua mão com ternura.

Depois de um momento de silêncio, Luiza finalmente assentiu com a cabeça, um leve sorriso surgindo em seus lábios. Era um pequeno sinal de esperança, uma indicação de que talvez ela estivesse disposta a dar uma chance ao nosso relacionamento. Com o coração cheio de expectativa, me dispus a organizar tudo sozinha e cerca de meia hora depois saímos juntas em direção ao parque, deixando para trás o peso das preocupações e das incertezas que nos assombravam.

Ao chegarmos lá, respiramos fundo o ar fresco da natureza, sentindo a brisa suave acariciar nossos rostos. Por um momento, tudo pareceu perfeito, como se estivéssemos voltando no tempo para os dias felizes de outrora.

—Está tão bonito aqui. – Luiza comentou, olhando ao redor com admiração enquanto eu forrava o chão com uma toalha de mesa. — Não mudou muita coisa desde a última vez.

— Sim, e esse sempre foi um dos seus lugares favoritos. – respondi, sorrindo para ela.

Por um momento, nos perdemos na tranquilidade do parque. Era reconfortante estar perto de Luiza novamente, sentir sua presença ao meu lado, mesmo que fosse apenas por um breve momento. No entanto, à medida que o sol começava a se pôr no horizonte, uma sombra de preocupação começou a pairar sobre mim. Luiza permanecia quieta, distante, como se estivesse perdida em seus próprios pensamentos.

Decidi que era hora de tentar mais uma vez. Talvez, em um momento de fraqueza, Luiza permitisse que eu me aproximasse novamente. Preparei tudo com cuidado, desde o piquenique no parque até as lembranças cuidadosamente escolhidas para despertar algo dentro dela. Não era atoa estarmos ali.

—Lu, lembra daquela árvore onde escrevemos nossos nomes pela primeira vez?–  sugeri, tentando recriar um vínculo que parecia cada vez mais frágil, enquanto apontava a tal mangueira.

Os olhos de Luiza se estreitaram, como se a lembrança provocasse uma dor que ela preferia esquecer. Seus lábios, antes tão doces, agora se contraem em uma linha firme de resistência.

—Valentina, nós já conversamos sobre isso…– sua voz, normalmente suave, carregava um tom de frustração e desgosto desconcertantes.

Engoli em seco, lutando contra o aperto em minha garganta. Cada palavra de rejeição dela era como uma punhalada no meu peito, rasgando os fragmentos frágeis do amor que um dia compartilhamos.

—Eu só queria... Eu só queria que as coisas voltassem ao que eram antes.– murmurei, as lágrimas ameaçando transbordar dos meus olhos.

Luiza desviou o olhar, incapaz de suportar o peso da minha tristeza. Eu me senti vazia, desamparada, como se estivesse assistindo ao desmoronamento lento de tudo o que um dia significou para mim. E no fundo do meu coração, eu sabia que não havia nada que eu pudesse fazer para impedir isso.

Entendi, vou continuar a partir do momento do piquenique, incluindo a presença de Léo e o beijo entre Valentina e Luiza, com as emoções e reações que você descreveu.
— Eu também queria. – Sua voz me despertou.
— Lu…
— Por favor, por hoje, não vamos falar de problemas. – ela pediu e eu assenti em concordância.

Luiza estava certa, não era o momento
O piquenique no parque era, de certa forma, um oásis de tranquilidade em meio ao caos emocional que consumia nossas vidas. O cesto que trazíamos estava repleto de iguarias que outrora nos faziam sorrir, mas agora pareciam apenas um lembrete doloroso do que havíamos perdido.

Enquanto estávamos na grama macia, compartilhando um silêncio tenso, a presença invisível de Léo pairava sobre nós como uma sombra. Ele estava na escola, longe das complicações do mundo dos adultos, mas sua ausência era sentida em cada momento que passávamos juntas.

—Você se lembra da primeira vez que viemos aqui com o Léo?– murmurei, buscando desesperadamente um lampejo de conexão em meio ao abismo que se abria entre nós.

Luiza assentiu, seus olhos evitando os meus, mas sua expressão suavizando ligeiramente com a lembrança. Era como se por um breve momento, a barreira entre nós se desfizesse, permitindo-nos compartilhar uma memória feliz.
— Ele adora esse lugar. – Disse ela, baixinho.
— A primeira vez que viemos aqui ele só sabia correr de um lado para o outro com aquela bola de futebol que o Igor deu e você surtando porque iria precisar lavar o uniforme da semana todo sujo de lama.
—Nossa, Valentina, o ódio que eu senti de você e do seu irmão naquele dia e pelo mês que se seguiu não estava escrito em nenhum lugar. – Gargalhou.
— Em minha justificativ-
— Em sua justificativa nada!– ela riu, me olhando nos olhos e suspirou profundamente. — Eu avisei que não era boa ideia sair de casa sem roupa extra e muito menos com uniforme branco. Tem noção de como a blusa dele ficou manchada? Precisei comprar outra e aqueles uniformes são uma fortuna. – bufou.
— Confesso que foi proposital.
— Como é que é?
— Sabe como é, Linda…. as coisas andavam calmas demais, eu sentia falta da minha Luiza militante bravinha.
— Não acredito nisso, Valentina.
— Pois acredite, porque você fica linda quando t-
— Quando tá toda bravinha.– Ela copiou minha frase imitando minha voz de um jeito fino que me fez rir.
— Não dá para evitar, eu te irrito, você fica brava, você fica linda e me dá vontade de te beijar e-

E então, sem aviso prévio, nossos olhos se encontraram, e algo indefinível passou entre nós. Um impulso, uma centelha de desejo há muito tempo suprimido, que nos aproximou perigosamente. Em um momento de fraqueza, nossos lábios se encontraram em um beijo casto, tenso, mas carregado de significado. Gostoso. Um beijo nosso.

Por um instante, o mundo ao nosso redor desapareceu, e fomos apenas nós duas, unidas pelo fio frágil do que uma vez foi amor. Mas o momento fugaz terminou tão rapidamente quanto começou, e quando nos afastamos, o ar estava pesado com o peso do arrependimento e da culpa dela.

Luiza recuou, seus olhos cheios de uma frieza quase calculista, como se estivesse tentando se convencer de que o que acabara de acontecer era um erro. E talvez fosse, mas eu não conseguia negar a faísca de esperança que ainda ardia dentro de mim, mesmo diante de tudo.

—Lu, está tudo bem? –perguntei, notando sua expressão sombria. Ela hesitou por um momento antes de responder, seus olhos desviando-se dos meus.

— Desculpe, Valentina... Eu só estou me sentindo um pouco cansada, acho. –ela murmurou.

Meu coração apertou ao ver a dor nos olhos dela, a sensação de impotência inundando-me mais uma vez. Eu queria desesperadamente ajudá-la, mas não sabia como.

—Você quer ir para casa? Podemos voltar outro dia se você estiver se sentindo melhor.– sugeri, preocupada. Luiza hesitou por um momento antes de assentir com a cabeça, uma expressão de gratidão passando por seus olhos.

Enquanto nos levantávamos para partir, o silêncio entre nós era ensurdecedor, carregado com todas as palavras não ditas e emoções reprimidas, ao menos dentro de mim. Eu me perguntava se algum dia seríamos capazes de encontrar o caminho de volta para o que uma vez fomos, ou se nossas vidas seguiriam agora em direções opostas, separadas por um abismo de mágoa e arrependimento.  Eu sabia que havia algo mais, algo que Luiza não estava me contando, e isso só aumentava minha angústia e preocupação.

Ao chegarmos em casa, nos despedimos com um abraço rápido, mas o vazio em meu peito só aumentou quando vi Luiza se afastar pela porta. A sensação de impotência era avassaladora, a incerteza do futuro pairando sobre mim como uma névoa cinzenta.

editado: 06/05/24

lembranças de nós - Valu (Reescrevendo)Where stories live. Discover now