Ângela

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Depois de um dia que começou muito bem e terminou quase me fazendo matar alguém, descobri onde meu celular estava. No hotel onde eu e Larissa ficamos.

A camareira o achou e o gerente, que já me conhecia e recebia uma boa gorjeta para desligar todas as câmeras do local e ficar com a boca bem fechada sobre minhas idas até lá, mandou para o prédio da ALT.

Tenho certeza que aquela pobre mulher encontrou bem mais do que meu celular naquele quarto.

Eu poderia ir embora para casa e pegar esse aparelho amanhã, mas por uma razão que desconheço estou entrando em minha sala depois do expediente. O prédio já está praticamente vazio.

Acho que na verdade eu só queria dar boa noite para minha mãe, como sempre fazia antes de ir embora depois de um dia de trabalho.

— Oi mãe! — Sento em minha cadeira atrás da mesa. — Desculpa por não aparecer aqui hoje. Sabe que fiquei o dia todo ocupada, não?

Pego meu celular sobre a mesa e fico rodando ele sem interesse, esperando ouvir sua bronca por ficar a manhã toda trancada no hotel e quase ter perdido uma pequena fortuna se aquele ensaio não acontecesse.

— Só passei para te dar boa noite e pegar esse aparelho. Tenho certeza que se estivesse aqui, iria odiar tanta tecnologia.

Estendo a mão sobre a mesa e pego o porta-retratos, sem evitar um sorriso surgir ao encarar a foto da jovem Lurdes.

Dou um leve beijo na moldura antes de devolver para o lugar e encosto na cadeira, encarando aquela mulher que já partiu há muitos anos. Mais precisamente 18 anos.

Passo os olhos ao redor da sala sem interesse em nada em especial e solto um triste e profundo suspiro.

Daqueles que dói o peito.

Eu deveria me sentir realizada. Era assim que eu deveria me sentir sempre que olhasse para tudo o que conquistei ao longo da vida. Ao menos era assim que eu costumava me sentir no início. Mas eu ainda continuo me sentindo incompleta, mesmo tendo o mundo aos meus pés.

Isso porque a pessoa que vibraria comigo, cada conquista, cada prêmio, não está mais aqui ao meu lado.

Pego novamente o retrato e fico encarando a jovem mulher de sorriso livre e cabelos soltos. Sempre me pergunto como ela seria se ainda estivesse viva.

Será que já teria fios brancos ou rugas?

Na época dessa foto nem eu e nem Tatiane ainda éramos nascidas e nem ela tinha conhecido o filho da puta que desgraçou nossas vidas.

Da minha mãe herdei as melhores coisas. Agradeço a Deus por me permitir parecer muito mais com ela do que com o homem que contribuiu para me gerar.

Eu era praticamente a cópia de dona Lurdes quando ela era mais jovem.

Exceto uma coisa.

Aquela maldita covinha em minha bochecha que surgia sempre quando eu ria.

Talvez seja por isso que eu quase não o fazia.

Odiava quando eu acabava rindo e alguém comentava sobre aquela minha deficiência que só me fazia lembrar quem eu desejava esquecer para sempre.

Eu tinha tudo o que o dinheiro poderia comprar. Eu era podre de rica, tinha a melhor irmã que o universo poderia me dar, um cunhado que a fazia feliz, alguns poucos amigos nos quais poderia confiar minha vida e uma lista enorme de mulheres a quais adorariam poder ter um pouco da minha atenção.

EU ME RENDO - ROMANCE LÉSBICO [DEGUSTAÇÃO] - TRILOGIAحيث تعيش القصص. اكتشف الآن