Capítulo 30 - "Mas, o que é o luto, se não o amor que perdura?".

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Pessoas costumam ter dias terríveis, mas se perguntarem a elas quando foi que tudo deu errado, poucas se lembrarão, afinal, poderia ter sido em qualquer dia da semana. Para Wanda, o dia seis de novembro de dois mil e quinze ficaria nitidamente gravado em sua memória. Não achava possível perder duas vezes, mas aconteceu. Sem irmão, sem namorada, sem família. Sozinha, e pela última vez.

Quatro semanas se foram sem Natasha, quatro sem comer e dormir. No início, os seus dias se resumiam em estar na agência desde o nascer do sol até quando a última estrela aparecia no céu, pois tentava ajudar com o que fosse possível, como se isso pudesse aproximá-la da mulher de alguma forma. Tinha tempo para si apenas de madrugada, e utilizava-o para chorar até que sentisse que iria morrer. Não conseguia dormir na sua própria cama, ouvia os risos e as carícias que dividiram sobre ela como uma memória quase sólida. Conseguia ouvir até os dias que namoraram naquele colchão, e isso a fazia se abraçar.

Wanda corria para a cama de Natasha e ficava lá todas as noites, inalando o perfume deixado no lençol — única coisa que conseguia sentir da namorada. Às vezes, acordava abrupta e suada, e quando olhava à sua volta e não a via, caia na triste realidade, uma onde sua companheira possivelmente havia partido. Seus encontros com Natasha eram em sonhos agora, apenas neles.

Diferente de todas as vezes que se encolheu em um canto com uma expressão coitada, estava sentada no sofá do terraço com uma absolutamente neutra. Seu nariz carregava um curativo. A partir da terceira semana, entrou em um estado de luto silencioso. Eram momentos onde ficava apática, como agora. Não esboçava nenhuma reação, sua alma parecia ter se expelido do seu corpo. Clint, Steve e Laura eram os mais próximos a entender o que ela estava passando, e, mesmo assim, não eram capazes de trazer as palavras que ela precisava ouvir. Mas estavam lá, como um ombro amigo. Ela não falava com ninguém sobre como se sentia, também não tinha as palavras que precisava. Não saber se Natasha estava viva ou morta era ver a namorada morrer a cada movimento do ponteiro de um relógio.

Se nem ao menos a melhor espiã do mundo sabia que a Sala Vermelha ainda existia, quais eram as chances deles a encontrarem? Era uma luta perdida, Wanda tinha convicção disso. Aquele espetáculo há meses atrás foi uma armadilha. Talvez nunca fossem se encontrar outra vez, talvez Natasha tenha ido para não voltar. Mas Natasha Romanoff é assim, sempre à frente por todos, e talvez Wanda devesse aceitar, do mesmo jeito que aceitou a atitude heróica do irmão. Ela nunca teria estômago para ser igual, e isso a fazia se sentir como uma vilã, pois moveria céus e terras para trazê-los de volta, custasse o que custasse.

Aquele sofá foi onde tiveram o primeiro encontro, e, possivelmente, o último. Quando ela olhava para o chão, conseguia vê-las deitadas alí, entre risos altos vindos do coração. Fechou os olhos quando sentiu uma lágrima querer escapar, mas isso só fez a mesma descer pela bochecha. Continuou com as pálpebras caídas. Uma brisa gelada comprimentou seu rosto, a fazendo levantá-lo um pouco para recebê-la. Suas pupilas deram de cara com a lua cheia, e a suposição de que talvez Natasha também estivesse vendo-a lhe rendeu segundos de esperança, algo que acreditava não ter mais. Quis tentar algo, então logo fechou os olhos de novo. Apertou-se no lençol que estava cobrindo-a e se concentrou. Precisava tentar, poderia funcionar. Tinha que funcionar.

Nos primeiros instantes, tudo estava vago e gelado em seu interior, como era desde o dia em que ela se foi. E mesmo frisando o seu rosto, mesmo se concentrando em todo o amor que sente, nada veio de imediato. Mas não desistiu, continuaria. Segundos após sua insistência, um calor conhecido começou a emanar do seu corpo. Seu coração bateu rápido. Estava funcionando, estava a sentindo. Não se desesperou, para não interromper. Seu coração iniciou batimentos indicativos, e esse calor foi ficando cada vez mais próximo. Quando sentiu a presença atrás de si, se virou velozmente.

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