prólogo

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Louis poderia ter culpado a ausência da sua mãe, durante toda a sua infância, adolescência e amadurecimento, como ele também poderia ter culpado a separação dos pais, trazendo todo o fardo de ser o único homem da casa para cuidar de todas as irmãs mais novas, e ainda ter que lidar com a depressão da mãe, após o término de um casamento que parecia duradouro — ou, como suas irmãs costumavam dizer, deveria ter sido para sempre.

A verdade era que o dono de olhos azulados nunca procurou culpar seus pais por suas escolhas de vida; possivelmente, a única parcela de culpa depositada nas costas dos pais foi quando ele resolveu sair de casa — aos dezesseis anos — e seguiu pela rua de casa, com uma mochila, atrás de um lugar que o abrigasse, ao menos, naquela madrugada. Fora sua primeira fuga e nunca a sua volta. Não que ele estivesse cansado de nunca ser notado, mas ele estava exausto demais para que continuasse com aquelas responsabilidades quando nem seus próprios estudos mereciam tamanha atenção.

Foi aos dezesseis anos que Louis se descobriu um espirito livre e incapaz de se manter preso, enjaulado, por tanto tempo. Ele sabia que não podia viver embaixo das asas de sua mãe até que ela achasse que estava na hora de seu filho seguir com a vida. Johannah nunca libertaria Louis, ela estava acomodada com seu filho assumindo as responsabilidades que deveriam ser de seu marido, ela estava tão confortável em sua depressão que havia esquecido das necessidades de Louis, assim como ele havia se anulado, por tempo demais, para que pudesse agir com voz própria e criar seu próprio rumo. Ele sabia que as dificuldades viriam, mas nada poderia ser pior do que sua mãe lhe colocando em um patamar que ele não estava disposto a estar. Ele não podia ser o pai daquela família, assim como não estava pronto para cuidar até de sua mãe, que parecia insatisfeita com absolutamente tudo.

Ele seria egoísta. Ao menos naquele dia. Ao menos naquela vida. Louis seria egoísta a ponto de juntar suas coisas e deixar a casa da família para seguir com suas próprias pernas, e, se fosse possível, ele rodaria o mundo inteiro, mesmo que sozinho, unicamente para que jamais acabasse enfiado naquela cidadezinha pelo resto da sua vida.

Ele só não esperava que, depois daquela fuga de casa, sem volta, sua vida se tornaria o caos em que ele se encontrava aos vinte e dois anos de idade.

Louis não tinha planos para um futuro promissor, a verdade era que ele não havia planejado chegar a algum lugar, como metade das pessoas que conhecera ao longo dos anos em que vivera nas ruas ou de casa em casa — apenas para passar a noite. Ele conheceu engenheiros, advogados e sonhadores durante toda a sua jornada naquela fuga estratégica de casa, ele ouviu sobre planos financeiros e sobre pessoas que sonhavam em constituir uma família, com uma casa, ou animal e filhos. Ele ouviu sobre gente que havia desistido de tal emprego por causa dos estudos e de gente que deixou os estudos porque o emprego lhe tomava tempo demais. Ele ouviu sobre sonhos um tanto altos demais, sobre como era difícil manter a fé quando a vida parecia viver de rasteiras e tombos, ouviu sobre futuras casas na praia, ou em como sair de Londres era um sonho. Ouviu sobre apresentações na Broadway e sobre aulas em universidades requisitadas pelo mundo inteiro.

Ele conheceu uma massa de pessoas que tinham o pé no chão também. Aquelas pessoas que sabiam que o futuro não era tão grande, que possivelmente viveriam como faxineiros ou lavadeiras pelo resto de seus dias. Chegou a conhecer uma família quase tão parecida com a sua, com vários irmãos, mas com um casamento estável, em que o peso de uma vida de casal era dividido entre ambos e não jogado nas costas da mulher.

Louis chegou a sentir inveja das pessoas que pareciam centradas e decididas. Ele chegou a se imaginar - por meros instantes — em uma família estruturada, em como seria se ele seguisse seu sonho em ser, quem sabe, um professor de drama. Talvez ele pudesse assistir seus alunos se apresentarem em obras populares ou, quem sabe, em teatros pequenos, mas que o agradeceriam pelo o apoio que ele daria, caso chegassem tão longe.

Ele seria um ótimo incentivador.

Louis poderia ter chegado mais longe se não fosse pelo fato de que nada daqueles sonhos eram seus. Nenhuma daquelas expectativas de vidas eram suas. Nenhuma daquelas ideologias lhe pertencia, e, em momento algum, ele acreditava nas palavras que foram plantadas em sua mente por sua própria mãe. Ele não tinha vida própria.

Mas o que o derrotou, de verdade, não era ter sido moldado pelas mãos da mulher mais velha, mas sim que ele nunca tivera a chance de mostrar quem realmente era.

E, aos vinte e dois anos de idade, ele se achava um completo preenchimento de espaço ao se descobrir completamente vazio. Sem sonhos e sem qualquer futuro para seguir e lutar, uma vez que ele tinha a plena certeza de que aquela vida de propaganda de televisão não era para si.

Não enquanto ele tivesse o controle dos seus próprios passos.



O mundo é um moinho | larryWhere stories live. Discover now