Capítulo 1 - Quem somos

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Uma pequena observação antes de começar esta história. Eu a relatarei a partir do que vivi e do que outros viveram nesta mesma época. Tomo a liberdade de contar passagens das quais não estava presente, mas me foram narradas tempos depois, com as minúcias das situações ocorridas. Todos que conheço sabem o quanto aprecio os detalhes, principalmente por gostar de narrativas verdadeiras que, posteriormente, se apresentam como romances saídos da boca de um bardo. Mais tarde, vi o quanto estava enganada diante de tantas situações e o quanto estava certa diante de outras.

Então comecemos!

...................

-- Tália! Tália!

Eu queria ficar só. Não queria ser vigiada o tempo inteiro. Era um verdadeiro tormento, as amarras imaginárias encobertas pela beleza do reino! Sim, meu pai era o soberano e vi minha mãe perecer num amor prisioneiro. Minha mãe era tão linda e cheia de vida.... Pergunto-me, se acaso consentir fazer tudo que ele quer, minha chama interior se apagaria como a de minha mãe?

-- Estou aqui, Arítes!

Eu amava olhar a corredeira do rio e deixar que o vento bagunçasse meus cabelos, deixando-os com uma aparência revolta. Havia-os cortado, desde que meu pai me censurou por treinar com o mestre de armas. Disse-me que nunca teria habilidade, se ficasse o tempo inteiro e a cada investida de meu oponente, consertando os cabelos. Lógico que sua intenção era que eu parasse de treinar e não que eu os cortasse. Parar de treinar com espada, com arco e na disputa corporal nunca o faria! Por conta disto, passei duas semanas sem poder sair além das muralhas do reino, sem treinar e sem falar com nenhum de meus amigos. O castigo foi ruim, mas a liberdade depois foi melhor.

Eu tinha vinte e um anos e neguei todos os pedidos pela minha mão. Não queria me casar e acabar como a minha mãe, tolhida de sua magnitude. Ela havia sido uma exímia amazona arqueira no exército de meu avô. Meu pai se apaixonara por ela enquanto eram companheiros de esquadrão. Meu avô morreu, meu pai assumiu e desposou minha mãe, que agora se encarregava das questões "gerenciais" do castelo, apesar de ser a "comandante oficial" dos exércitos.

Um dia, quando treinava sozinha no jardim particular, próximo ao meu quarto, minha mãe veio me ver. Em dado momento, se aproximou me ensinando as malícias e técnicas para empunhar um arco. Fiquei fascinada como ela conseguia enxergar até a mais delgada folha e atirar uma flecha tão certeira, que mal rasgava o pequeno apêndice, antes de prendê-lo no tronco robusto da macieira. Desde então, não passava um só dia em que não treinasse o arco. Queria atingir a mesma perfeição e graça com que ela o utilizava.

-- Tália, vamos, antes que seu pai mande procura-la.

Arítes era a minha guarda pessoal. Na verdade, crescemos juntas e ela era a neta do conselheiro e comandante de meu avô. Não posso dizer que somos exatamente amigas, pois sempre que tentei estreitar nosso relacionamento, ela sempre se distanciava. Nunca entendi porque, pois quando crianças, brincávamos juntas, mas quando fez doze anos e optou por uma educação militar, afastou-se aos poucos.

-- Arítes, meu pai tem coisas mais importantes para fazer do que me procurar no meio do dia.

-- E é por isso que eu lhe acompanho.

-- Ah, obrigada! Certamente ao fim do dia, ele deve receber um relatório completo de minha interessante vida pastoril.

-- Não falo a ele tudo que você faz, mas deveria. Sabe que estamos em um momento politicamente delicado contra o reino de "Terbs". Você não deveria se expor tanto, saindo a toda hora, para além das muralhas de "Eras".

-- Essa agora! Não acredito que você seja uma destas pessoas, que acham que ficaríamos bem, se meu pai "me oferecesse" em casamento para aquele nojento do filho do Rei Badir!

ErasOnde histórias criam vida. Descubra agora