POV Paki
- Dia da convenção –
Na minha humilde opinião, os filmes românticos sobrevalorizam constantemente a prática de dormir na praia: uma lareira acolhedora com chamas crepitantes a iluminar os rostos presentes, o som das ondas do mar a embalar como música de fundo, os cobertores desorganizadamente espalhados sobre dois corpos juntos, idealmente abraçados, debaixo de um manto infinito de estrelas brilhantes. Desenganem-se. Vou contar-vos o que realmente acontece quando dormem na praia:
a) Se for inverno, como é o caso, vão sentir frio em sítios tão improváveis como os cotovelos ou as pálpebras.
b) Fazer uma fogueira em areia húmida é ainda mais difícil do que dar comprimidos a gatos.
c) Há gaivotas curiosas a cercar-vos, cujas sombras na areia se assemelham a abutres do tamanho de arcas frigoríficas industriais.
d) Acordam com areia em todo o lado. Repito, em T-O-D-O o lado.
Esfreguei os olhos repetidas vezes, retirando dezenas de pedrinhas de areia alojadas nas minhas pestanas e levantei-me com alguma dificuldade. Dói-me o corpo e a cabeça, e uma série de espirros conclui o meu belo despertar desta manhã. Já em pé, estico os braços sobre a cabeça, espreguiçando-me durante longos minutos, e memórias da noite anterior começam a surgir com clareza na minha mente.
Falámos até quase de madrugada, tão próximos que quase não dava para perceber onde começava um e acabava o outro. Beijámo-nos algumas vezes, mas não muitas. Não as suficientes, do meu ponto de vista.
Não sei bem o que isto quer dizer, nem tampouco o que vai resultar daqui e para ser muito franco, isso incomoda-me profundamente. Por que razão me beijou? Correção, por que razão não me beijou mais? Não sei se isto é comum acontecer, mas é uma estreia para mim. Não o processo de beijar alguém, é claro, já beijei imensa gente antes... Ok, em contexto não-virtual apenas conto com uma situação experimental, e para ser sincero, não foi muito conclusiva. Tinha 15 anos quando conheci a Lea num salão de jogos e ela partilhava não só do meu físico imponente e desleixado, como da minha tacanhez no que diz respeito às relações interpessoais. Eu estava sozinho, ela estava sozinha, e ambos achávamos conveniente tirar proveito da nossa condição. Começamos a namorar a uma terça, demos o nosso primeiro beijo na sexta da semana seguinte, e concluímos no sábado que não éramos talhados para o compromisso. Continuámos a embrulhar-nos à grande e à francesa em cenários mais gráficos e interessantes do que a vida real, até aparecer a Luce.
Sim, porque depois há a Luce. Passe o tempo que passar, vai sempre haver a Luce.
A questão é que, no caso da Lea, eu sabia o que esperar. Eu beijei-a porque era minha namorada, ela beijou-me porque eu era namorado dela: simples, intuitivo, sem qualquer complexo emocional intrincado à mistura.
Agora com a Jubilee é tudo um mistério. Não sou tão ingénuo para acreditar que meia dúzia de beijos nos coloca numa posição de compromisso, mas também não sou liberal o suficiente para encarar isto como uma aventura sem próximos capítulos. Quando beijo alguém – e consigo ouvir uma vozinha do Harry a dizer que se trata de um evento milenar – faço-o com a convicção de que posso (e devo) criar expetativas. Se não, de outro modo, qual seria o propósito? Eu gosto de acreditar em propósitos. É confortável, é seguro...é o total oposto de dormir na praia.
E no entanto, será isso o que procuro? De todos os meus propósitos, será este que quero ver cumprido?
Os meus pensamentos resvalam rapidamente para a ideia difusa e incoerente que tenho da Luce, e o habitual desespero de lidar com emoções pouco claras começa a dar de si, acelerando-me a respiração. Antes de lhe dar oportunidade de me imobilizar por completo, com um tom de brincadeira nervosa à mistura, pergunto em voz alta:
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(Un)forgettable
Teen Fiction"Dizem que quem conta um conto acrescenta um ponto. Mesmo as vossas memórias, não são mais do que aquilo que escolheram lembrar de um passado que nunca será recordado exatamente como aconteceu. Mas comigo é diferente: o meu nome é Harry e eu não acr...