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08 :; imprevisibilidade e constrangimento



Martha



  A sua mão agarrou a minha e permanecemos em silêncio e sossegados enquanto ele mirava o meu rosto, parecendo ter em atenção cada pormenor e imperfeição. No instante seguinte a sua mão largou a minha, pegando novamente no lápis de carvão pousado nos lençóis brancos da grande cama de casal. Retomou toda a sua atenção para o caderno, voltando a desenhar. Foram inúmeras as vezes que tentara ver o que Luke desenhava, no entanto o loiro conseguia sempre esconder a folha, pressionando-a contra o seu peito, enquanto um sorriso atrevido nascia nos seus lábios e meros "Ainda não" ou "Espera mais um pouco" eram sussurrados como resposta.

  Soltei um suspiro, impaciente para ver o resultado do desenho de Luke. Contemplei todo o seu corpo, atentando a cada pormenor e singularidade no rapaz. Desde a sua postura descontraída, costas apoiadas na cabeceira da cama e cabeça encostada à mesma, à sua atenção ao que fazia, olhos semicerrados e uma expressão séria enquanto mordiscava o seu lábio, passando a língua por estes regularmente, numa tentativa de os humedecer. As suas mãos viajavam pelo papel, criando a representação de algo através de linhas retas e curvas que me eram ainda desconhecidas, da cor do carvão do lápis, um tom neutro.

  

  "Está finalizado"- declarou, sorrindo quando um baixo "Até que enfim!" escapou dos meus lábios, demonstrando claramente a minha impaciência devido aborrecimento presente na minha voz. O seu olhar foi focado no meu e o desenho foi-me revelado. Peguei no caderno repleto de rabiscos ou belas obras artísticas de sua autoria, traçados confusos que formavam formas ou paisagens capazes de nos levar para um mundo paralelo.


  Observei lentamente a figura criada no forte papel branco, sustendo a respiração por breves instantes. As linhas de cor negra que Luke produzira com tanta paixão e dedicação formaram um rosto. O meu rosto. Cabelos longos, bochechas magras, olhos grandes de tonalidade clara, lábios cheios e entreabertos e uma expressão enigmática.


  "Espero que tenhas gostado. É teu, se assim o desejares"- afirmou com incerteza, encarando o meu rosto enquanto esperava por qualquer outra reação que confirmasse o meu agrado em relação à figura concebida pelo rapaz.


  "Muito obrigada, Luke"- proferi num sussurro, envolvendo-o num caloroso abraço. O jovem rodeou o meu tronco com os seus braços, o seu quente corpo numa confortável posição, pálpebras fechadas e a minha face escondida no seu pescoço, apreciando o maravilhoso e forte odor do seu perfume.


  Ele afastou-se passado pouco tempo, movendo o seu corpo e puxando gentilmente o meu, levando a que este ficasse imóvel junto ao seu, a minha cabeça pousada no seu peito. Eramos como estátuas. Puras estátuas construídas com cuidado e paciência, cada uma com uma infinidade de pormenores únicos, impossíveis de copiar. Envolvidos pelo silêncio, encarámos diferentes pontos do seu espaçoso quarto de tonalidades claras com um significante toque de preto e cinzento. Os seus olhos focaram um ponto no teto branco, enquanto eu apreciava o seu toque na minha cintura, o calor proveniente do seu corpo, o som de relâmpagos distantes e o murmúrio do vento. Olhei para janela ligeiramente embaciada, reparando na presença do denso nevoeiro no exterior. As minhas pálpebras fecharam-se lentamente e um breve suspiro foi solto dos meus lábios, enquanto o quente toque de Luke me reconfortava. Porém, abri os olhos e fitei o rosto de Luke quando o ouvi pronunciar o meu nome.

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⏰ Last updated: Apr 03, 2016 ⏰

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