Capítulo 2

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"And maybe I should stop and start confessin.
There's Nothing Holdin' Me Back, Shawn Mendes"

Um ano antes.

Em uma festa lotada de adolescentes bêbados, Vinicius era o apenas o cara do violão. Isso significava que, em algum momento, todos sairiam da roda de música para fazer tudo que combinava mais com o seu atual estado mental.

Sentado no sofá, com o violão sobre as pernas, o garoto olhava para a festa de aniversário de Jaqueline tal qual um observador do mundo animal, detectando movimentos estranhos, comportamentos exagerados, sons altos e um cheiro nada agradável. De longe, via a melhor amiga, que comemorava seus  17 anos, aproveitar aquela festa como se já fosse velha o suficiente para lidar com as consequências de seus atos, e agradeceu mentalmente por não ser ele quem precisaria lidar com uma ressaca no dia seguinte. A música alta fazia o salão da casa vibrar e a loira dançava com os braços para cima, embrigada demais para se lembrar que precisaria voltar pra casa e explicar para a sua mãe super protetoria porquê fedia a álcool.

Vinicius soltou um suspiro e jogou a cabeça para trás. Não gostava de ser o amigo que reclama dos roles, mas verdade é ele que precisou fazer um esforço gigante para estar ali: preferia mil vezes algo intimista, com refrigerante e pizza, a lidar com toda a turma de adolescentes bebendo e ouvindo músicas de qualidade duvidosa.

— Cara, a festa tá demaaaaaaais! — Nicolas jogou o corpo no espaço vago do sofá, colocando o braço ao redor do ombro do amigo. Próximo demais, Vinicius podia sentir o cheiro de álcool exalando de cada parte dele. — Por que tu não larga esse violão velho e vai dançar com a gente?

— Tu sabe que eu não gosto dessas músicas.

Nicolas rolou os olhos. Às vezes, tinha dificuldade em entender como o seu melhor amigo podia ser tão diferente dele.

— O que eu sei é que tu é um chato.

— Não sou chato, só não preciso de álcool para me divertir — Vinicius ergueu os ombros e o loiro fez uma careta.

— Ou seja: chato. — Ele deu uma risada arrastada, antes de se levantar do sofa.  — Já que tu não vai sair daí, eu vou lá perturbar a nossa loirinha aniversariante.

Vinicius sorriu enquanto observava Nicolas fazer o que fazia de melhor: atrapalhar Jaqueline. Não conhecia ninguém que sentisse mais prazer em perturbar alguém como ele — nem alguém que fizesse isso tão bem.

Entediado, o garoto puxou o violão e dedilhou algumas notas aleatórias, tentando imaginar que estava no silêncio do seu quarto, quando sentiu um peso cair sobre o lado vazio do sofá mais uma vez. Dessa vez, eram os cabelos cacheados de Rafaela que estavam espalhados pelo encosto do sofá e, antes que pudesse dizer qualquer coisa, viu a menina jogar a cabeça para trás e um sorriso atrapalhado surgir em seu rosto, fazendo o garoto arquear uma das sobrancelhas.

— Tu bebeu? — perguntou.

Rafaela virou o rosto em sua direção. Seus olhos brilhavam e pareciam refletir tudo que via. As bochechas rosadas e o aquela expressão leve não deixavam dúvidas, mas Vinicius esperou pela resposta, que veio após uma risada engraçada.

— Sim — Ela levantou o dedo indicador e tocou o rosto do amigo, que fez uma careta. — Você devia ouvir o que estão falando de você pode aí.

Vinicius franziu o nariz quando o cheio de álcool o invadiu.

— Estão falando de mim por aí? — Ele afastou a sua mão, dando uma risadinha. Rafaela assentiu, tentando ajeitar a postura.

— As garotas te amam.

— Deve ser o violão. — Ele ergueu os ombros, dando um sorriso de lado.

Aquilo era a mais pura verdade: não havia uma garota do ensino médio no mundo, que não se encantasse pelo cara do violão, até ele se tornar chato e ser trocado pelo cara do futebol — e Vinicius viveu a situação traumática na pele.

— É mesmo — concordou. — É que você é todo lindo, com essa voz toda linda também...— ela riu mais uma vez, as palavras se embaralhando uma na outra.

Dessa vez, a risada de Vinicius foi mais fraca. Não conseguia manter a intensidade já que seu cérebro começou a repetir a última frase dita pela amiga de uma forma confusa.

— É isso que dá, né? — ela continuou, ignorando a expressão de choque que se formava no rosto do melhor amigo. — Você canta e toca violão, mexe no cabelo a cada cinco minutos com esse sorriso avassalador e ainda toca essas músicas suuper românticas. Ela voltou a olhar para ele, como se atravessasse a sua alma, antes de dizer: —  Tipo, quem resiste a músicas românticas?

Ele precisou piscar algumas vezes para ter certeza de que aquilo não era um sonho, pensou ante em se bélicas, só para garantir. Não tinha certeza de qual daquelas palavras malucas havia despertado a sensação ardente no peito: uma falta de ar que descompassava até o ritmo das batidas do seu coração. Estava concentrado demais em controlar a respiração que mal teve tempo de pensar quando ela disse:

— Acho melhor você parar de fazer essa cara fofa. — Rafaela riu, aproximando o resto do dele e sussurrando: — Eu posso não resistir. 

O garoto sentiu o ar escapar de seus pulmões e foi obrigado a tossir, enquanto a garota ria e jogava o corpo descoordenado sobre o sofá mais uma vez.

Não, aquilo não era um sonho. Era um pesadelo.

— Rafinha, tu tá muito bêbada. — foi o que conseguiu dizer, mas para ele, do que para ela. Precisava se lembrar que aquelas palavras não tinham significado nenhum além do puro álcool correndo nas veias da amiga. — Eu vou buscar água pra ti, não sai daí! — disse, já se levantando.

Vinicius não teve tempo de dar nem sequer um passo, antes de sentir a mão pequena e macia segurar o seu braço e o puxar de volta para o sofá, fazendo-o cair meio desajeitado ao lado dela. A gargalha alta se misturava com a batida da música e, ainda que não tivesse bebido uma gota de álcool sequer, Vinicius se sentia meio bêbado.

— Às vezes, eu queria não ser sua melhor amiga — Rafaela confessou, mas ela não o olhava mais no olho. Suas órbitas verdes vagavam pela sala.

— Rafinha...

— É sério — ela o interrompeu. — Muito sério.

— E por que tu não quer ser minha melhor amiga? — resolveu perguntar, ainda que sentisse um fundo de medo da resposta.

Aquela conversa estranha com cheiro de caipirinha poderia mudar o rumo daquela amizade para sempre.

— Hum... — Rafaela torceu a boca, pensativa. — Às vezes, quando as garotas ficam te elogiando e falando o quanto você é um bom partido e blá, blá, blá. — Ela colocou a língua para fora, em uma careta engraçada. —  Eu desejo não ser tua melhor amiga.

— Só porque elas me elogiam?

— Só porque eu não deveria pensar nessas coisas.

— Que coisas? — quis saber mais uma vez, contrariando a voz que dizia que deveria calar a boca, antes que não tivesse mais volta.

Mas, como se o universo tivesse, mais uma vez, resolvido o sacanear, uma movimentação estranha no centro da sala puxou a atenção da cacheada, que ergueu o corpo para observar. Todos se juntavam em uma roda, sentando-se no chão e Vinicius viu quando Jaqueline colocou uma garrafa no meio deles.

Imediatamente, Rafaela ergueu os braços, animada.

— Oba! — Ela gritou, se levantando do sofá. — Adoro verdade ou consequência!

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⏰ Última atualização: Apr 19 ⏰

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