II

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Paranaguá, 2016 — 22:43.

O soluço silencioso de Guilherme o deixava sufocado. A cada passo que dava, um lágrima descia pelo seu rosto, demonstrando uma confusão a respeito de todos os pensamentos que apareciam em sua mente. Ele não tinha a mínima noção de onde estava, mas não ligava para isso no momento. Tudo o que queria era um canto escuro para se afundar ainda mais na melancolia e dormir eternamente. A sua cabeça doía cada vez mais, deixando-o com a visão turva e o corpo fraco. Ele não conseguia se culpar por estar naquele estado, só pensava nas bebidas que havia ingerido e na dívida cada vez maior com o dono do bar. Porém, nesse patamar, Guilherme já não ligava para isso. Desde que perdeu a sua família para um incêndio ele vem se afundando cada vez mais no álcool e nas drogas ilícitas que consome. Tudo o que pensa é em vingança. Guilherme daria tudo para achar o cara que acabou com a sua vida. Entretanto, tudo o que conseguia pensar no momento era que precisava se manter acordado.

A noite escura não colaborava com ele. A rua deserta era movida a ventos gelados, deixando as árvores do local agitadas com os assopros da brisa, além de que não havia uma iluminação precisa, deixando com que a obscuridade prevalecesse em todo o ambiente. Guilherme estava perdido, e não tinha nada que pudesse fazer para reverter isso. Ele sentou na guia da calçada e colocou a cabeça entre os joelhos, deixando o suspiro profundo e inquieto preencher o pequeno espaço que contornava sobre si. Guilherme olhou para o céu coberto de nuvens e deixou a última lágrima cair, então se levantou e respirou fundo para logo em seguida sair cambaleando pela mesma rua. Ele estava cansado de ficar naquele local, mas o que não sabia era que andava em círculos.

Precisava de uma luz, de alguém que indicasse o caminho certo. Nunca foi de acreditar em destinos, achava aquilo uma parvoíce, mas começou a mudar de ideia quando avistou uma casa. Ela não era estranha para Guilherme, que tinha a impressão de conhecê-la de outras vidas. A verdade era que a casa guardava um grande mito, uma lenda que muitos preferiam ficar longe. A morada chamava atenção principalmente pelo seu tamanho. Havia detalhes convidativos que hipnotizava cada ser ganancioso e traidor que passasse pela frente, atraindo cada pessoa para entrar no lar. Com Guilherme não foi diferente. No meio da escuridão, a mansão brilhante por causa do ouro cintilava poder. Era tudo o que ele desejava; estar por cima de tudo e todos sempre permaneceu na mente do homem. No entanto, o que ele não imaginou era que aquilo o levaria a morte.

Com os olhos brilhantes, Guilherme se aproximou da casa. Ele não conseguia explicar exatamente o que, mas havia algo ali dentro que o chamava. Talvez estivesse ouvindo um murmúrio, ou aquilo poderia ser apenas coisa de sua cabeça embriagada. O que mais o assustou foi andar até a porta da casa e já estar aberta, um passe livre para um mundo empíreo.

Ele não teve tempo de olhar os detalhes, tudo o que percebeu foi que a casa era cercada de móveis antigos e empoeirados, mas ainda sim carregava uma beleza única. O local escuro era iluminado apenas por uma vela, que refletia sobre um espelho que havia na sala de jantar. Guilherme se aproximou do próprio reflexo e viu sua face na plataforma de vidro. Seus olhos vermelhos eram cobertos de olheiras roxas e profundas, deixando claro todo o tempo que ficou sem dormir; seu cabelo era embaraçado como a sua vida, mas nenhuma dessas confusões o deixava atordoado. Contudo, o que mais o assustou foi um vulto branco que viu atrás de si. Ele precisou apertar os olhos para ver direito, mas o seu olhar ainda estava enevoado.

Porra, tem alguém aqui? — Guilherme soltou sem pensar nas consequências. Ele poderia muito bem sair do local, mas o seu orgulho não permitia.

Silêncio.

Guilherme precisava saber mais, por isso parou de se olhar no espelho e andou pelos cômodos que havia. A sua mente girava conforme passava pelos lugares da casa, até chegar em um quarto lúgubre, onde nenhuma luz ali reluzia. Adentrou no local com receio e um pressentimento impróprio, mas tentou esquecer isso e deitou-se na cama. Quando seu corpo encostou no colchão macio, sentiu todo o peso ser tirado de si vagarosamente, e até pensou que estava se libertando de toda angústia, mas a noite estava apenas no começo.

Guilherme fechou os olhos e tentou tirar um cochilo, ficando inconsciente. Em sua mente ébria, nada de ruim poderia acontecer dentro dessa casa. O que ele não sabia era que aquele domicílio era repleto de almas penadas presas e caladas, cada uma a procura de seu alvo para sugar todas as forças. Mas com Guilherme era diferente. O espírito que estava atrás dele tinha sede de vingança, e procurava o método mais torturante para obter a condenação.

A alma olhava-o com serenidade, e iria sujar as suas mãos no sangue.

Almas SilenciadasWhere stories live. Discover now